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Mesmo quem não tem a política como interesse primeiro sabe, com mais ou menos informações, que estamos enfrentando um período de crise aguda – e não somente no Brasil. Talvez não saiba, entretanto, que tempos assim marcam épocas de transição. E que é próprio de momentos como este que os sintomas da degradação em curso emerjam de forma latente e que seus responsáveis ou colaboradores tentem eximir-se da culpa atribuindo-a a terceiros. Os culpados da vez são, atualmente, o “conservadorismo” e o “populismo”, termos políticos cujos significados foram deturpados para caber em qualquer qualificação depreciativa.

Se é verdade que as elites políticas no poder nas últimas décadas têm a sua parcela de responsabilidade pelos males hoje identificáveis, inclusive o “populismo”, é ainda mais verdadeiro o fato de que muitas universidades fabricaram uma cosmovisão que patrocinou ou legitimou a destruição das virtudes edificadas ao longo de séculos pelo Ocidente.

A ruína intelectual e prática da política também pode ser explicada a partir dos escombros da civilização observáveis nas principais instituições de ensino superior do mundo. É nesses centros acadêmicos de largo prestígio e influência que se criam e se desenvolvem os mais perigosos inimigos da cultura cujo legado vem sendo destruído e ocultado.

Quando o capital cultural virtuoso erigido ao longo dos séculos é intelectualmente vilipendiado, corrompido e, depois, retirado dos currículos das universidades, o que sobra para os novos alunos são o ódio à sua própria tradição, o repúdio pelo conhecimento, o desamor pela verdade.

Como ideologias infames propagam-se no vácuo mental, instituições de ensino vêm sendo trincheira de professores que formam sucessivas gerações de jovens revolucionários cujos propósitos de vida são dividir, destruir e conquistar espaços de poder. Exposições como as de Allan Bloom (The Closing of the American Mind: How Higher Education Has Failed Democracy and Impoverished the Souls of Today’s Students), Roger Kimball (Radicais nas Universidades) e Jean Sévillia (O Terrorismo Intelectual) mostram a gravidade do problema que também se apresenta no Brasil com traços comuns (e ainda espero por um livro que trate do nosso problema). Como consequência óbvia e visível está a tentativa de destruir parte do que o Ocidente tem de melhor.

Compartilho com você este assunto, leitor, após uma conversa com João Carlos Espada, doutor em Política pela Universidade de Oxford e professor português, a propósito do Estoril Political Forum 2017, que será realizado em Portugal dos dias 26 a 28 de junho. O título do evento é “Defendendo a Tradição Ocidental da Liberdade sob a Lei”. A partir dele a programação do fórum foi elaborada para que os palestrantes pudessem abordar desde as ameaças contra o Ocidente, passando pela situação e os desafios que se colocam diante da Europa e das outras regiões do globo, às ameaças à democracia e a situação das liberdades no mundo.

Será a 25.ª edição do evento anual organizado pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, dirigido por João Carlos Espada, e que reunirá parte da elite intelectual e acadêmica da Europa, da América do Norte e da América Latina. Eu participarei do painel sobre o Brasil junto com João Pereira Coutinho (doutor em Ciência Política e colunista da Folha de S. Paulo), o diplomata Paulo Roberto de Almeida e o professor Ernâni Carvalho.

Dos nomes mais conhecidos internacionalmente, lá estarão John O’Sullivan (ex-conselheiro de Margaret Thatcher e editor internacional da revista australiana Quadrant), Timothy Garton Ash (professor da Universidade de Oxford e senior fellow da Hoover Institution), Daniel Johnson (editor da revista Standpoint), José Manuel Durão Barroso (ex-presidente da Comissão Europeia), Anthony O’Hear (diretor do Royal Institute of Philosophy), Marc Plattner (coeditor do Journal of Democracy) e Larry Diamond (professor da Universidade Stanford). Diamond é autor de livros como O Espírito da Democracia e Para Entender a Democracia, ambos publicados no Brasil pelo Instituto Atuação, de Curitiba. Ele esteve na cidade em maio, a convite do Atuação, para o lançamento da segunda edição da “Coletânea da Democracia”, cujos livros são leitura obrigatória para estudiosos e curiosos (escreverei a respeito futuramente). O professor foi, inclusive, entrevistado pela Gazeta do Povo.

É claro que a democracia ocupará um lugar de destaque nos painéis do Estoril Political Forum 2017. Até porque ela é, hoje, instrumento da tradição ocidental da liberdade – tanto para o bem, quando a eleva, quanto para o mal, quando utilizada por seus inimigos.

Pela minha experiência de quase dez anos participando do evento, posso dizer que serão três dias de ricas e interessantes discussões sobre temas que também interessam ao Brasil. Porque aqui enfrentamos o grave problema da doutrinação ideológica nas escolas e nas universidades e vivemos um processo agudo de descoberta da política por uma base mais ampla da sociedade. Deparamo-nos, atualmente, com os aspectos positivos e negativos do nosso amadurecimento político em plena fase de ebulição cultural.

Sem virtudes, conhecimento, conversação qualificada e coragem de agir, seremos, portanto, infensos à civilização porque terra estéril, devastada. Antes de pretender civilizar o país, porém, exige-se que, individualmente, busquemos a civilização. Pois que muitas vezes a origem da terra devastada não está ao lado, mas dentro de nós.

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Leia o arquivo de colunas de Bruno Garschagen publicadas na Gazeta do Povo até maio de 2017.

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