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Um dos integrantes de maior destaque da CPI dos Correios, o senador paranaense Alvaro Dias (PSDB), avalia que a comissão vai dar respostas conclusivas à população até o final dos trabalhos, em dezembro, quando apresentará o relatório completo das investigações. Caberá ao Ministério Público punir os envolvidos. Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, o senador disse que há uma tentativa do presidente da República de jogar sobre o Congresso Nacional o ônus do esquema de corrupção e isentar o governo. "Mas o grande corruptor é o Executivo. Se o governo não fosse corrupto não teria alcançado tantos parlamentares e partidos políticos", diz. Sobre a possibilidade de disputar o governo do Paraná, Alvaro Dias garante que não é o momento de falar em eleição.

Gazeta do Povo – O relatório parcial das CPIs dos Correios e da Compra de Votos recomenda a cassação dos mandatos de 18 deputados. O resultado das CPIs está à altura do que a população espera?

Alvaro Dias – Já alcançamos os objetivos ao propor transparência, colocar o mal à luz para que possa ser conhecido, julgado e condenado. Estabelecemos a interação com a sociedade, que exerce pressão sobre autoridades como o Ministério Público, a Polícia Federal e os encarregados da responsabilização civil e criminal dos denunciados. Este é o verdadeiro papel de CPI. Em alguns países, como na França, quando o Ministério Público inicia os procedimentos a CPI encerra atividades porque o papel é justamente provocar a autoridade. É importante ressaltar, no entanto, que nunca chegaremos ao que a população deseja porque há um conceito distorcido do papel das CPIs. A crítica, muitas vezes, deve ser dirigida ao Poder Judiciário e acaba sendo dirigida ao Poder Legislativo. A CPI não pode julgar, condenar. A própria prisão do Marcos Valério foi pedida pela CPI e negada pela Justiça.

E a CPI já reuniu elementos suficientes que possam comprovar as denúncias de mensalão?

A CPI já revelou muito, acumulou provas, pode atestar a rede organizada de corrupção e comprovar a existência de um esquema de propina a parlamentares. Temos 18 deputados citados no relatório parcial, confissões importantes, réus confessos em decorrência da pressão exercida pela CPI, como Delúbio Soares, Silvio Pereira, Marcos Valério, Duda Mendonça e outros. Marcos Valério não está sozinho, tem uma equipe que participou do esquema. Já há confissão e provas materiais de ilícitos praticados.

A CPI conseguiu avançar nas investigações sobre a origem dos recursos repassados ao PT pelo empresário Marcos Valério?

Há necessidade de um trabalho maior para levantar a origem dos recursos. Para comprovação da fonte, não basta a convicção de que a maior parte são recursos públicos. Com tráfico de influência foram criadas outras fontes de financiamento como as instituições financeiras. Não só o Banco Rural, mas uma série que tinha interesse de regularizar a situação junto ao Banco Central. Marcos Valério se empenhava para ter retribuição. Vemos o envolvimento das teles e dos fundos de pensão, depósitos significativos da Telemig Celular do Daniel Dantas. O interesse com a Portugal Telecom levou Marcos Valério a Portugal, falando em nome do presidente Lula, junto com Emerson Palmieri, desginado pelo ex-presidente nacional do PTB, Roberto Jeferson. Seriam R$ 24 milhões para o PT e o PTB. Tenho insistido na contratação de empresas de auditoria para qualificar a investigação e comprovar a origem dos recursos. Essas empresas poderiam fornecer laudos técnicos, mas não vejo boa vontade em relação ao isso, não sei se há interferência oficial.

E o que dá para concluir sobre o esquema? Partiu de quem?

Tenho a convicção de que isso tudo ocorreu em função do sonho de alguns petistas que arquitetaram um projeto de poder a longo prazo, os fins passaram a justificar os meios, criaram uma rede organizada de corrupção para sustentar esse projeto de poder, onde o primeiro beneficiado seria o presidente Lula. Um projeto desta natureza não é arquitetado por alguém de forma isolada, mas em grupo. Vemos aí Delúbio Soares, Sílvio Pereira, José Genoíno, que sempre estiveram ao lado do presidente, e requisitaram posteriormente a participação do Marcos Valério.

Seguindo essa tese, a CPI então defende que o presidente Lula sabia do mensalão?

Vou responder com as palavras de José Dirceu, que ao depor na CPI afirmou que nada fazia sem que o presidente autorizasse. Não tenho dúvida que foi decisão desse assembleísmo petista, envolvendo as pessoas citadas, mas é óbvio que o presidente participava. Com a quebra do sigilo telefônico, constamos o vínculo com o Marcos Valério, que retrata a simbiose entre o público e o privado, uma associação espúria que levou a um modelo de corrupção, que determinou a relação de promiscuidade do Executivo, Legislativo e partidos políticos, escancarando as portas da corrupção para o setor privado.

Qual o impacto dessa crise na atuação administrativa do governo?

O governo sempre esteve paralisado sem conseguir nem mesmo aplicar os recursos do Orçamento da União. Os dados condenam a inoperância. Em sete meses apenas 4% dos recursos do Orçamento foram aplicados. O governo liberou, até agosto, apenas 9,3% dos investimentos programados para 2005. As obras receberam R$ 2 bilhões, de um total aprovado pelo Congresso de U$ 21,97 bilhões. A crise atordoa mais o presidente e seus coadjuvantes e acaba paralisando o governo de forma mais acentuada. O governo acabou, o que resta é o mandato do presidente. Temos que aproveitar esse tempo para assepsia geral que se exige. Se formos eficientes na investigação e exemplares na punição podemos preparar o país para um salto de qualidade, recuperando a credibilidade.

A visibilidade nacional que o senhor ganhou à frente da CPI reforçou sua presença no cenário político. Isso dá mais força política para tentar viabilizar sua candidatura ao governo do Estado?

Não tenho cogitado candidatura própria, venho defendendo a tese de superar etapas e oportunidades para determinadas decisões. Se em período normal, sem turbulência, já adotava uma postura prudente, agora tenho maior razão para isso. Qualquer pretensão eleitoral agora soa mal diante da população, que exige prioridade para a faxina geral. Deixa passar a tempestade e vamos falar em eleição. Esse não é o momento, só a partir do ano que vem que vou participar de conversações no Paraná. Tenho ido menos ao estado e participado pouco dos assuntos partidários. Só fui na convenção do PSDB. Não quero me envolver em nenhuma articulação política.

Essa faxina geral vai definir o comportamento da população nas urnas em 2006?

Está havendo uma participação maior da população, a imprensa cumpriu papel importante municiada pelas CPIs. Os olhos da população estão mais próximos, o que vai permitir a separação do joio do trigo. A eleição vai priorizar mais a qualidade e a ética. Hoje há um trauma de representação, estamos colocados no chão em matéria de credibilidade, de maneira geral, porque a nossa representação repercute mal, no Legislativo e no Executivo. Eu tenho sido estimulado por manifestações de apoio. De cada 100 correspondências que recebo, 97 são de elogios. Isso mostra que as pessoas estão tendo distinção entre uns e outros.

O senhor já esteve à frente da CPI das Terras e do Futebol. Essas investigações tiveram resultados práticos?

A CPI da Terra ainda não terminou. A característica não é de punição, mas diagnóstico da situação fundiária do país, alternativas para agilizar o processo e organizar o sistema. A CPI do Futebol do Senado atingiu todos os objetivos, diferente da realizada pela Câmara, que acabou em pizza. Os cronistas afirmam que o futebol está dividido em antes e depois da CPI, que criou o estatuto do torcedor, está promovendo o retorno do públicos aos estádios e instituiu a lei de responsabilidade do desporto, que permite o fim da impunidade. Antes os dirigentes assaltavam os clubes e nada acontecia, agora são obrigados a publicar balanços, auditorias e proibidos de firmar contratos mirabolantes com jogadores pagos a peso de ouro. Há uma série de processos em tramitação no Ministério Público e no Poder Judiciário e condenações, como a de Eurico Miranda, que foi condenado há 1 ano e meio de prisão e transformou a pena de detenção em multa, mas está com os bens indisponíveis e responde a uma série de processos.

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