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Collor e Pitta

Delação ocorre também entre familiares

A política brasileira também foi marcada por delações familiares. A que causou maior repercussão foi a de Pedro Collor, em 1992, que contribuiu para sacramentar o processo de impeachment contra o irmão e então presidente da República Fernando Collor de Mello. Pedro Collor acusou o irmão de manter uma sociedade com Paulo César Farias, que teria sido usada para desvio de dinheiro público. Pedro, que morreu de câncer em 1994, revelou o esquema porque suas empresas estariam sendo prejudicadas pelos negócios de PC Farias e do irmão.

São poucos os casos que envolvem mulheres, mas eles podem ser devastadores. Em 2000, quando era prefeito de São Paulo, Celso Pitta (morto em 2009) foi acusado pela ex-mulher Niceia Pitta de participar de um esquema de corrupção. Segundo ela, os vereadores que votaram contra o processo de impeachment de Pitta, em 1999, teriam recebido dinheiro. O ex-prefeito não seguiu na vida pública.

Chamar alguém de dedo-duro geralmente é uma ofensa. Mas, quando se trata de combater a corrupção, o que era defeito vira qualidade, e os delatores passam a ser prestigiados. Essa situação tem sido recorrente no Brasil e o exemplo mais recente é o policial militar João Dias Ferreira. Há 15 dias ele denunciou um suposto esquema de corrupção no Ministério do Esporte, que culminou com a queda do ministro Orlando Silva, na última quarta-feira. Mas, assim como em outros casos, ele só contou o que sabia após ser prejudicado pelo sistema que resolveu delatar. Afinal, até quando o país dependerá de dedos-duros para descobrir irregularidades feitas com o dinheiro público?

Parece que essa dependência ainda vai longe, segundo especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo. "A gente não tem outras fontes. Os esquemas são bem feitos e, se ninguém de dentro revelar alguma coisa, fica muito difícil desbaratar o crime", observa o sociólogo Geraldo Tadeu Monteiro, diretor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj).

Por isso, mesmo quando o delator não é uma pessoa que inspira confiança, ele é requisitado e pode até gozar de um certo prestígio. João Dias Ferreira, por exemplo, comandava uma entidade que assinou convênios com o Ministério do Esporte, e é acusado de desvio de dinheiro. A pasta e o Ministério Público Federal cobram do policial militar a devolução de R$ 3 milhões aos cofres públicos. Até agora ele não mostrou prova concreta da participação do ex-ministro no esquema, mas só a delação bastou para derrubar Orlando Silva.

Isso não impediu que a oposição se aproximasse de Ferreira. Alguns políticos até posaram para fotos ao lado dele. "Todo fato terá exploração política. O que é importante é separar o joio do trigo, e investigar os elementos apresentados. A Polícia Federal e o Supremo já começaram a agir, e é isso que importa", acrescenta Monteiro.

O PCdoB e alguns aliados tentaram desqualificar as denúncias de Ferreira, que acusou Orlando Silva de cobrar propina de 20% das organizações que assinavam convênio com o ministério. "Tentar desacreditar o delator é muito comum. Mas recorrer à ideia de que uma pessoa de moral manchada não fala a verdade é um argumento falacioso", avalia Raymundo de Li­­ma, psicanalista e professor do Departamento de Fundamentos da Educação da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

Fiscalização

Jovita Rosa, diretora do Movi­­­mento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), diz que é preciso verificar muito bem as denúncias, pois o delator se move por interesses particulares. "A pessoa que abre a boca não o faz porque é honesta. Faz porque foi lesada, geralmente na hora da partilha do dinheiro", diz ela, que opinou em caráter privado, pois o MCCE ainda não fez uma avaliação do caso do Esporte.

Para Jovita, que trabalha como auditora do SUS há 18 anos, o Brasil precisa melhorar muito os sistemas de fiscalização e controle do gasto público. Sem isso, diz ela, o país continuará dependendo de dedos-duros. "A CGU [Contro­­ladoria-Geral da União] não dá conta. O governo não aplica recursos suficientes em controle. Mas isso deve ser visto como investimento, não é um gasto", afirma.

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