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Da coluna Caixa Zero, publicada nesta quarta-feira, na Gazeta do Povo:

O deputado estadual Plauto Miró, do DEM de Ponta Grossa, cristalizou nesta semana em uma frase lapidar o pensamento de boa parte dos eleitores antipetistas. Anotada pela imprensa, a frase ficou assim. “Quem pensa votou no Aécio. Quem tem dificuldade no pensamento votou na Dilma.” O registro do jornal Folha de Londrina diz que o deputado foi alertado pelos jornalistas sobre “a gravidade de sua declaração”. Avisado, manteve o que disse.

Segundo Plauto, os dados estão aí para quem quiser ver. O eleitor de Dilma é menos escolarizado, “menos favorecido”. E, assim, tem “dificuldade no pensamento”. Há duas lógicas possíveis para o raciocínio de Plauto. Ou ele pensa de antemão que essas pessoas em geral têm dificuldade no pensamento. Ou foi o voto em Dilma, que não era a candidata dele, que o fez pensar assim. Pouco importa. O que importa é que pobreza, dificuldade de pensamento e voto no adversário estão aqui intimamente ligados.

Não foi a primeira vez que o deputado entra em discussão do gênero. No início da campanha, a Associação Comercial de Ponta Grossa lançou uma cartilha defendendo que os beneficiários do Bolsa Família tivessem temporariamente suspenso seu direito ao voto. Questionado sobre a ideia, Plauto ficou em cima do muro. Nem contra, nem a favor. “Acredito que as pessoas recebem esse dinheiro gratuitamente e é preciso discutir modos de impedir que isso seja usado politicamente”, disse ao blog desta coluna.

O pensamento de que o voto do povão é impensado e irracional impera nas redes sociais. Nos últimos três dias, houve um festival da esculhambação do povo brasileiro na internet. Pobres (em geral), nordestinos (especificamente) e beneficiários do Bolsa Família (com ênfase ainda maior) viraram saco de pancadas de quem não aceita a eleição de Dilma. Os mais histéricos falaram em separação do país.

Assim, o deputado Plauto, embora considere os eleitores de Dilma como fracos de pensamento, é no final das contas um moderado comparado a outros antipetistas. Para outros mais radicais, além de serem ruins de raciocínio, os pobres são um estorvo. Cortar fora as regiões “menos favorecidas” ou simplesmente se livrar deles de alguma maneira (nem que seja só como eleitores, como propôs o empresariado pontagrossense) são maneiras de se livrar desse peso morto. E o que devia ser uma mera divisão política se torna o desejo de um apartheid.

Quem estuda política a fundo explica que o voto do eleitor mais pobre (assim como o do mais rico) é bastante racional. O sujeito compara não só as propostas e os candidatos mas também a sua própria vida antes e depois dos atuais governos. Pode até não saber o que é fruto da sorte, ou do governo estadual, ou do governo federal. Mas vê se a coisa está melhor ou pior do que antes para o seu lado e toma uma decisão razoavelmente calculada.

Mesmo que não fosse assim. Eleição não é prova de matemática, em que existe um gabarito. O que está em disputa são projetos políticos diferentes, e a eleição é justamente o momento em que o eleitor decide qual desses projetos prefere. Trata-se de uma disputa não só entre políticos, mas entre ideias diferentes de como o país deve ser gerido. Quem tem seus interesses contrariados, numa democracia, tem de saber engolir em seco e esperar mais quatro anos para provar que seu projeto é melhor. Dizer que o eleitor do outro lado não sabe pensar (ou odiá-lo, como se vê nas redes sociais) é um passo perigoso para a convivência social.

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