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“O Congresso demora cinco anos para aprovar 
um projeto, mas os problemas são `on-line´" | Gilberto Abelha/Jornal de Londrina
“O Congresso demora cinco anos para aprovar um projeto, mas os problemas são `on-line´"| Foto: Gilberto Abelha/Jornal de Londrina

Senador pelo Distrito Federal, Cristovam Buarque (PDT) provocou uma polêmica na última semana ao propor um plebiscito para saber se o povo quer, ou não, que o Congresso Nacional continue aberto. A declaração recebeu críticas dos próprios colegas, o que levou Buarque a explicar que apenas levantou uma hipótese, em meio à onda de denúncias de irregularidades no Parlamento.

Em entrevista concedida à Gazeta do Povo, o senador e ex-ministro da Educação lembrou que a Constituição não permite o fechamento do Congresso, mas achou curiosa a reação das pessoas. "Se a situação estivesse boa, ninguém teria medo de um plebiscito", provoca. Para o senador, o Congresso vem se tornando um poder menor. Segundo ele, enquanto o Executivo legisla por medidas provisórias e o Judiciário, por meio de suas decisões, o Congresso permanece paralisado.

Para que Câmara e Senado retomem uma posição de destaque, o senador considera ser necessário que o Legislativo seja mais transparente – a fim de acabar com as "mordomias" – e que os parlamentares passem mais tempo em Brasília discutindo os problemas do país e tornando a pauta do Congresso mais próxima das necessidades da população.

Ao avaliar o cenário político para 2010, o senador disse também que ainda não há consenso no PDT para apoiar a candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff. E afirmou estar à disposição do partido para concorrer ao cargo, se assim for o desejo dos pedetistas.

Após os últimos escândalos envolvendo o Senado, o senhor comentou que alguém acabaria propondo o fechamento do Congresso. O comentário causou algumas reações de políticos. Qual é a sua posição a esse respeito?

Isso não vai acontecer. Foi só uma hipótese que levantei. Um plebiscito dessa natureza nunca seria convocado, porque a separação de poderes é cláusula pétrea da Constituição. Mas o que eu quis dizer é que há um descontentamento muito grande com o nosso trabalho. Isso é óbvio.

O que mais me preocupou é que, quando falei que alguém acabaria propondo uma consulta sobre o assunto, as pessoas reagiram como se um plebiscito fosse levá-las a optar por votar favoravelmente ao fechamento do Congresso. Se a situação estivesse boa, ninguém teria medo de um plebiscito sobre o fechamento do Congresso. Mas houve uma unanimidade de que, se houvesse o plebiscito, o povo pediria para fechar. Se a situação é essa, temos de realizar uma mudança, porque nenhum Congresso dura se não tem o respeito do povo. Um time pode ficar 20 anos perdendo, que não perde o torcedor. Mas o Congresso não pode perder o respeito do povo por 20 anos sem ficar desacreditado.

O senhor chegou a comentar que era preciso "desmordomizar" a República. O que significa isso?

É preciso acabar com todos os privilégios que o país foi criando ao longo do tempo e que ainda mantém. Privilégios que existem no Congresso, no Judiciário e no Executivo. Há muito luxo neste país quando se compara com a situação da população pobre.

O que teria de mudar para acabar com as mordomias no setor público?

Aí teríamos de analisar o que a gente gasta, o que é necessário para o trabalho e o que não é necessário. Acho que se a gente tiver transparência, "desmordomiza". Ninguém usa mordomia na frente do povo. Isso é sempre uma coisa que se usa escondido.

Que problemas o senhor vê no Senado?

Em primeiro lugar, nós ficamos apenas dois dias em Brasília por semana. Não temos tempo de "parlamentar" entre nós, de discutir os problemas do país. A gente vem, faz discurso e vai embora. Em segundo lugar, há um divórcio entre nossas falas e os problemas concretos da realidade brasileira. Em terceiro, nós não nos adaptamos à realidade do avanço técnico, que criou uma situação nova. A democracia precisa se adaptar à realidade do "on-line". O Congresso demora cinco anos para aprovar um projeto, mas os problemas são "on-line".

E como resolver esses problemas?

A transparência resolveria quase todos, principalmente os relacionados às mordomias. Agora, era melhor que os parlamentares passassem mais tempo em Brasília. Não se pode sair todas as semanas daqui. É preciso também que a pauta de discussão do Congresso seja igual à pauta do povo.

O senhor acha que é o caso de se fazer uma reforma política?

Claro. Mas não vejo muita vontade de se fazer uma reforma. Deveríamos ter somente financiamento público de campanha, com proibição de qualquer outra forma. É preciso acabar com a reeleição, que se tem mostrado um mal à democracia. Mas nada vai ser resolvido se não houver uma mudança substancial na qualidade de educação para todos. Só resolveremos os problemas do Brasil com uma revolução na educação, com uma carreira nacional de magistério e um programa de qualidade de ensino.

O Congresso não vem conseguindo legislar e o Poder Judiciário vem assumindo algumas funções do Parlamento. Qual sua opinião a esse respeito?

O maior dos problemas do Congresso é que ele está se tornando irrelevante. Porque quem manda hoje é o Poder Executivo, com as medidas provisórias. E o Judiciário, com suas decisões. O Congresso está ficando numa posição menor em relação aos outros poderes. As medidas provisórias não deveriam ficar a critério do presidente. Deveriam passar por conselho do Congresso que avaliasse se há urgência para a edição das medidas. Se não houver urgência, que o assunto seja analisado como projeto de lei.

O senhor foi candidato à Presidência em 2006, foi ministro de Lula no primeiro mandato, e tornou-se um crítico do governo. O presidente do seu partido, Carlos Lupi, sinaliza que o PDT deve apoiar o PT em 2010. O senhor partilha dessa posição?

Eu me coloquei à disposição do partido para ser novamente candidato a presidente. Se o partido quiser, serei candidato. Acho que o partido não decidiu ainda se apoia a Dilma ou se terá candidato próprio. Está na mesma situação do PSB, que tem o (deputado federal) Ciro Gomes, que muitos dizem que vai ser candidato.

Qual a sua avaliação sobre a proposta do Ministério da Educação de unificar os vestibulares das universidades federais a partir da reformulação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)?

A proposta não é ruim. Mas apenas unifica os vestibulares; não muda o processo de seleção. Eu acho que o sistema deveria ser como o que implantei quando era reitor da UnB (Universidade de Brasília), onde a seleção é feita dentro da escola de 2º grau, escolhendo-se os melhores alunos.

O senhor é favorável ao sistema de cotas raciais ou sociais para o ingresso em universidades públicas?

As cotas são como um remédio. Ninguém gosta de tomar. No Brasil há uma doença – o fato de que há 121 anos se acabou a escravidão e a elite continua branca. Isso é uma doença. Então tem de mudar a cara da elite brasileira. O único jeito são as cotas.

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