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Coluna publicada na Gazeta do Povo impressa desta sexta-feira


Fachada do Aeroporto Internacional Afonso Pena

Não tenho a menor dúvida de que em exatos mil dias veremos a bola rolar em um estádio brasileiro (Itaquerão? Maracanã?) para a Copa de 2014. O que me preocupa são os 999 dias até lá e a herança a ser administrada sem paliativos a partir de 14 de julho de 2014.

Nunca me encantei com a realização do Mundial no Brasil. Como confiar em um evento entregue nas mãos de duas das mais problemáticas classes desse País: políticos e cartolas? Estes, aliás, não demoraram a decorar e reproduzir o canto da sereia da transformação do País a partir do futebol, com versos adocicados para seduzir os ingênuos e rimas cifradas para alertar os espertos.

A primeira promessa a desmoronar foi a dos estádios sem dinheiro público, declaração dada por Ricardo Teixeira logo após a indicação do Brasil como sede. Hoje chega a ser risível lembrar dessa bravata. São nove estádios inteiramente públicos e outros três particulares com um belo empurrão do Estado.

Há quem defenda a tese de que não há dinheiro público, mas sim isenção fiscal e financiamento do BNDES. Isenção não é garantia de que parte do tributo não recolhido deixe de ir para os bolsos de beneficiários de obras superfaturadas. A história política brasileira me permite não dar como favas contadas que o dinheiro emprestado voltará para o BNDES e outras agências estatais de fomento. Não me espantará ver, daqui alguns anos, uma anistia geral da dívida dos estádios da Copa, em nome da alegria do povo e do ganho de imagem para o Brasil, dois quesitos imensuráveis e, por isso, facilmente manipuláveis.

Saindo dos estádios, as obras seguem a lógica do Pan de 2007: cronogramas atrasados, orçamentos subindo e benefícios diminuindo. Em breve, algumas melhorias simplesmente serão esquecidas, ou deixadas para depois, ou resolvidas no improviso.
E muitos vão achar ótimo, algo que o sociólogo Alberto Carlos de Almeida, autor do ótimo A Cabeça do Brasileiro, definiu com maestria no começo do ano. A cultura do plano B e do improviso está fincada na cabeça do brasileiro e em momentos como esse mostra sua face mais perversa. Improvisar é aceito, desde que no fim o essencial dê certo. A diferença entre o planejado e o executado é tirada pela simpatia do povo, orgulhoso pelos puxadinhos erguidos a toque de caixa – e sem a devida licitação.

Uma opinião profética, pois hoje já não se fala mais em terminais modernos nos aeroportos, mas sim em puxadinhos funcionais. Podemos esperar o mesmo dos estádios, das obras viárias e de tudo mais que envolver o Mundial. Em mil dias a bola vai rolar para a Copa do puxadinho e todos vamos nos divertir pra valer por 32 dias. O problema de verdade será na hora de descer da laje.

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