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Doação pode ser improbidade

O governador Roberto Requião poderá ter muita dor de cabeça caso cumpra a promessa de sortear um ônibus entre os deputados da base aliada durante a próxima sessão de sua "escolinha". Se o dinheiro da compra do veículo tiver como origem os cofres públicos, a ação do governador pode ser considerada como improbidade administrativa. Essa é a opinião do presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri.

"Se for dinheiro público, é improbidade administrativa. Dessa maneira, o governador pode até ser cassado e todos os envolvidos no ato podem receber como pena a perda dos direitos políticos e a obrigação do ressarcimento aos cofres públicos", explica o advogado. Segundo ele, o sorteio fere os princípios da administração pública, já que não há o benefício coletivo, mas sim o individual.

O professor de Direito Administrativo André Folloni, do Centro Universitário (UnicenP), diz que, se existir dotação orçamentária, o governador pode comprar o veículo. Mas, para ele, a distribuição do ônibus deveria atender a outros parâmetros. "O critério da presença do deputado na reunião não é adequado. Agora, se o ônibus é comprado com dinheiro privado, é um presente de um governador a um deputado. Ainda assim, parece estranho porque permite que se imagine qual é o motivo do presente e se é uma forma de tentar trazer o deputado para perto do governador. E isso feriria a moralidade administrativa."

Enquanto o governo do estado promete sortear um ônibus aos deputados que comparecerem à próxima "escolinha de governo", seis em cada dez municípios do estado enfrentam graves problemas no transporte escolar, segundo estimativa de representantes da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) no Paraná. Superlotação, ônibus sem itens obrigatórios de segurança, problemas mecânicos e atrasos são problemas comuns no interior. Para essas cidades, um ônibus novo pode fazer muita diferença na oferta de um transporte de maior qualidade aos alunos.

E mais um detalhe que torna o anúncio do governo do estado mais indigesto: 52% dos alunos transportados pelos municípios (216 mil estudantes, em todo o Paraná), são da rede pública estadual, segundo a Undime. Ou seja, são de responsabilidade do governo.

E, embora a administração estadual tenha recentemente aumentado em 21% a verba destinada às prefeituras para fazer o transporte escolar, o dinheiro não cobre nem metade dos gastos. Para este ano, os municípios devem gastar R$ 100 milhões com transporte escolar. E o governo do estado promete repassar apenas R$ 40 milhões.

A cidade de Ortigueira, na região central do estado, é uma das que têm problemas para manter o transporte escolar. Mas não tem chance de ganhar o ônibus que o governador Roberto Requião pretende sortear. Segundo o prefeito Geraldo Magela (PSDB), nenhum parlamentar governista representa o município (de acordo com o governo, o deputado que ganhar o sorteio pode escolher qualquer município para repassar o veículo).

Magella, apesar de apoiar o governador, não concorda com o sorteio. Ele acredita que o critério para contemplar um município com o ônibus deveria ser a real necessidade, o que certamente incluiria a cidade na lista de prováveis merecedores do veículo. Terceiro maior município em extensão no estado – 160 quilômetros de um extremo ao outro –, Ortigueira não pode menosprezar o transporte escolar. O nível de escolaridade é um dos critérios do índice de desenvolvimento humano (IDH) e a cidade se esforça para sair da última posição no estado. Além disso, 65% da população está na zona rural, forçando a oferta do transporte.

Segundo Magela, a prefeitura gasta quase 10% do orçamento com transporte escolar. Do R$ 1,7 milhão gasto no ano passado, o governo federal colaborou com R$ 69 mil e o estadual com R$ 248 mil. São 174 linhas que atendem 4,2 mil alunos. O prefeito estima ainda que apenas 30% dos estudantes transportados são de responsabilidade do município. Os outros são da rede estadual.

Nota

Ontem, após a polêmica do dia anterior, a Gazeta do Povo recebeu um e-mail, remetido pela Agência Estadual de Notícias do governo, que continha uma irônica nota que dava a entender que o anúncio do sorteio não passou de uma brincadeira – argumento que igualmente foi usado pelos deputados governistas da Assembléia Legislativa. A Casa Civil, procurada pela reportagem, porém, informou que não se pronunciaria sobre o caso do sorteio do ônibus.

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