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Poder público não prioriza a economia nas obras

O coordenador do curso de Administração da FAE, Daniel Rossi, entende que o alto valor gasto na construção do Restaurante Popular de Curitiba só se justifica politicamente. Rossi avalia que o fator político predominou sobre outras variáveis que compõe o planejamento da obra. Para ele, o custo poderia ser minimizado buscando-se áreas que impusessem menos dificuldades para a construção, o que tornaria o projeto mais barato.

"Se as características do terreno encareciam o projeto, então a solução poderia ser buscar outros locais, cuja economia fosse substancial. No setor privado, um gasto desses tem de ser bem justificado."

Na avaliação de Rossi, são problemas de gestão e planejamento que deixam a administração pública distante do setor privado. "Quando você compara com as empresas, vê que elas são mais dinâmicas. Nem de perto a administração pública se ajustou", afirma o professor de Administração.

Segundo Rossi, o encarecimento na construção pública precisa ser visto de forma estrutural e relaciona-se essencialmente à má gestão do dinheiro público. "Podemos dizer em casos como esse há duas alternativas. Uma é a da má gestão. Outra é a do superfaturamento. Em alguns tipos de obras, é muito difícil de se fiscalizar, ainda mais na nossa estrutura brasileira, carente de controles e de fiscalização."

O custo para construir o Restaurante Popular de Curitiba, erguido na Praça Rui Barbosa por meio de uma parceria da prefeitura com o governo federal, é um dos mais altos dentre todos os restaurantes populares que estão sendo implantados no país com dinheiro do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

O investimento no restaurante curitibano, inaugurado há três semanas e que cobra R$ 1,00 por refeição, foi de R$ 1.500 por metro quadrado de área construída. Isso é 50% maior do que o custo médio de construção de outros restaurantes do mesmo tipo espalhados pelo Brasil. E também é 83% maior do que o custo de mercado de uma construção comercial em Curitiba.

O coordenador do Programa de Restaurantes Populares do MDS, Antônio Leopoldo Nogueira Neto, diz que o custo médio dessas obras tem ficado em torno de R$ 1.000 por metro quadrado. "Com certeza o Restaurante Popular de Curitiba teve um dos custos mais elevados que já tivemos", admite Nogueira.

O governo federal repassou à prefeitura de Curitiba R$ 1,4 milhão para a obra. A administração municipal deu uma contrapartida de R$ 350 mil, totalizando um investimento de R$ 1,75 milhão. Mas nem tudo isso foi utilizado na construção. Segundo a Secretaria Municipal de Abastecimento, o valor total investido para erguer o restaurante, cuja área construída é de 785 metros quadrados, ficou em aproximadamente R$ 1,2 milhão. O restante foi destinado a outros investimentos, como a compra de mobiliário e equipamentos de cozinha.

O gasto na construção do restaurante também ficou acima do custo médio de obras calculado pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil do Paraná (Sinduscon). No mês de agosto, de acordo com o Sinduscon, o custo médio das construções comerciais (de andar livre, sem divisórias), como pode ser considerado o restaurante curitibano, foi de R$ 816,55 por metro quadrado. Ou seja, o metro quadrado da obra da Praça Rui Barbosa saiu por cerca de R$ 680 acima do custo de mercado (ou 83% mais caro).

O metro quadrado da obra curitibana também é muito mais caro do que está estipulado no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), mantido pela Caixa Econômica Federal. No Paraná, o valor médio indicado pelo Sinapi para obras de construção civil é de R$ 595,37 por metro quadrado.

De acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias da União, os custos de materiais e serviços de obras executadas com recursos da União não podem ser superiores ao estabelecido pelo Sinapi. Somente em condições especiais, justificadas por meio de relatório técnico, é que se pode ultrapassar o limite estabelecido.

Porém, Antônio Nogueira Neto, do Ministério do Desenvolvimento Social, entende que os padrões que foram utilizados em Curitiba estão dentro dos limites legais. Segundo ele, ainda não existe um índice específico da Caixa para a construção de restaurantes populares, como os já existentes para outros setores. "Não temos um índice para obras públicas de restaurantes populares. Uma das propostas que temos é justamente que a Caixa Econômica possa criar essa categoria."

Nogueira explica ainda que o metro quadrado do Restaurante Popular de Curitiba ficou mais caro do que a média por causa das características do projeto. Segundo ele, foi preciso construir uma estrutura elevada de base metálica, além de ter sido empregado um acabamento de cerâmica de primeira linha na cozinha – fatores que contribuíram para o encarecimento da obra. "Foi ladrilhada toda a parte interna da cozinha, o que não é obrigatório, mas é pertinente. O acabamento está acima do padrão exigido por lei, mas não quer dizer que haja irregularidades."

O secretário de Abastecimento da prefeitura de Curitiba, Norberto Ortigara, diz que a obra foi cara devido a características do terreno e do projeto. "No padrão do que está sendo feito, não se faz com valores mais baixos." Ortigara explica que a prefeitura optou por fazer uma obra de alto padrão estético. Para o secretário, o que pode ser questionado é o tipo de construção do restaurante. "Mas, aí, é conceitual. Poderia se fazer um ‘contêiner’, mas decidimos por criar um espaço agradável. Fizemos um bom projeto."

Segundo Ortigara, por causa do terreno da Praça Rui Barbosa, a construção também precisou de fundações reforçadas. A escolha da Rui Barbosa, e não de outro local, de acordo com ele, foi estratégica pela grande quantidade de pessoas que passam pelo local e que poderiam se beneficiar do programa.

A empresa que venceu a licitação da obra – a Conex Construções e Empreendimentos Imobiliários Ltda. – confirmou que houve uma série de dificuldades técnicas para erguer o restaurante. "O lugar ali é banhado. Foi preciso reforçar a estrutura", diz o engenheiro da Conex responsável pela obra, Laertes Rigolon. Ele afirma também que foi necessário realizar uma instalação de gás com mais de 150 metros de extensão, além da reestruturação de tubulação de esgoto e de água das chuvas.

O secretário de Abastecimento, Norberto Ortigara, afirma ainda que o projeto foi aprovado pelo Ministério de Desenvolvimento Social e foi fiscalizado pela Caixa Econômica Federal, que faz as análises documentais e libera os recursos. O representante da prefeitura ainda mostrou-se disposto a a abrir as planilhas de custo do restaurante, assim como a Conex.

Apesar disso, o custo da obra já está sendo questionado oficialmente. O Grupo de Apoio aos Povos Oprimidos entrou no Ministério Público com um pedido de investigação dos gastos da obra. O advogado da entidade, Carlos Alberto de Paula Souza, que assina o documento, contesta justamente o valor investido, que seria alto demais.

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