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Talvez nenhuma outra região retrate tão bem a miséria e exploração a que são submetidas as brasileiras como a fronteira de Guajará-Mirim e sua cidade-espelho Guayaramerín, na Bolívia. "Vender o corpo é humilhante, mas não é crime", diz Rosa, veterana brasileira que rodou muito antes de cair num dos prostíbulos do outro lado do rio Madeira. Humilhação maior, diz ela, é ter de brigar com as colegas para ganhar mais comida, ou implorar à cafetina por um prato cheio. Esses lugares estão espalhados pela periferia do vilarejo de 5 mil habitantes. Encontrá-los não é problema: os mototaxistas que percorrem as cidades oferecem o serviço antes mesmo de o viajante pedir.

Os prostíbulos causam uma má impressão logo na chegada. São barracões de madeira velha, com chão de terra batida e cobertura de palha. Uma brasileira resume assim os riscos do lugar: "Ninguém aqui pode ter inimigo, porque se acender um fósforo isso tudo acaba em menos de dez minutos".

Mas é ali que elas se sujeitam a uma vida de insalubridade e privações. Rosa diz não importar as condições do lugar, se tiver muita mulher os homens aparecem. "As novinhas são para atrair clientes", explica. Realmente atraem, e não só ali. Há um ano, o Consulado brasileiro em Guayaramerín retirou cinco adolescentes brasileira de um prostíbulo no vilarejo de Riberalta, que avança 90 quilômetros para o interior do país numa estrada de terra.

No lado brasileiro, a coisa também não vai bem. A visão policial não ajuda a mudar o cenário. Em sua interinidade frente à Delegacia Especializada em Defesa da Mulher e da Família, o delegado José Marcos Farias diz só ter visto casos de estupro presumido (presume-se a violência quando a vítima é menor de 14 anos, ou tem problemas mentais e o agressor sabia disso, ou quando ela não pode oferecer resistência).

No mural em frente da sala dele, o slogan do Sentinela, programa federal de atenção a crianças vítimas de violência, resume bem a miopia sobre o assunto: "Só não vê quem não quer". De janeiro a julho deste ano, o Sentinela atendeu 37 casos de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes.

Acima da calha do rio Amazonas, duas rotas nortistas da prostituição destoam nesse cenário de miséria. Se por um lado as estradas de Rondônia, Acre e Mato Grosso levam às privações na Bolívia, os caminhos de Roraima e Amapá conduzem a países que, na teoria, oferecem mais oportunidades. Na fronteira livre de Pacaraima, o acesso a Santa Helena de Uairén, Venezuela, se dá por uma estrada onde o controle da Polícia e da Receita Federal se restringe a mercadorias e despachos burocráticos.

Do outro lado, as brasileiras são maioria nas boates. O motivo é o mesmo de Cobija. Mas é Oiapoque que mais atrai garotas de programa que querem ir à Europa. Na pior das hipóteses, se conformam com os euros da Guiana Francesa.

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