Saúde e Bem-Estar

Amanda Milléo

Tomar remédio de pressão antes de dormir reduz eventos cardíacos

Amanda Milléo
11/11/2019 08:00
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Horário de tomada do remédio contra a pressão alta pode interferir no risco de eventos cardiovasculares à noite Foto: Bigstock.

Se puderem escolher entre manhã e noite, pessoas com a pressão arterial alta podem ter mais benefícios se tomarem os remédios contra a doença à noite, ou antes de dormir.
A conclusão é do estudo clínico Hygia Cronoterapia, cujos resultados foram divulgados no fim de outubro pela revista científica European Heart Journal”.
Para chegar a esses resultados, os pesquisadores analisaram a rotina de 19 mil pacientes com hipertensão, durante um período de seis anos.
Os participantes foram divididos em dois grupos: aqueles que faziam uso da medicação pela manhã e aqueles que tomavam pelo menos um remédio de controle da pressão arterial à noite.
Além de uma melhora no controle da pressão arterial ambulatorial, o estudo demonstrou que quem tomava o remédio no período noturno tinha uma redução no risco de eventos cardiovasculares, como infarto e derrames.

Risco de infarto maior à noite

Há dois fatores que colaboram com benefícios de se tomar o remédio antes de dormir, conforme lembra Dalton Précoma, médico cardiologista e diretor científico da Sociedade Brasileira de Cardiologia:
  • Eventos cardiovasculares, tais como infartos, AVCs e derrames, são mais comuns no período da madrugada;

  • Remédios têm um tempo de ação limitado no organismo. No caso dos anti-hipertensivos, que podem ser de 24 horas, nem sempre eles protegem durante todo esse período.

Assim, quem tem o hábito de tomar o remédio pela manhã, por exemplo, poderá não ter a mesma proteção à noite, quando for dormir.
“A ação do remédio vai se perder justamente no período mais vulnerável. Não significa que o remédio, sozinho, proteja contra o infarto, mas esses momentos de maior vulnerabilidade devem ser mais cuidados”, reforça o médico.
Embora o risco de eventos cardíacos durante a noite seja algo conhecido dos médicos, como reforça o cardiologista Miguel Morita, não havia indicativos do que os especialistas deveriam fazer com essa informação.

“Não se sabia o que fazer com essa pressão noturna. Esse estudo é razoavelmente surpreendente. A redução dos eventos cardíacos foi muito forte (45%). Esse estudo sugere que talvez devêssemos pedir para que os pacientes tomem à noite, em vez de manhã, o que era um hábito”, explica o médico, que atua na Quanta Diagnóstico por Imagem, em Curitiba, futuro diretor científico da Sociedade Paranaense de Cardiologia, e professor de Cardiologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Cuidado com diuréticos

A mudança não traria diferenças do ponto de vista prático, segundo Morita. O único ponto de discussão está nos remédios diuréticos, que favorecem a produção de urina. Tomados à noite, portanto, aumentariam as idas do paciente ao banheiro durante a madrugada.

“Mas entre os anti-hipertensivos, apenas alguns são diuréticos. Há pelo menos quatro classes de medicamentos, que são os mais usados, e apenas um é diurético. Assim poderiam ser tomados à noite sem problema nenhum”, reforça o médico. 

Isso não significa, porém, que as pessoas devam trocar os horários da medicação sozinhos. “Se alguém quiser fazer a modificação, é importante conversar com o médico, que talvez tenha indicado o horário por outro motivo”, diz Morita.
O cardiologista Dalton Précoma reforça a recomendação, e lembra que a maioria dos pacientes hipertensos precisa de dois, três remédios para o controle da pressão. “A gente sempre escolhe um horário de manhã e outro no jantar, para cobrir as 24 horas do dia. Não significa que precise trocar, mas dividir a dose. O trabalho levanta uma questão importante que é: as pessoas precisam pensar na pressão arterial ao longo de todas as 24 horas”, diz.

Sem remédio

Há pacientes, mesmo com o diagnóstico de hipertensão, para os quais a medicação não é a primeira linha de tratamento indicada pelos cardiologistas. E engana-se quem acredita que apenas os remédios dão conta de controlar a pressão arterial. Veja o que indicam os cardiologistas Dalton Précoma e Miguel Morita:
  • Exercícios físicos regulares;
  • Ingesta limitada de sal;
  • Alimentação mais natural e balanceada;
  • Redução de peso corporal;
  • Controle de outras doenças crônicas, como diabete;
  • Sono adequado.

Falhas do estudo

Outro detalhe que deve ser levado em consideração antes de trocar o horário de tomar o anti-hipertensivo está nas possíveis falhas do estudo. Conforme explica Miguel Morita, cardiologista, os participantes da pesquisa sabiam, desde o início, qual tratamento receberiam: se o grupo que tomou o remédio pela manhã ou à noite.
“Quando a pessoa sabe para qual tratamento está sendo direcionada, e o que o estudo está investigando, ela pode mudar o comportamento. O habitual dela é tomar o remédio pela noite, e ela sabe que é isso que tem sido estudado, ela se motiva a se cuidar, fazer exercícios, mudar a dieta. Muita coisa pode melhorar, e não estar relacionada à mudança de horário”, explica.
Há ainda a hipótese de adesão. Para Morita, talvez seja mais fácil ao paciente não se esquecer de tomar o remédio à noite, do que em relação à manhã.
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