
Então é Natal, diz uma canção onipresente desta época. E tudo indica que a presidente Dilma Rousseff (PT) e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), se mantêm no cargo, apesar de todas as fases da Lava Jato e de todos os capítulos da longa crise política e econômica pela qual o Brasil passa. Mesmo com a surpreendente prisão do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) e do banqueiro André Esteves, na quarta-feira (25), são poucos os fatos concretos que poderiam provocar alguma ruptura institucional, seja no Palácio do Planalto, seja na Câmara, ainda nas próximas semanas.
Até a prisão de seu líder no Senado, o governo federal vinha conseguido emplacar uma agenda mínima, como há muitos meses não fazia. Na semana anterior, foi desarmada a “pauta-bomba” no Congresso, que manteve oito de 13 vetos de Dilma a projetos que criariam um adicional de R$ 63,2 bilhões aos cofres públicos até 2019. Na terça-feira antes das prisões, Delcídio atuou para o Senado aprovar uma medida provisória que possibilitou a realização do leilão de 29 hidrelétricas, no qual o governo federal arrecadou R$ 17 bilhões.
A situação de Cunha, por outro lado, vinha se deteriorando. No dia 16, o deputado federal Fausto Pinato (PRB-SP), relator do processo no Conselho de Ética contra o peemedebista por quebra de decoro, acatou a denúncia. Três dias depois, Cunha e aliados, calcados no Regimento Interno da Câmara, manobraram para derrubar a sessão do conselho na qual se faria a leitura do relatório preliminar do processo de cassação. Isso levou um grupo suprapartidário a anunciar a obstrução total no plenário, como forma de pressionar Cunha a deixar a presidência. Além disso, foi protocolado na Procuradoria-Geral da República (PGR) um documento que pede ao procurador-geral, Rodrigo Janot, para analisar a possibilidade de pedir o afastamento de Cunha do cargo.
A oposição quer usar o mesmo argumento utilizado para prender Delcídio – de que ele atrapalha as investigações – para pedir a saída de Cunha do cargo, já que ele também estaria obstruindo as apurações do Conselho de Ética.
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+ VÍDEOS“Pode até ser que os últimos acontecimentos ajudem Cunha e ele fique fora dos holofotes. Mas está difícil saber qual será o posicionamento dos parlamentares, que até agora ficaram em letargia por causa das prisões”, afirma o cientista político Cesar Romero Jacob, professor da PUC-Rio. “Há um número razoável de parlamentares que se sentem ameaçados pela forma como o Supremo agiu. Resta ver se isso vai apaziguar os ânimos, levando a uma acomodação, ou se vai aguçar ainda mais a disputa”, acrescenta.
Bastidores
Nos bastidores, aliados de Cunha teriam pedido votos favoráveis a ele no Conselho de Ética em troca do início do processo de impeachment de Dilma. O peemedebista também deixaria a presidência da Câmara, mas apenas se tivesse votos no conselho para manter o mandato.
Para o sociólogo Alberto Carlos Almeida, diretor do Instituto Análise, são muitas variáveis para se controlar neste cenário. “É demais achar que se pode controlar tudo. A cúpula do Senado queria voto secreto sobre a prisão e Delcídio, não conseguiu. E no Conselho de Ética, a votação é aberta, isso já está definido”, observa. A previsão é que a votação contra Cunha ocorra entre março e abril.
Delação
Um fato novo contra Dilma poderá vir da delação de Nestor Cerveró, pivô da prisão do senador e do banqueiro. No rascunho, o ex-diretor da área internacional da Petrobras teria afirmado que Dilma “sabia de tudo” sobre a refinaria de Pasadena, adquirida com superfaturamento de R$ 792 milhões. “Se o conteúdo vier à tona logo, pode ser a oportunidade que Cunha esperava para dar seguimento ao impeachment”, avalia o cientista político David Fleischer, da UnB. Mesmo que a Câmara comece a analisar o processo, isso se arrastará por pelo menos quatro meses, com a necessidade de o pedido ser aprovado por pelo menos 342 dos 513 deputados.



