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A Lei Magnitsky disparou em Brasília uma desenfreada sina que confirma a sabedoria da voz do povo: “aqui se faz, aqui se paga”. E com a mesma moeda. Observe: contra a aplicação da lei, e a suspensão dos vistos, não há a quem recorrer, a não ser a quem as aplicou. Tal como sentem os que deveriam estar na primeira instância da Justiça, e foram incluídos em inquérito no Supremo, à revelia da cláusula pétrea constitucional que exige o juízo natural. E, quando a Magnitsky se mostra apta a se estender à família do sancionado, não há como não lembrar a advertência de Alexandre de Moraes ao tenente-coronel Mauro Cid: se não falasse, o inquérito atingiria seu pai, sua mulher, sua filha maior. Na Magnitsky não houve devido processo legal nem amplo direito de defesa; os departamentos de Tesouro e de Estado fizeram os inquéritos e saíram as sentenças. Aqui, cumprem um rito, com o mesmo resultado. Em ambos os países, o motivo é político. Um defende a liberdade de expressão; o outro diz ter salvado a democracia, embora tenha afogado a Constituição nas águas do arbítrio.
A Lei Magnitsky, sancionada por Obama, foi motivada pelo advogado russo Sergei Magnitsky, que foi preso, torturado e morreu na prisão. Serve para punir estrangeiros que fazem perseguições semelhantes. Aqui, o advogado Filipe Martins foi preso e posto em solitária para arrancar dele delação que justificasse acusar Bolsonaro de golpista. Resistiu. Sofrendo pressão que Gilmar Mendes, há dois anos, chamou de “tortura”, Mauro Cid assinou colaboração premiada. Daniel Silveira está sendo tratado igual a um refém do Hamas. E, como Sergei Magnitsky, Clezão morreu na prisão, a despeito de pedidos da PGR para ser tratado em casa. Magnitsky denunciou corrupção no regime de Vladimir Putin; aqui, são presos ou estão com tornozeleira os que criticam a apuração das eleições ou o “inquérito do fim do mundo”. Temos, pois, aqui, semelhanças a nos mostrar o porquê da aplicação da Magnitsky em autoridades brasileiras.
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Ministros do Supremo foram traídos pelos áulicos, com seus enganadores aplausos na mídia e nos auditórios; mais realistas foram os críticos. Houve até próximos, mostrando o caminho, como Marco Aurélio Mello, Luiz Fux, André Mendonça. Mas os outros não quiseram o caminho da mais inteligente das virtudes, a humildade, que, na hipótese mais branda, indicaria anular o inquérito que começou sem Ministério Público e já tem seis anos, e mandar os réus do 8 de janeiro para a primeira instância, onde ações criminosas podem ser individualizadas, e aplicar a devida punição aos que vandalizaram o patrimônio público. Efeitos colaterais: a Magnitsky em Moraes pode arrastar seus apoiadores no Supremo. E, nas ruas, o grito “Moraes” levou de reboque o nome “Lula”. Agora, Moraes avança mais um passo e decreta prisão domiciliar de Bolsonaro; vai provocar mais um, ou dois, ou três passos da Lei Magnistsky sobre seus apoiadores no Supremo.
A Lei Magnitsky não vai corrigir a crise de erros institucionais, porque isso cabe aos brasileiros; mas sacudiu de tal forma as responsabilidades e os brios que até o medo imposto pelas prisões políticas foi varrido pelo vento norte, e o povo saiu às ruas no domingo em quase todas as cidades brasileiras. Quis o destino – a sina – que o que Churchill chamou de Cortina de Ferro fosse rasgada por Ronald Reagan, republicano como Trump, que está rasgando uma cortina cor de toga, que baixou sobre a boca dos brasileiros do Oiapoque ao Chuí.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos




