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Rose cobrou por e-mail a transferência do carro para seu nome | Denise Andrade/ Estadão Conteúdo
Rose cobrou por e-mail a transferência do carro para seu nome| Foto: Denise Andrade/ Estadão Conteúdo

Perfil

Ex-chefe de gabinete "coleciona" desafetos

Agência O Globo

O ano é 1997. Luiz Inácio Lula da Silva ainda sonha em ser presidente. Os petistas se reúnem, em seu 11º Encontro Nacional, no antigo Hotel Glória, no Rio. De calças justas e um cinto largo, com detalhes em metal, Rosemary Noronha cruza o saguão aos gritos. Vai ralhar com um repórter que, inadvertidamente, recolhera de uma mesa cópias das teses que seriam debatidas pelo partido.

Rose, como é conhecida, tinha a função de secretária da presidência do PT, na época exercida por José Dirceu. E foi justamente para Dirceu que ela ligou, na manhã do último dia 23, para pedir ajuda, quando a Polícia Federal amanheceu em sua casa para fazer uma busca ao deflagrar a Operação Porto Seguro.

Dirceu ficou furioso, contaram seus interlocutores. Rose ligou, também, para o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para reclamar que os agentes da PF haviam entrado na residência e estavam recolhendo papéis, computadores e o que mais parecesse suspeito. Cardozo não atendeu. "O que ela esperava? Que nós fôssemos parar porque ela estava falando com o nosso chefe?", ironiza uma delegada da Polícia Federal.

Desde os tempos de secretária do PT, a ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo coleciona desafetos porque reina, ou tenta reinar, absoluta nos bastidores do enclave petista. Tem relação muito próxima com o ex-presidente Lula.

Desde 2003, quando foi nomea­­da por Lula para trabalhar na Presidência, Rose fez 24 viagens ao exterior na comitiva presidencial. Ela tinha direito a passaporte diplomático.

A ex-bancária, de 57 anos e duas­­ filhas, adorava ostentar poder. Arrumava confusão com porteiros e seguranças do prédio do Banco do Brasil onde fica o escritório da Presidência.

Rose ganhou o cargo após a saída de um dos aliados de Lula, José Carlos Espinoza. Se, como secretária do PT, gritava com repórteres, como chefe de gabinete chegava até a passar pito em ministros. Em uma cena dessas, em que tentou impedir que um ministro próximo de Lula fizesse uma reunião em determinada sala, ouviu-se do ministro: "Ela acha que manda".

Relatório da Operação Porto Seguro indica que o Mitsubishi Pajero TR4 de Rosemary Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo, pertenceu à organização que negociava pareceres técnicos desmantelada pela Polícia Federal e que era comandada pelos irmãos Vieira, ex-diretores de agências reguladoras. Os e-mails e documentos obtidos pela investigação sugerem que despesas do veículo podem ter sido pagas por Paulo Vieira, apontado pela PF como chefe do esquema.

Em um capítulo dedicado aos bens associados a Paulo Vieira, o relatório descreve um Pajero fabricado em 2010 e registrado em nome de Patricia Baptistella, funcionária da faculdade em Cruzeiro (SP) pertencente à família do ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA). Por e-mail enviado em 2 de maio de 2011, Rose cobra de Paulo Vieira a transferência do veículo para seu nome e a quitação de despesas como seguro e licenciamento.

"Estou muito preocupada com a questão da Pajero. Fiz todos os trâmites necessários do Controlar. E o seguro, licenciamento, vc (sic) fez?", pergunta Rose. "Vc renovou o seguro? Quando pretende passar o carro para o meu nome?" Em 26 de abril de 2012, os investigadores checaram o registro do veículo no Infoseg, sistema integrado de informações de segurança pública. O Pajero está em nome de Rosemary Noronha. O relatório não diz quando ocorreu a transferência. Não há, nos e-mails interceptados pela PF, menções a pagamentos ou compra e venda do Pajero. Pela tabela Fipe, o carro vale cerca de R$ 55 mil.

No mesmo e-mail, Rose cobra de Vieira um depósito de R$ 5 mil em sua conta para cobrir despesas relacionadas a um sofá e uma estante para o apartamento de sua filha Mirelle, ex-assessora técnica da Diretoria de Infraestrutura da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), exonerada na terça-feira (27/11). O irmão de Paulo, Rubens Vieira, era diretor de Infraestrutura desse órgão.

Na resposta enviada algumas horas depois, Paulo procura tranquilizar Rose. "Sobre o seguro, não me lembro de ter renovado. Vou verificar com o banco, pois todos os meus seguros são renovados automaticamente, mas esse talvez não foi, pois foi feito no seu nome, mas não impedimento (sic) para você mesmo fazer se necessário", escreve Paulo Vieira.

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