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O julgamento da Ação Penal 470 está chegando ao fim. Foram quase seis meses de sessões diárias do Supremo – algumas das quais com momentos humanos, demasiadamente humanos, por parte dos ministros e dos advogados. Por todos os ângulos que se o examine, o julgamento não foi nada fácil. Todos os dias, a Constituição suportou significativa pressão: foi um teste de força da norma constitucional brasileira. Foram vários os momentos difíceis para a Constituição: aqueles em que é grande a tentação de se fazer justiça deixando-se a norma constitucional de lado; aplicando-se a opinião do intérprete em detrimento da previsão normativa. Pois, nesta semana, a Constituição será submetida a mais um desafio: afinal, o que se discute é se o Supremo pode, imediatamente e sem qualquer submissão ao Poder Legislativo, decretar a perda do mandato de parlamentares já condenados.

O que diz a Constituição brasileira? O artigo 55 reserva a competência do Congresso Nacional para a efetiva perda do mandato de deputados e senadores, inclusive no caso de condenação criminal transitada em julgado (art. 55, inc. VI e § 2º). Quem "decide" ou "declara" o ato político da perda do mandato, nos termos desses dispositivos constitucionais, é a Câmara ou o Senado. Trata-se de (mais uma) consequência da condenação, a ser avaliada pelo Poder Legislativo. Claro que essa previsão pode ser colocada em xeque – sobretudo em vista da moralidade e da efetividade da decisão do Supremo.

A toda evidência, quando da elaboração da Constituição, o constituinte brasileiro nem sequer sonhava com uma ação do impacto jurídico-político da AP 470. Talvez por isso não tenha previsto expressamente a solução para dilemas dessa envergadura – muito embora a norma constitucional seja clara. Assim, cabe ao Supremo decidir. Haverá mais um momento bastante difícil para a força normativa da Constituição brasileira.

Egon Bockmann Moreira, advogado, doutor em Direito, professor da Faculdade de Direito da UFPR

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