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“O quinto de ouro”

Rio agoniza a cada novo capítulo dos escândalos de Cabral

Operação que prendeu 5 dos 7 conselheiros do Tribunal de Contas do Estado mostra uma série de esquemas que ultrapassam as barreiras da Lava Jato

Jorge Picciani, presidente da Assembleia do Rio, na Polícia Federal, para onde foi levado em condução coercitiva | ESTEFAN RADOVICZ/ESTADÃO CONTEÚDO
Jorge Picciani, presidente da Assembleia do Rio, na Polícia Federal, para onde foi levado em condução coercitiva (Foto: ESTEFAN RADOVICZ/ESTADÃO CONTEÚDO)

Destaque no planeta pelo seu desenho geográfico - que mistura praia e montanha numa formosura ímpar - é possível dizer que a extensão da corrupção no Rio de Janeiro, até o momento, parece também ser singular. O pontapé dado pela Operação Lava Jato, com seus braços e desdobramentos, revelou esquemas no Rio que atingem figurões além do mundo político. O que dizer de um tribunal - o Tribunal de Contas do Estado (TCE) - que teve cinco de seus sete conselheiros presos? O vencimento de um conselheiro desses ultrapassa R$ 30 mil, sem contabilizar as benesses naturais ofertadas para ocupantes desses postos, de indicações políticas.

A gênese desse esquema está na chegada de Sérgio Cabral, do PMDB, ao governo do Rio. Foi reeleito para o cargo. São revelações que surgem a cada dia sobre o ocorrido nas suas gestões, entre 2007 e 2014, a partir de acertos com empreiteiras. A esposa, Adriana Ancelmo, está envolvida. E presa. Espanta e indigna ainda mais o cidadão quando a corrupção vem acompanhada de “materialidade”, com a lista de bens adquiridos e sua exibição sem pudor. A notícia de desvio de dinheiro público estarrece, mas, como no caso do casal Cabral, se tem conhecimento que a verba surrupiada serviu para aquisição de joias, de ternos de grife e personalizados - com o nome de Cabral grafado na etiqueta - viagens internacionais, e suspeita de aquisição de lancha e helicóptero, indigna mais ainda.

Além de uma suspeita mensalidade de R$ 300 mil, em dinheiro vivo. Ainda tem aquelas cenas do então governador, com um grupo de seus secretários e um empreiteiro - Fernando Cavendish, da Delta - com guardanapos como bandanas na cabeça, numa espécie de dancinha - com joelhos dobrados e mãos para a frente - em Paris. Descobre-se mais tarde que Cabral pediu a Cavendish que comprasse uma joia para Adriana, no valor de R$ 800 mil, numa loja de grife em Mônaco. É tudo grandioso: Paris, joia, Mônaco, R$ 800 mil, hotel de luxo... Os pecados capitais ficam no chinelo. Perdem de goleada. É difícil crer que um administrador com esse comportamento tenha noção de espírito público e de busca do bem comum. O estado que governou agoniza. Tem uma economia combalida e servidores sem receber salário. O transporte público é precário.

Um morador da Baixada Fluminense que trabalha no Centro da cidade ou na zona sul começa a pegar ônibus, lotados, a partir das 4 da manhã. Sem falar do sistema de saúde. Há poucos dias, o Ministério Público e a Justiça Federal devolveram ao governo do Rio R$ 250 milhões que foram desviados dos cofres públicos pelo esquema de Cabral. Montante que foi utilizado para pagar o atrasado 13º salário de 146 mil aposentados e pensionistas. É o exemplo, na prática, de que roubar é tirar do cidadão. O Rio nunca foi exemplo de fornecedor de políticos edificantes. Vide muitos casos. Vide Eduardo Cunha. E pelo visto nem de conselheiros de tribunal.

Nos dois casos, há as exceções de praxe. A operação “O Quinto de Ouro”, desta quarta, de quebra ainda levou o presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani, do PMDB, a depor de forma coercitiva. Picciani é outra amostra da ambição política: ocupa seu sexto mandato como presidente da Assembleia. Já teve seu nome vinculado a acusação de exploração do trabalho escravo em uma de suas propriedades. É um cacique do partido. O envolvimento de conselheiros do TCE-RJ, quem zela pelas contas públicas, assusta, preocupa e exibe outra face da política: são os políticos, no caso os deputados estaduais, quem os escolhe.

Não é novo o surgimento dos nomes de fiscais do erário em feitos não republicanos. A “lista de Janot” - com pedidos de investigação derivados da Lava Jato - cita ministros do Tribunal de Contas União (TCU), quem aprova ou não as contas de gestores federais. Os ministros do TCU também são indicações do Legislativo, e precisam ser aprovados pela Câmara e Senado. Vários ex-parlamentares integram o tribunal. A Lava Jato foi pródiga em revelar essas imagens da corrupção, dos bens nas mãos dos envolvidos e capturados pelos investigadores: quadros de artistas plásticos renomados, relógios caros, carros de luxo, e um tanto mais. A investigação ainda vai gerar muitos filhotes nos estados.

Pelo menos cinco governadores estão citados na relação do procurador-geral da República. Todos nas mãos do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o mesmo que autorizou a ação desta quarta no Rio. Eis uma desafio: se algum desses esquemas será capaz de superar o que foi montado por Cabral no Rio.

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