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Paulo Martins (PSC-PR) é um dos deputados da bancada que se identifica mais com os anseios populares que com a ideologia de "analistas" e "jornalistas-torcedores". Foto: Nilson Bastian/Câmara dos Deputados
Paulo Martins (PSC-PR) é um dos deputados da bancada que se identifica mais com os anseios populares que com a ideologia de "analistas" e "jornalistas-torcedores". Foto: Nilson Bastian/Câmara dos Deputados| Foto:

Bastou a eleição para o Congresso de candidatos da direita conservadora e não conservadora para que jornalistas, especialistas e esquerdistas fossem tomados de horror.

A sucessão de frases, opiniões, elucubrações lembraram-me da cena em que Macbeth, diante das bruxas, pergunta atônito e assustado: “quem sois vós?” Mas, no nosso caso, essa turma tem uma resposta pronta na ponta da língua: a extrema-direita.

Apesar de numericamente menor que as outras representações ideológicas e fisiológicas, e de os partidos de esquerda terem garantido importantes espaços na Câmara e no Senado, a ascensão ao poder de ideias à direita do espectro político provocaram pavor em vez de celebração pela diversidade e pluralismo que passarão a existir no Congresso. Para aqueles que tanto falam em democracia, não fica nada bem ser antidemocrático quando diante de eleitos pelo voto popular os representantes que não são os seus de estimação. O desafio de viver num ambiente democrático é precisamente aceitar como parte do jogo as ideias e os políticos que representam correntes contrárias àquelas em que se acredita, desde que, claro, suas agendas não contemplem a destruição moral, cultural, política, econômica do país.

O que temos visto, no entanto, diante da votação expressiva conquistada pelo candidato do PSL, Jair Bolsonaro, e da eleição de conservadores, liberais e bolsonaristas para a Câmara Federal, Senado e Assembleias Legislativas é o asco que se manifesta por meio de ataques diretos ou velados à “onda conservadora” e até mesmo pelo incômodo visível das escolhas feitas por milhões de eleitores que, finalmente, tiveram seus valores, preocupações e agenda político-econômica representados na política formal.

Por parte dos comentaristas, especialistas, jornalistas, a atitude expressa perante os resultados eleitorais também mostra uma combinação de desconhecimento teórico e social, e de clara militância ideológica, mesmo quando involuntária. Suas análises e opiniões têm exposto uma ignorância inaceitável de conceitos básicos de ciência e filosofia política e de economia, além de um descolamento da sociedade que deveriam conhecer para só depois analisar.

Opinião da Gazeta: A eleição e a importância dos temas morais

Carlos Ramalhete: Reequilíbrio ideológico

O dia 7 de outubro de 2018 serviu como um choque de realidade naqueles que acreditavam conhecer o Brasil e são pagos para refletir sobre os acontecimentos. Eles, viram, entretanto, que as suas certezas eram tão somente uma imagem equivocada que tinham do país por se tratar de uma projeção abstrata e hipotética sobre o povo brasileiro. Quando a realidade contrariou os seus esquemas mentais, não lhes restou outra alternativa a não ser lamentar o conservadorismo da sociedade e a eleição de um “Congresso mais conservador do que o atual”.

Se antes da eleição li e vi especialistas e comentaristas afirmarem categoricamente que PT e PSDB disputariam, mais uma vez, a eleição presidencial e dividiriam o poder no Congresso com o MDB, após o pleito passaram a dizer que Bolsonaro roubou votos do PSDB; que o eleitor médio, que antes era social-democrata, mudou de lado; que a eleição de Bolsonaro e dos candidatos da direita pode ser explicada pelo antipetismo, pela crise econômica, pelos megaescândalos de corrupção expostos pelo julgamento do mensalão e pela Lava Jato, pela rejeição da política.

Nenhum deles considerou o perfil de uma parcela numerosa da sociedade que já tinha certa identidade com a direita conservadora ou não conservadora, mas quase ninguém que a representasse nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Quando a sociedade acordou a partir de 2013 e viu que a política existe e que o Estado atrapalha a vida no dia a dia, que havia um grave problema ideológico nas instituições não estatais (Igreja, escolas, universidades, sindicatos, ONGs), que o seu destino estava nas mãos de pessoas que tentavam destruir aquilo que lhe era mais caro em termos de valores, princípios, virtudes, uma parte dos brasileiros decidiu tomar as rédeas da sua própria história. Foi exatamente isso que fez com que tantos da direita, conservadores e não conservadores, entrassem para a política e muitos deles fossem eleitos.

A partir do ano que vem, a política brasileira passará a ter um novo perfil, que será estabelecido a partir do embate político-ideológico entre os representantes da direita, da esquerda e dos grupos fisiológicos de sempre. A dinâmica política será bem diferente da que vimos até agora e todos os eleitos, e principalmente os da direita, serão cobrados como nunca pelas pessoas que se mobilizaram e votaram para acabar com a hegemonia da esquerda e das oligarquias na política. Se esses eleitos derem as costas para a agenda ética, política e econômica que os elegeu, deverão ser imediatamente cobrados e, se reincidirem, perderão rapidamente o apoio que receberam. Até porque há oportunistas que se elegeram usando o nome da direita e de Bolsonaro, mas que logo mostrarão as suas verdadeiras faces.

Embora numericamente os partidos de esquerda e os fisiológicos continuarão a ser maioria no Congresso, a votação expressiva que os candidatos de direita receberam e a renovação na Câmara e no Senado abrem, juntos, uma oportunidade única para que eles, mesmo em menor número, consigam articular uma bancada importante e ditar o rumo dos acontecimentos no âmbito do parlamento.

Quanto aos especialistas, comentaristas e jornalistas, terão de se adaptar aos novos tempos e buscar conhecimento para entender quais são as distintas posições políticas e como funciona um ambiente político constituído pelos políticos de esquerda e pelas oligarquias a que eles estavam acostumados, mas também por deputados e senadores conservadores, liberais, libertários, reacionários, militares, católicos, evangélicos, que agem de acordo com as suas convicções políticas, ideológicas, religiosas, corporativas. Caso não se atualizem e acordem para o que está acontecendo, continuarão a se perguntar, atônitos, “quem sois vós?” e a responder, equivocadamente, para si mesmos: “é a extrema-direita”.

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