• Carregando...
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil| Foto:

Logo após votar a favor do pagamento de um adicional de R$ 9,6 mil para juízes do Rio de Janeiro por audiências de custódia, a ministra Cármen Lúcia, presidente do STF e do CNJ, justificou a sua decisão dizendo que “muitos juízes se desdobram para dar uma resposta à sociedade” e “muitas vezes passam 12 horas trabalhando”.

A frase é um escárnio para quem sempre trabalha essa quantidade de horas (ou mais ou menos) e não conta com os altos salários e os privilégios dos magistrados brasileiros. Quem não é juiz nem é servidor do Estado, se trabalhar 12 horas (ou mais ou menos) e ficar doente, não terá dinheiro para pagar as contas do mês – é o meu caso, por exemplo. E não tardará para que os credores batam na porta ávidos pelo pagamento, como faziam com certa regularidade os vendedores de leite que iam à casa do doutor Samuel Johnson cobrar-lhe as dívidas.

Um juiz que se ausentar do trabalho por qualquer razão, inclusive por questões médicas, receberá seus vencimentos e privilégios impreterivelmente. Não há doença, não há crise econômica, não há hecatombe que impeça um magistrado de receber os seus salários e auxílios.

Não são todos os juízes que trabalham 12 horas. E se, eventualmente, trabalham até mais horas para realizar as suas tarefas, estão cumprindo uma obrigação que o cargo impõe. Quando fazem o concurso, os candidatos sabem que terão de trabalhar exaustivamente e o quanto receberão por isso. Realizar audiência faz parte das funções de um magistrado.

Por isso, não entendo por que nós, pagadores de impostos, temos de arcar com um adicional para que os magistrados conduzam audiências de custódia. Não está sendo pedido ao juiz que faça algo estranho ao cargo, como prender o suspeito do crime que foi trazido à sua presença. É, por isso, um escândalo que esse trabalho seja considerado “adicional”, o que justificaria o pagamento de mais esse benefício. Não apenas os juízes, mas também os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público do Rio de Janeiro recebem gratificação similar.

Dois conselheiros do CNJ, Márcio Schiefler e Valdetário Monteiro, eram contra o pagamento. Schiefler afirmou que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) não poderia, por ato administrativo (Resolução 29/2015), definir audiência de custódia como cumulação de funções porque não tinha “amparo nas normas de regência da magistratura nacional”. Não poderia, portanto, “indenizar” um magistrado pelo exercício de suas funções. Foi o argumento que ele utilizou quando já havia suspendido a eficácia da norma do TJRJ. Monteiro, concordando com o colega, defendeu a suspensão total da norma. Foram ambos votos vencidos.

O pagamento de mais um benefício para magistrados fluminenses – se adicionalmente considerarmos a situação financeira do Rio de Janeiro – expõe ainda mais a escandalosa quantidade de regalias que beneficiam os integrantes do Poder Judiciário no Brasil (e não só eles). Parafraseando aquela antiga marchinha de carnaval, o cordão dos privilegiados cada vez aumenta mais.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]