
Ele está lá para apagar incêndios, mas há quem veja o risco de ele provocar alguns por conta própria. Uma das principais qualidades do vice-presidente Michel Temer (PMDB) é a habilidade política em negociar com os congressistas, justamente uma das maiores deficiências da presidente Dilma Rousseff (PT). Esse atributo, entretanto, tem sido tão acionado que surgem questionamentos sobre a atuação daquele que é o segundo na hierarquia da República.
Publicamente, nenhum petista reclama de Temer. E os peemedebistas gostam de exaltar as boas relações entre os dois maiores partidos da base aliada. Na semana passada, em um almoço com a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e congressistas do PT, um grupo do PMDB serviu um bolo de casamento, para "selar" a união entre Dilma e Temer.
O evento ocorreu bem no meio da crise no Ministério dos Transportes, que atingiu em cheio o Partido da República (PR). Desta vez, o PMDB fez de tudo para não se envolver no olho do furacão. Enquanto se discutia quem assumiria a pasta, o partido fez questão de dizer que não tinha interesse, mas deu apoio à presidente. E ainda promoveu o evento com o bolo, com bonequinhos de Dilma e Temer.
Ainda é cedo para saber se o PMDB vai manter a linha de "felizes para sempre" com a presidente. De acordo com especialistas, Temer, o maior articulador peemedebista, não tem perfil para manter a lua de mel. Na crise que culminou com a queda de Antonio Palocci e a ascensão de Gleisi Hoffmann à Casa Civil, por exemplo, o vice-presidente teve um papel central. Nas declarações públicas, ele defendeu o ministro. Mas o vazamento de uma discussão áspera dos dois é tido como fundamental para a perda de sustentação política de Palocci.
Segundo informações do jornal O Globo, na noite do dia 24 de maio, Palocci telefonou para Temer e ameaçou tirar ministérios do PMDB caso os deputados do partido não acompanhassem o governo na votação do Código Florestal. O vice-presidente teria colocado a conversa no viva-voz, para que outras pessoas ouvissem. Posteriormente, Palocci desculpou-se com Temer, ao mesmo tempo em que engolia a derrota do governo na votação. Mas a situação ficou insustentável e o petista perdeu o cargo.
Muito hábil
De acordo com o cientista político Rudá Ricci, esse acontecimento mostra bem o perfil de Temer. "Veja só a iniciativa dele de receber uma ligação e colocar no viva-voz. Ele é muito hábil, o pior dos inimigos", opina. Temer, com vasta experiência no Congresso com cinco mandatos de deputado federal por São Paulo , sabe como negociar em Brasília. "Politicamente, ele é mais forte que a Dilma. E esse é um grande problema para qualquer titular, tem um vice tão poderoso", avalia Ricci.
O PMDB, que tem a maior bancada do Senado (20, de um total de 81) e a segunda maior da Câmara (79, de 513) é fundamental para a governabilidade. E, apesar de fazer parte do governo federal, o apoio às causas do Planalto não é automático. E aí que Michel Temer ganha destaque: em uma frente, convencendo os correligionários sobre o caminho a ser seguido, e, em outra, batalhando por espaço, cargos e verbas para o PMDB. "Mas, na medida em que abre esse espaço, acaba criando um vácuo para outros aliados e partidos agirem, e os insatisfeitos todos pedem algo em troca para diminuir o peso político do PT", diz Ricci.
"O Temer tem perfil, tem atuação, tem prestígio no partido. Chegou à vice-presidência pela biografia dele. Por isso tudo, é natural seu protagonismo, é correspondente e era algo totalmente previsível", afirma o cientista político Octaciano Nogueira. Segundo ele, o PT já sabia de tudo isso ao oficializar a aliança com o PMDB.
Toda essa força não representa, necessariamente, um perigo à presidente Dilma Rousseff. "Ele é corresponsável pela gestão", explica Nogueira. Mesmo que a residência oficial do vice-presidente, o Palácio do Jaburu, seja palco de várias reuniões políticas, a desconfiança de que o local seja um local de conspiração é tida como um tanto exagerada. Ricci faz ressalvas, e afirma que o interesse do PMDB, assim como o do ex-presidente Lula, é para que Dilma faça um bom governo. "Mas nenhum deles quer ela tão forte", diz.



