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| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Neste ano, o Congresso Nacional começou os trabalhos prometendo uma ampla reforma política no país. O Senado e a Câmara dos Deputados criaram comissões especiais para debater o tema. Forma de votação, a questão dos suplentes dos senadores e o financimento público de campanhas foram alguns dos pontos discutidos pelos parlamentares. Apesar do aparente esforço dos congressitas brasileiros, ainda há um clima de ceticismo quanto à amplitude da reforma e se ela realmente sairá do papel.

Para o professor de Ciência Política Luiz Domingos Costa, da Facinter, apenas quando a sociedade tiver uma ideia clara do que entende como reforma política é que poderá se organizar e pressionar o Congresso a aprovar as mudanças. Em entrevista à Gazeta do Povo, Costa faz a defesa do voto obrigatório e diz que é preciso "confiar no eleitor brasileiro".

Há razão para acreditar que uma reforma política ampla pode acontecer?

Uma reforma com contornos mais nítidos só sai se houver consenso entre os partidos e agentes organizados da sociedade civil. Enquanto houver a divergência total, a reforma naufraga no Congresso, como já ocorreu em outras oportunidades. Então a governabilidade vai impedir a reforma outra vez?

A ideia de uma reforma política no singular é falsa. Por mais que se tenha muito otimismo, ainda não se vislumbra a convergência do debate. Cada organização tem a sua reforma, que não tem nada a ver com a do vizinho. Os partidos que têm as melhores intenções não conseguem pressionar através de conflito e negociação. O que deve estar em perspectiva na reforma política é melhorar a forma de representação política do cidadão.

Enxugar o número de partidos poderia ser um caminho para isso?

Para o tipo de organização política do Brasil a diminuição do número de partidos é nociva por conta da heterogeneidade de interesses. Nos acostumamos a apontar para as fraquezas de nossa democracia. No entanto, há uma série de pontos positivos se compararmos o Brasil com outras democracias muito consolidadas como a inglesa, por exemplo. Lá, a terceira força partidária, os liberais democratas, consegue angariar cerca de 20% dos votos, mas apenas 7% de cadeiras no parlamento. Há uma enorme distorção entre o interesse do eleitorado e o poder conferido ao partido.

No Brasil não há esta desproporção?

Não nesses níveis. Há no Brasil a vocação entre eleitores e elite política para o pluripartidarismo.

Como se pode então fortalecer os partidos?

Há muitas alternativas, tão vastas quanto incertas. Uma é o mecanismo das prévias, que pode transformar o partido numa arena mais sólida. Outro mecanismo possível seria o fechamento da lista de candidatos. O eleitor identifica um partido e um conjunto de nomes inflexível. Hoje, um partido pode apresentar certos nomes que ficam à mercê de puxadores de voto. Com a lista fechada, o ônus de ter um candidato que tem o nome envolvido em algum escândalo de corrupção fica para o partido.

Miguel Arraes [ex-governador de Pernambuco] dizia que a lista fechada era ótima, só faltava saber quanto os políticos terão de pagar para se colocarem bem nela. Este sistema não exige um amadurecimento que os partidos talvez não tenham?

Pode ser que sim. Principalmente em partidos de aluguel, que não têm programa nem organização interna. Nos grandes partidos, porém, a disputa é muito intensa. Se alguém quiser comprar a posição na lista vai sofrer o revide. E essa refutação serve também para a lista aberta como no caso de candidaturas-laranjas. Mas não seria esta prática que joga toda a opção no lixo.

E quanto ao voto, deve ser facultativo ou obrigatório?

Há quem ache que com o voto facultativo você terá uma participação eleitoral melhor, pois só os que têm vontade de votar vão comparecer. E por outro lado, numa visão individualista, o voto obrigatório seria uma interferência exagerada na liberdade individual do cidadão. No meu ponto de vista, é errado achar que as pessoas politicamente interessadas e ativas são muito melhores do ponto de vista eleitoral, do que as que estão mais distantes. Se levado às últimas consequências, fazer uma divisão entre o eleitor interessado, e portanto, bom. E o desinteressado, e portanto, ruim. Isto não é verdade.

Por quê?

O eleitor politicamente interessado, em função de critérios morais ou de fanatismo religioso, não é necessariamente um eleitor bom. Ao passo que um eleitor aparentemente desinteressado pode ter uma visão mais moderada.

Caso o voto fosse facultativo como se comportaria o eleitor brasileiro?

Com voto facultativo perde-se muito em representatividade. A Venezuela fez isso, por exemplo. Houve uma queda de comparecimento eleitoral de 30%. Isto é ruim para qualquer sistema político que almeje legitimidade. É natural que os indivíduos que não se sentem representados não se sintam interessados em votar.

E como despertar esse interesse em participar do processo eleitoral?

Quando você faz o cidadão votar de forma repetida. O eleitor quando está na faixa dos 30 anos e está participando da quarta ou quinta eleição de sua vida, aumenta o sentimento de eficácia política.

Como assim?

O sentimento de que eu estou interferindo diretamente no funcionamento de minha comunidade. Percebo melhorias reais e vejo que contribuí para isso. Quando você tem o eleitor exercendo seguidamente o voto aumenta este sentimento. Em outras palavras, só a participação eleitoral educa politicamente. É preciso confiar um pouco mais no eleitor. Passamos 21 anos negando a capacidade do eleitor de escolher o presidente. Hoje, o eleitor tem escolhido os presidentes e eles estão melhorando o país.

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