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Negócio suspeito

Pasadena põe em xeque as indicações políticas para conselhos de estatais

Revelação de que Dilma desconhecia cláusulas da compra de refinaria mostra a necessidade de qualificação para o cargo. Petrobras teve prejuízo de US$ 1 bilhão

Sede da Petrobras no Rio de Janeiro: como presidente do Conselho de Administração da estatal, Dilma Rousseff autorizou compra de refinaria sem saber de todos os detalhes do negócio | Bruno Domingos/ Reuters
Sede da Petrobras no Rio de Janeiro: como presidente do Conselho de Administração da estatal, Dilma Rousseff autorizou compra de refinaria sem saber de todos os detalhes do negócio (Foto: Bruno Domingos/ Reuters)

A revelação de que a Petrobras pagou US$ 1,2 bilhão pela refinaria de Pasadena (EUA), que vale US$ 180 milhões, expôs o Conselho de Administração da companhia e levantou a discussão sobre as nomeações políticas sem qualificação técnica para os colegiados de grandes empresas estatais. Na época da negociação, em 2006, o Conselho de Administração da Petrobras era presidido pela então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Próxima do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma tinha fama de boa gestora. Mas há duas semanas ela admitiu que não conhecia todas as cláusulas do contrato de compra da refinaria.

Veja a composição dos conselhos de quatro grandes companhias

As nomeações políticas são comuns em estatais, apesar do dinheiro público envolvido. Dos nove membros do conselho da Petrobras, por exemplo, sete são indicados pelo acionista controlador – o governo federal. Nenhum dos conselheiros atuais disputou ou ocupou cargos eletivos, mas há dois integrantes do primeiro escalão do governo: os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Mirian Belchior (Planejamento).

Nos conselhos de outras estatais, a presença de políticos é mais comum (veja o infográfico). Do Conselho de Administração da Itaipu, por exemplo, fazem parte o ex-governador do Paraná Orlando Pessuti e o ex-governador do Rio Grande do Sul Alceu Collares, além de João Vaccari Neto, militante histórico do PT. A Copel tem entre seus conselheiros o irmão do governador Beto Richa, José Richa Filho, o Pepe, que é secretário estadual de Infraestrutura e Logística. No Conselho da Sanepar estão o secretário de Estado da Saúde, Michele Caputo Neto, e Ezequias Moreira Rodrigues, assessor de Beto Richa envolvido no escândalo da "sogra fantasma".

Critérios

"Eu diria que o critério de escolha para uma empresa estatal é mais frágil do que o critério para uma empresa privada. Na empresa privada leva-se mais em conta a capacidade técnica do conselheiro", comenta Clécio Luiz Chiamulera, presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef) e fundador do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). "Normalmente vemos que são indicadas pessoas não tão preparadas para os conselhos de estatais. Sempre tem alguém que apoia um partido, que pode não ter muito conhecimento, mas é de confiança."

Chiamulera avalia que um conselheiro mais experiente poderia ter questionado a negociação que levou à compra da refinaria. "Pode até ser que a Dilma não soubesse [das condições da compra da refinaria], mas ela não tinha preparo para ser conselheira ou presidente do conselho de uma empresa como a Petrobras. Um conselheiro mais experiente poderia se cercar de pareceres jurídicos. Há ‘perguntas-receita’ que os conselheiros seguem e que ela não seguiu."

O administrador, consultor e conselheiro Carlos Rocha Velloso lembra que a formação dos conselhos é definida pelo estatuto da empresa, com amparo legal. Portanto, é natural que as estatais tenham mais cargos políticos, pois estão sob o controle do governo. "É normal que o acionista majoritário nomeie pessoas de sua confiança", afirma Velloso. Ele lembra que os conselheiros podem ser processados no caso de alguma decisão prejudicial à companhia e que muitos têm feito seguros. "É uma tendência mundial que também está ocorrendo no Brasil. O seguro existe para cobrir os custos do processo."

"Um conselho não pode ter só técnicos"

Integrante do Conselho de Administração da Itaipu Binacional, o ex-governador do Paraná Orlando Pessuti defende as indicações políticas para estatais. "Existem indicações políticas e indicações técnicas. As duas têm que existir. Um governo não se faz só com políticos ou só com técnicos", argumenta. "Um conselho não pode ter só engenheiros, advogados e contadores. Também preciso de decisões políticas."

Com larga experiência no movimento sindical e funcionário da Copel, o presidente do Sindicato dos Engenheiros do Paraná, Ulisses Kaniak, avalia que as indicações políticas são constantes na formação dos conselhos. "Quando o [Roberto] Requião assumiu o governo em 2002, queria manter a Copel pública e boa parte dos integrantes do conselho fazia parte da luta contra a privatização. Cada um deixa sua marca; a atual gestão preza mais os acionistas."

Os conselhos têm um representante dos funcionários, mas Kaniak diz que, historicamente, na Copel a atuação é dificultada. "Há posições muito fechadas", diz. "Já teve conselheira demitida durante o governo Jaimer Lerner. Ela foi readmitida no governo Requião, mas voltou ao conselho e foi novamente demitida. É uma posição difícil, quem se expõe demais pode sofrer uma retaliação."

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