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STF condena José Dirceu, Genoino, Delúbio e mais 5 por corrupção ativa

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem pela condenação dos petistas José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares

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Ninguém é indiferente a José Dirceu, condenado por corrupção ativa pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Desde a infância em Passa Quatro (MG), quando não ficava uma semana sem perder botões da camisa nas brigas com outros garotos, o ex-chefe da Casa Civil do governo Lula cruzou a vida tirando as pessoas da zona de conforto. Uma vez, ao confessar-se, fez o padre Olavo, o mais severo da cidade, mandar-lhe ao inferno. Mas Dirceu não teve dos outros apenas socos e xingamentos. A cada embate, amealhou apoios apaixonados, como o que se viu no domingo, ao ser protegido por uma pequena claque enquanto votava.

De 1966, quando iniciou a vida pública ao se eleger presidente do centro acadêmico da PUC-SP, até a condenação no STF, muito já foi dito sobre Dirceu. O historiador Daniel Aarão Reis, da UFF, destaca a capacidade de provocar grandes controvérsias e as guinadas de opinião ao longo da militância política. Para o escritor Fernando Morais, ele é um símbolo que não perde o brilho mesmo com o julgamento. Em 2005, logo após ser cassado, o próprio Dirceu tentou resumir a sua biografia: "Sou uma mistura de positivismo, formação marxista vulgar e experiência de vida."

Na ocasião, enquanto gravava para um projeto de memória do movimento estudantil, Dirceu confessou nunca ter lido, por completo, "O capital", de Karl Marx, considerado uma espécie de bíblia das esquerdas da época. Não havia tempo para isso. Dirceu chegou a São Paulo aos 14 anos. Morava em pensão no Bexiga e trabalhava como office boy para pagar o cursinho de pré-vestibular. Aprovado no curso de Direito da PUC, em 1965, já liderava o movimento estudantil da universidade no ano seguinte.

Ascensão rápida no movimento estudantil

Foi uma carreira meteórica. Em 1968, chegava a presidência da União Estadual dos Estudantes de São Paulo e encabeçava conflitos históricos contras os estudante da Universidade Mackenzie na Rua Maria Antônia. A tensão estava no ar, mas Dirceu conseguia ser revolucionário e sofisticado ao mesmo tempo. Era namorador, cuidadoso no vestir e ainda conseguia promover bailes no Beco, uma boate chique de São Paulo.

Sua vaidade, desde cedo, representou riscos. Era apaixonado por Iara Iavelberg, musa da esquerda paulista, mas o flerte durou pouco. Dois anos mais velha, ela preferiu se unir à luta armada. Dirceu acabou se interessando por uma jovem da PUC, que se chamava Heloísa ou Maçã Dourada, como era conhecida, que mais tarde, descobriu-se, era agente infiltrada do Dops. "Paguei o maior mico. Chegaram a fazer uma musiquinha de gozação."

Conheceu as grades em outubro de 1968, quando foi preso com outros 738 estudantes no congresso clandestino da UNE em Ibiúna, interior de São Paulo. A operação militar abortou-lhe a subida ao degrau mais alto do movimento estudantil, a presidência da UNE. Os detidos foram fichados e liberados, menos Dirceu e Vladimir Palmeira, que só deixariam o cárcere em setembro do ano seguinte, direto para o exílio no México, ao fazerem parte do grupo de 15 presos trocados no sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick.

Habituado a brigas de rua, Dirceu agora tinha inimigos mais sérios. Um grupo de militares radicais chegou a planejar o sequestro do avião que levaria 15 presos ao exílio, impedindo a fuga e provavelmente executando os passageiros: "Só não aconteceu porque um de nós dedurou o grupo. Fomos impedidos pelos fuzileiros navais", conta hoje um dos militares envolvidos na ação.

No exílio, Dirceu viveu em Havana, Cuba, até 1975. Depois de ser submetido a uma polêmica operação plástica, que lhe deu um nariz adunco e mudou as linhas da testa, ele voltou ao Brasil clandestinamente e passou a viver em Cruzeiro do Oeste, no Paraná, com o nome falso de Carlos Henrique Gouveia de Melo.

Com a anistia, em 1979, reassumiu a identidade, deixou a vida no interior do Paraná e regressou definitivamente para São Paulo, para recuperar o tempo perdido. No ano seguinte, assinaria a ficha de filiação ao PT, iniciando também a carreira no partido. Primeiro, como dirigente do Núcleo Jardim América. Em 1985, já fazia parte do diretório nacional, elegendo-se em seguida deputado estadual.

"No início, Dirceu tinha posições próximas de Cuba. Aos poucos, porém, foi mudando, ficando mais light. Passou a ser um homem de aparelho. Os adversários internos o chamavam de stalinista, mas ele soube mexer na organização interna do partido", analisa o sociólogo Marcelo Ridenti, da Unicamp.

Genoino: de adversário a companheiro

Um dos acusadores da época é hoje seu companheiro de banco dos réus, José Genoino. Mas a essa altura, já havia conquistado a confiança de Lula, a quem fora apresentado anos antes por Frei Betto. Foi um dos principais articuladores da candidatura do amigo a presidente da República. Eleito deputado federal em 1990, teve participação ativa na CPI do PC Farias e ganhou um protagonismo no PT que o levaria, com a bênção de Lula, a presidência do partido em 1995, cargo que só deixaria ao assumir a Casa Civil, em 2003.

"Dirceu era inicialmente um crítico de Lula. Atacava o seu populismo, chamava-o de coronel. Depois que ambos fizeram um acordo, passou a defender tudo que criticava", lamenta o economista Paulo de Tarso Venceslau, expulso do PT nos anos 1990.

Nada, porém, parecia capaz de deter a trajetória de Dirceu rumo à sucessão de Lula, em 2010. Mas Brasília não era o diretório nacional do partido, e a gravação do diálogo de seu assessor, Waldomiro Diniz, pedindo propina ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, divulgado em 2004, daria a guinada derradeira no projeto político do menino brigão de Passa Quatro.

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