
Autor do projeto de lei que prevê a partilha mais igualitária dos royalties do petróleo entre estados e municípios produtores e não produtores, o senador Wellington Dias (PT-PI) defende o modelo que propôs usando a Constituição como argumento. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele diz que, segundo o texto constitucional, o petróleo é um bem mineral e pertence à União e não aos estados e municípios daí a necessidade de redividir os recursos entre todas as unidades federativas.
É isso que prevê seu projeto, aprovado em outubro no Senado na forma de um substitutivo apresentado pelo senador Vital do Rêgo (PMDB-PB). A proposta agora aguarda votação na Câmara dos Deputados, mas enfrenta a resistência de parlamentares de dois estados produtores: Rio de Janeiro e Espírito Santo. Confira a entrevista do senador, concedida recentemente, quando ele esteve em Curitiba para participar da 21.ª Conferência Nacional dos Advogados.
Como está a discussão sobre a partilha dos royalties?
Os estados do Rio e do Espírito Santo não querem nenhuma alteração nas regras. Mas isso é insustentável. Estamos falando de petróleo em mar que, de acordo com o artigo 20 da Constituição Federal, é bem pertencente à União. Tudo o que é encontrado no mar territorial e na plataforma continental pertence à União e não aos estados. Nós defendemos a descentralização [dos royalties]. A União ficaria com uma parte e o restante seria distribuído para os estados e municípios.
A diferença do seu projeto para o anterior que, foi vetado pelo presidente Lula, é uma transição dos porcentuais repassados aos estados para que Rio de Janeiro e Espírito Santo não levem um golpe muito duro?
Exatamente. O projeto de autoria do senador Pedro Simon (PMDB) e do deputado Ibsen Pinheiro [vetado por Lula em 2010] não fazia a transição. Todos os royalties eram divididas de forma justa [entre estados e municípios produtores e não produtores]. Porém, o projeto deixava para a União resolver o problema do Rio e do Espírito Santo, que hoje recebem por ano aproximadamente R$ 12 bilhões. O que nós estamos fazendo é concordarmos com o arcabouço principal [do projeto anterior], pois tratamos só de petróleo em mar, que é da União. Petróleo em terra pertence aos estados em cujo o território ele foi encontrado. A divisão do petróleo do mar prevista no projeto deixa algo como 20 % para os estados e municípios fluminenses e capixabas para o impacto socioambiental [que a atividade implica] e para as pessoas que trabalham nos portos, nas plataformas de extração e na indústria daquelas cidades.
O senhor tem dito que não existem estados produtores de petróleo. Por quê?
Se cada brasileiro compreender que o Rio e o Espírito Santo não produzem em seu território nenhuma gota de petróleo, não há do que se falar em "estado produtor". No máximo, podemos falar de um estado confrontante [com o oceano], que está na frente de uma plataforma em alto-mar de onde se extrai petróleo que pertence à União. Estou falando de uma extração que ocorre a 7 mil metros no fundo do mar; a 200 quilômetros de Copacabana. Não são estados produtores. Não há estados produtores de petróleo. Mais do que isso: defendo que os brasileiros devem ter a mesma garra que usaram para lutar pela campanha do "Petróleo é Nosso" para defender a ideia de que o royalties são do povo e têm de ser distribuídos de forma justa.
Quando o projeto será votado?
Devemos fazer uma mobilização [para colocar o projeto em votação na Câmara], pois está em jogo a posição de 24 estados. Além disso, estamos pedindo urgência na Câmara para que a votação do projeto entre na pauta ainda neste ano. Vamos fazer todo o esforço.
Por que, com uma maioria de interessados na aprovação, a Câmara não vota o projeto?
Não apostávamos que o presidente da Câmara [deputado Marco Maia, PT-RS] fosse encaminhar para a criação de uma comissão especial para estudar a matéria. E também fomos surpreendidos pelo colégio dos líderes, que não incluiu a votação do projeto nos itens prioritários para 2011. Com o pedido de urgência, esse cenário pode mudar.
A comunidade científica demonstra preocupação com a possibilidade de os recursos dos royalties serem gastos de forma desordenada e de que a ciência, que propiciou a tecnologia que permitiu as descobertas das jazidas, não seja devidamente contemplada com recursos provenientes do petróleo. O senhor ouviu a comunidade científica para elaborar o projeto?
Sim. É mais um argumento que eu uso na defesa da minha proposta. De cada dez tentativas que se faz nas pesquisas do pré-sal, apenas uma dá certo. Quem contribuiu nos estudos? Cientistas de todo país . Quem financiou as pesquisas? A União. Nenhum estado botou um centavo nesses projetos que descobriram o petróleo. Nós ouvimos a comunidade científica no Senado. E definimos que serão a União, os estados e os municípios que vão regulamentar quais são os setores [incluindo a educação e a ciência e tecnologia] que serão beneficiados com os recursos do petróleo. Não definimos um limite [para ciência] e sim uma abertura para que se escolha o que tem que ser prioritário em cada momento histórico.



