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Datafolha: 30% acham que mulher de roupa provocante não pode reclamar de estupro
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Pesquisa do Datafolha publicada pela Folha de S.Paulo nesta quarta mostra que quase um terço dos brasileiros acredita que a própria estuprada é responsável pelo seu estupro. A resposta, quase inacreditavelmente, é a mesma entre homens e mulheres: 30%.

A pergunta feita pelo Datafolha era se a pessoa concordava com a seguinte frase: “A mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada”. Ou seja: ela é que provocou o estupro. Como se o homem simplesmente não tivesse condições de refrear seu instinto, ou não tivesse obrigação de fazer isso.

Os entrevistados também responderam a uma segunda pergunta sobre o tema. “Mulheres que se dão ao respeito não são estupradas”. Do total de entrevistados, 37% disseram sim. Desses, 42% eram homens e 32% eram mulheres.

A pesquisa retoma um debate antigo no país. Recentemente, o Ipea perguntou se mulheres em certas condições “mereciam ” ser estupradas. Houve um escândalo nacional porque o instituto errou o dado para cima – e admitiu o erro. Mas não houve o mesmo escândalo com o fato de que, mesmo após a correção, 26% continuavam dizendo que sim: havia mulheres que mereciam ser estupradas.

Os 30% que responderam agora que a mulher, em certas condições “não pode reclamar” se for estuprada, não são necessariamente más pessoas. Mas estão definitivamente presas a um tipo de pensamento cruel que o século 20 parecia ter rompido.

O liberalismo dos costumes no século 20 tentou garantir algumas coisas: a principal delas era que cada um pudesse viver a vida do modo como achasse melhor e que ninguém tivesse o direito de importuná-lo por isso – desde que, claro, a pessoa não estivesse atrapalhando o direito de terceiros.

Se o cara, como diz um grande filósofo, resolver passar a vida contando folhas de grama, problema dele. Claro, você pode achar tolo, mas ele tem direito. Mas isso vale principalmente para questões centrais da vida: que profissão seguir; o que pensar sobre as religiões; como se vestir e se comportar.

As mulheres sempre estiveram mais expostas a ordens externas de como agir – durante muito tempo, não foram nem consideradas cidadãs. No século 20, além do direito ao voto, do direito a trabalhar no que bem entendessem e a serem consideradas iguais aos homens em atividades intelectuais.

Mas, principalmente, lutaram para fazer o que bem entendessem com seus corpos. Em uma frente, isso significava o direito a agir sexualmente de maneira independente – o quer a pílula facilitou. De outro, significava não ter de seguir padrões rígidos do que era ser uma “boa moça” – poder usar minissaia, sair sozinha e beber, se quisesse.

Mas o pensamento médio brasileiro continua sendo pré-liberal. Autoritário. Não aceita que cada um faça o que quer e pretende dominar o comportamento alheio, principalmente o feminino. Isso se dá principalmente pelo repúdio, silencioso ou não, a quem “ousa” agir como quer. Mas às vezes pode ser mais agressivo.

O estupro é culpa do homem. Sempre. De quem comete crime. Assim como quem anda na rua não pode ser culpado por ser assaltado. Quem pensa diferente disso precisa seriamente rever o que acha sobre si e o mundo. E é triste ver que pelo menos 30% dos brasileiros (sem contar os que pensam assim e preferiram não dizer) ainda estejam nessa situação.

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