
Brasília - A oposição ao governo Lula no Congresso tenta hoje uma façanha derrubar os vetos presidenciais que garantem o repasse de recursos para obras em quatro unidades da Petrobras com suspeitas de irregularidades graves. Só no ano passado, os parlamentares apreciaram 1.051 vetos totais e parciais dos presidentes Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e Lula e nenhum deles foi revertido. A última vez em que uma decisão do presidente foi alterada ocorreu há cinco anos.
Ainda assim, a mobilização foi forçada por interesse explícito dos congressistas. Na época, Lula considerou inconstitucionais os projetos de lei que concediam aumento aos servidores da Câmara dos Deputados e do Senado. Por intervenção direta do então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), prevaleceu a justificativa de que o Congresso tinha recursos para bancar o reajuste.
Desta vez, serão votados 74 vetos referentes a contratos sob suspeita nas obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, do terminal de escoamento de Barra do Riacho, no Espírito Santo, e das refinarias de Abreu e Lima, em Pernambuco, e Presidente Getúlio Vargas (Repar), em Araucária, na região metropolitana de Curitiba. As unidades integram uma lista com 24 empreendimentos que tiveram os recursos bloqueados em dezembro pela Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso. O órgão tomou a decisão baseado em relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU).
"Não tenho muita esperança de que vamos reverter essa situação, mas trata-se de uma questão de preservação da autonomia do TCU e do Poder Legislativo", diz o senador Alvaro Dias (PSDB), um dos principais defensores da derrubada dos vetos. Para que isso ocorra, porém, é necessária a aprovação da maioria dos deputados (257) e senadores (41). Como a oposição conta com cerca de 120 representantes na Câmara e 25 no Senado, uma vitória só seria possível com a adesão de governistas.
"Não vejo clima para que isso ocorra", afirma o deputado licenciado Ricardo Barros (PP). O paranaense foi vice-líder do governo na Câmara até dezembro, quando se afastou para se dedicar à pré-campanha para senador. Barros integrou o Comitê de Avaliação de Informações sobre Obras com Indícios de Irregularidades Graves da CMO, que avalizou a suspensão dos repasses para as quatro unidades da Petrobras com base na análise do TCU.
De acordo com o tribunal, os problemas estão relacionados a sobrepreço, ausência de planilhas de custos, projetos básicos deficientes e cronogramas de desembolso incompatíveis com o ritmo das obras além de pagamento de equipamentos parados pelo mesmo valor dos equipamentos em operação. Barros afirma que, antes do veto presidencial, o comitê esteve reunido com representantes da Petrobras e havia chegado a um acordo para a manutenção dos investimentos. A negociação não foi confirmada pelo presidente do comitê, deputado Carlos Melles (DEM-MG).
Segundo a assessoria do deputado mineiro, Melles e Barros participaram de uma reunião com diretores da Petrobras no dia 12 de janeiro em Brasília, mas não chegaram a uma definição e se comprometeram a retomar o assunto apenas no dia 2 de fevereiro, após o recesso parlamentar. Melles se disse "surpreendido" com a decisão pelo veto, que atropelou as conversas entre Congresso e Petrobras.
Ao todo, as obras com suspeitas representam investimentos de R$ 13,1 bilhões. A mais cara delas é a Repar, principal empreendimento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no Paraná, que deve receber R$ 9 bilhões até 2011. Dos 52 contratos em execução na refinaria, o tribunal apontou irregularidades em 19.
O veto presidencial que garante a sequência dos repasses é mais um episódio da queda de braço entre o governo Lula e TCU. Desde o ano passado, ministros e o próprio presidente têm criticado o suposto excesso de rigor nas fiscalizações. "Os entraves são demais: se parte do pressuposto de que todo mundo é desonesto até que se prove o contrário", disse Lula, em dezembro de 2009.
Para o professor de Orçamento Público da Universidade de Brasília, James Giacomoni, a interferência do governo no trabalho do TCU traz um mau precedente para os critérios de aplicação de recursos públicos no Brasil. "O Executivo já tem um poder muito grande sobre o orçamento e, quando usa a sua mão pesada para passar por cima do TCU e do Congresso, acaba desequilibrando ainda mais o sistema de pesos e contrapesos do jogo democrático. Obras públicas têm de ser feitas dentro dos requisitos previstos em lei. Se a lei é ruim, é outra discussão, que não justifica os vetos."
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