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Se não tivesse firmado o acordo de delação premiada, o ex-diretor de abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, teria sido condenado a sete anos e seis meses | UESLEI MARCELINO/REUTERS
Se não tivesse firmado o acordo de delação premiada, o ex-diretor de abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, teria sido condenado a sete anos e seis meses| Foto: UESLEI MARCELINO/REUTERS

A ação penal resultante da Operação Lava Jato que tratava de irregularidades nas obras da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, terminou com oito réus condenados. O juiz federal Sérgio Moro, responsável pelo caso, condenou o doleiro Alberto Youssef, apontado como chefe do esquema, a três anos de prisão em regime fechado. Já Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, vai cumprir pena de dois anos em prisão domiciliar.

Se não tivessem firmado acordo de delação premiada, as penas de Costa e Youssef seriam maiores. Youssef seria condenado a 13 anos e oito meses de prisão. Já o ex-diretor de abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, seria condenado a sete anos e seis meses.

‘Crimes não são cometidos no céu’, diz juiz da Lava Jato

Na sentença em que condenou o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, o doleiro Alberto Youssef e mais seis, por crimes oriundos de desvios de recursos públicos da Refinaria Abreu e Lima (RNEST), nesta quarta-feira, 22, o juiz Sérgio Moro, que conduz as ações penais da Operação Lava Jato, defendeu a delação premiada. Desde o início da operação, em março de 2014, vários investigados firmaram termos de colaboração com a força-tarefa da Lava Jato. “Sem o recurso à colaboração premiada, vários crimes complexos permaneceriam sem elucidação e prova possível. Em outras palavras, crimes não são cometidos no céu e, em muitos casos, as únicas pessoas que podem servir como testemunhas são igualmente criminosos”, afirmou Moro na sentença.

As informações prestadas por Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef, pelo ex-gerente da estatal petrolífera Pedro Barusco, pelo lobista Julio Gerin Camargo, pelos executivos Augusto Mendonça, do grupo Setal, Eduardo Leite e Dalton Avancini, ambos da Camargo Corrêa, pelo engenheiro Shinko Nakandakari, pelo operador de câmbio Luccas Pace Junior e pelo advogado Carlos Alberto Pereira da Costa foram essenciais para desvendar o esquema de corrupção e propinas instalado na Petrobras. Durante as investigações, diversos réus questionaram os acordos de delação premiada e pediram a nulidade dos termos. “Argumentar, por exemplo, que o colaborador é um criminoso profissional ou que descumpriu acordo anterior é um questionamento da credibilidade do depoimento do colaborador, não tendo qualquer relação com a validade do acordo ou da prova”, afirmou o juiz.

“Questões relativas à credibilidade do depoimento resolvem-se pela valoração da prova, com análise da qualidade dos depoimentos, considerando, por exemplo, densidade, consistência interna e externa, e, principalmente, com a existência ou não de prova de Corroboração. Ainda que o colaborador seja um criminoso profissional e mesmo que tenha descumprido acordo anterior, como é o caso de Alberto Youssef, se as declarações que prestou soarem verazes e encontrarem corroboração em provas independentes, é evidente que remanesce o valor probatório do conjunto.”

A validade da delação do doleiro foi questionada por alguns réus. Segundo a defesa dos investigados, a colaboração de Youssef não seria legítima, pois ele havia rompido acordo de delação firmado no caso Banestado, na década de 90. “Entretanto, mesmo vista com reservas, não se pode descartar o valor probatório da colaboração premiada. É instrumento de investigação e de prova válido e eficaz, especialmente para crimes complexos, como crimes de colarinho branco ou praticados por grupos criminosos, devendo apenas serem observadas regras para a sua utilização, como a exigência de prova de corroboração”, apontou Moro.

“Quem, em geral, vem criticando a colaboração premiada é, aparentemente, favorável à regra do silêncio, a omerta das organizações criminosas, isso sim reprovável. Piercamilo Davigo, um dos membros da equipe milanesa da famosa Operação Mani Pulite, disse, com muita propriedade: “A corrupção envolve quem paga e quem recebe. Se eles se calarem, não vamos descobrir jamais”.”

Propinas

As delações firmadas com a força-tarefa da Lava Jato mostraram que um dos braços do esquema de corrupção instalado na Petrobrás alcançou a Refinaria de Abreu e Lima, de propriedade da estatal. O engenheiro Shinko Nakandakari declarou que pagou propinas para o gerente geral da Refinaria de Abreu e Lima Glauco Colepícolo Legatti, inclusive após a deflagração da operação. Legatti nega o recebimento.

“Nunca houve qualquer coação ilegal contra quem quer que seja da parte deste Juízo, do Ministério Público ou da Polícia Federal na assim denominada Operação Lava Jato. As prisões cautelares foram requeridas e decretadas porque presentes os seus pressupostos e fundamentos, boa prova dos crimes e principalmente riscos de reiteração delitiva dados os indícios de atividade criminal grave reiterada, habitual e profissional. Jamais se prendeu qualquer pessoa buscando confissão e colaboração”, disse Moro.

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, houve desvios de dinheiro público na construção da refinaria, por meio de pagamento de contratos superfaturados a empresas que prestaram serviços direta ou indiretamente à Petrobras, entre 2009 e 2014. A obra, orçada inicialmente em 2,5 bilhões de reais, teria alcançado atualmente o valor global superior a 20 bilhões de reais.

“Certamente, a colaboração não decorre, em regra, de arrependimento sincero, mas sim da expectativa da obtenção pelo criminoso de redução da sanção criminal. Se o processo, a perspectiva de condenação e mesmo as prisões cautelares são legais, é impossível cogitar de qualquer “coação ilegal” da parte da Polícia Federal, Ministério Público Federal ou da Justiça Federal. Não há qualquer invalidade ou reprovação cabível à postura da Acusação que, em troca da verdade e apenas da verdade, oferece ao criminoso tratamento legal mais leniente. Ameaçar com o devido processo legal não é propriamente uma coação ilegal”, afirmou o juiz.

Por causa do acordo de delação premiada, Youssef vai cumprir apenas três anos da pena em regime fechado. Paulo Roberto Costa cumprirá prisão domiciliar até o dia 1º de outubro de 2015 e, em seguida, cumprirá o regime semiaberto por mais um ano. O restante da pena será cumprida pelo ex-diretor em regime aberto.

O diretor das empresas Sanko Sider e Sanko Serviços, Márcio Bonilho foi condenado a 11 anos e seis meses de prisão em regime fechado. A condenação foi a mesma para o laranja de Youssef,Waldomiro Oliveira.

Leonardo Meirelles, dono da empresa Labogen, foi condenado a cinco anos e seis meses de prisão em regime semiaberto. O irmão dele, Leandro Meirelles, foi condenado a seis anos e oito meses, também em regime semiaberto.

Pedro Argese, considerado laranja de Youssef e Leonardo Meirelles na empresa Piroquímica, foi condenado a quatro anos, cinco meses e dez dias de prisão em regime semiaberto. Esdra de Arantes Ferreiras foi condenado por Moro a mesma pena de Argese, também em regime semiaberto. O juiz ainda absolveu os réus Antônio Almeida Silva e Murilo Tenia Barros dos crimes de lavagem de dinheiro.

Multa

A Justiça Federal fixou em R$ 18,64 milhões indenização em favor da Petrobras, reconhecida como vítima na sentença de condenação do ex-diretor de Abastecimento da estatal, Paulo Roberto Costa, do doleiro Alberto Youssef e de outros seis alvos da Operação Lava Jato por supostos crimes de lavagem de dinheiro e organização criminosa nas obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

O valor é o mesmo que teria sido ‘lavado’ por meio da aquisição de bens pelos condenados. A indenização, no entanto, não recai no ex-diretor e no doleiro que fizeram delação premiada e “estão sujeitos a indenizações específicas previstas no acordo de colaboração”.

Foram provadas pelo menos vinte operações de lavagem de dinheiro, no total de R$ 18.645.930,13, entre 23 de julho de 2009 a 2 de maio de 2012, “envolvendo os repasses do Consórcio à empresa MO Consultoria”. Foi ainda considerada provada uma operação de lavagem na aquisição por Youssef da Land Rover para Paulo Roberto Costa, “com ocultação da origem criminosa e titularidade dos valores envolvidos”.

O juiz da Lava destacou que foi provado que “os acusados teriam se associado de forma permanente e estruturada para a prática de crimes graves, configurando o crime de pertinência a grupo criminoso organizado, ainda que não do tipo mafioso”.

Acordos

Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa firmaram acordo de delação premiada com a Justiça, em troca de uma pena menor no caso. Os dois revelaram com detalhes o esquema de fraude nas licitações da estatal e a formação de um cartel na concorrência dos certames. Eles também revelaram à Justiça os nomes de políticos e partidos envolvidos no pagamento de propina. Com base nos depoimentos, o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu inquéritos para investigar parlamentares com foro privilegiado. Três paranaenses integram a lista: os deputados federais Dilceu Sperafico (PP) e Nelson Meurer (PP) e a senadora Gleisi Hoffmann (PT).

Paulo Roberto Costa cumpre prisão domiciliar no Rio de Janeiro desde o dia 1º de outubro do ano passado e, de acordo com o acordo firmado com a Justiça, vai ter que devolver R$ 70 milhões aos cofres públicos.

Entenda o caso

De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal, a organização atuava em contratos da Petrobras. De acordo com os depoimentos de Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, um esquema de cartel decidia as empresas que venceriam licitações da Petrobras. Os contratos eram superfaturados e cada empresa precisava pagar uma propina de 3% do valor líquido do contrato, que eram divididos entre três grandes partidos políticos - PT, PP e PMDB. Segundo os depoimentos, havia um intermediário responsável pelo recebimento da propina em cada partido: João Vaccari Neto (para o PT), Fernando Soares (para o PMDB) e Youssef (para o PP) faziam os repasses. Pelo menos três diretorias estavam envolvidas no esquema: Engenharia e Serviços, Abastecimento e Internacional.

As empresas contratadas pela Petrobras firmavam contratos fictícios com empresas fantasmas controladas por Youssef. Em seguida, o dinheiro da propina era enviado a contas no exterior, também controladas pelo grupo. Parte desse dinheiro retornava ao Brasil como investimento nas empresas de Youssef e outra parte era depositada na conta de políticos, diretores da estatal e intermediadores.

A PF suspeita de irregularidades na Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que tinha um valor estimado em R$ 2,5 bilhões. O superfaturamento estimado está atualmente em R$ 613 milhões, de acordo com o Tribunal de Contas da União. As obras em outras refinarias também podem ter superfaturamento - incluindo a Refinaria Getúlio Vargas (Repar), no Paraná .

Novas denúncias foram apresentadas a partir das investigações de contratos com a Petrobras. O ex-diretor Paulo Roberto Costa responde a mais cinco ações penais referentes a desvios da Diretoria de Abastecimento. Executivos de seis empreiteiras – Engevix, Galvão Engenharia, Mendes Junior, OAS, Camargo Corrêa e UTC - também são alvo nesses processos.

A Diretoria de Serviços também já é alvo de ações penais em curso na Justiça. O ex-diretor Renato Duque é um dos réus e as irregularidades foram encontradas em obras da Repar, da Refinaria de Paulínea (Replan) e em dois gasodutos.

A Diretoria Internacional também já foi alvo de denúncias e o ex-diretor Nestor Cerveró é acusado de receber propina pela contratação da empresa coreana Samsung para fornecimento de navios sonda.

Outras condenações

Essa é a terceira sentença referente à Operação Lava Jato. Na primeira decisão, o juiz Sérgio Moro absolveu o doleiro Alberto Youssef no processo que tratava dos crimes de tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. A segunda sentença condenou a doleira Nelma Kodama a 18 anos de prisão.

Outra ação penal referente a operação foi suspensa em setembro. O processo contra Carlos Alexandre de Souza Rocha, acusado de operar uma instituição financeira informal, sem a autorização do Banco Central, foi suspenso sob uma série de condições impostas pela Justiça Federal. Caso cumpra os requisitos e não seja processado por outro crime no prazo de dois anos, a Justiça Federal vai declarar extinta a punibilidade no caso, ou seja, o processo chega ao fim.

Outras 15 ações penais referentes à Lava Jato ainda estão em andamento na Justiça Federal do Paraná. Elas tratam de denúncias contra mais três núcleos de doleiros: o de Carlos Habib Chater, que deu origem as investigações, o de Raul Henrique Srour e o de Alberto Youssef. Outras ações penais são referentes à participação dos executivos de grandes empreiteiras no esquema.

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