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Genoino e Dirceu que me perdoem, mas não são presos políticos
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Genoino

Virou moda. Todo político que vai preso diz que é “preso político”. Como lembrou Marcelo Soares, um dos jornalistas lúcidos da terra em que pisamos, são coisas bem diferentes: presos políticos José Genoino e José Dirceu foram na época da ditadura. Hoje, são presos comuns mesmo. No entanto, insistem no discurso, claro. Espernear é direito de todos.

Preso político é o sujeito que vai preso em razão de suas convicções. É o preso de consciência. Num regime democrático, isso é impossível: todos podem ter as convicções que quiserem desde que respeitem as demais leis. Não existe, no Estado de Direito, o crime político. Não é crime ser de esquerda nem de direita, muito menos ser apolítico. Cada um pensa como quer, vota como quer, faz o que quer politicamente.

Preso político não há hoje no Brasil. Por um simples fato. Estamos numa democracia. Genoino e Dirceu, ao usarem para si o rótulo de presos políticos querem, é óbvio, dizer que são vítimas de um sistema injusto. O efeito colateral é fazer crer que não vivemos numa democracia. Como disse outra jornalista lúcida, com a qual sou casado, não existe a possibilidade de um preso político do mesmo partido da presidente. A não ser, claro, na mente deformada de um ideólogo.

Genoino e Dirceu, quando dizem ser presos políticos, estão insinuando, ao que me parece, que o Brasil realmente tem problemas em sua democracia. A ponto de talvez não estarmos em uma democracia. Querem dizer, provavelmente, que o Supremo Tribunal Federal age em nome de alguma ditadura que, para ser coerente com o restante do discurso, pareceria com algo como uma ditadura econômica. Uma ditadura dos interesses das elites sociais e econômicas.

A elite brasileira, por meio do Judiciário (sempre elitizado) e da mídia (que aqui é sinônimo, para eles, de ferramenta da oposição), teria forçado uma situação antidemocrática e mandado prender dois cidadãos meramente por eles serem de um partido que contraria certos interesses econômicos. Eis a tese. A ditadura é o que eles enfrentam. É o que a própria presidente da República enfrenta. O PT se arvora, nesse discurso, como um Quixote que enfrenta os grilhões de um esquema destinado a manter a direita no poder, pelos séculos dos séculos.

É claro que toda interpretação do mundo tem lá a sua base. E não facilita muito a vida de ninguém o fato de o Judiciário ter agido de modo peculiar no julgamento do mensalão: teses novas no país, como a teoria do domínio do fato e o fatiamento das sentenças, pareceram cair sob medida para as condenações. O fato de a imprensa ter coberto o escândalo, porém, convenhamos, era previsível e saudável: mas, como estamos numa democracia, ao contrário do que dizem por aí, as críticas à imprensa também são bem-vindas, claro.

No entanto, nada disso nem de longe parece embasar a alegação de que há presos políticos por aqui, Dirceu e Genoino não foram à Papuda porque fundaram um partido. Nem porque creem em certa ideologia. Nem por nenhuma razão política. Foram porque, tudo indica, participaram de um esquema de corrupção. E que o esquema ocorreu, a essa altura, ninguém pode duvidar: Lula admitiu em 2005, para começar o debate. Foi traído, lembram?

É claro que o sistema jurídico falhou gravemente em punir uns e deixar outros soltos. Há corruptos de calibre igual ou maior soltinhos da silva, e até com mandato. Nesse sentido, a gritaria do PT pode ser boa. Que se prendam os outros também, do malufismo aos que colaboraram com cartéis país afora, sejam de que partido for. Mas falar em ditadura e prisão política num caso claro de corrupção é atingir, inclusive, a memória dos que foram realmente presos e torturados em nome da democracia,

A “ditadura” que Genoino e Direceu insinuam permitiu ao PT existir, crescer e chegar à Presidência da República. Permitiu que Lula tivesse dois mandatos e elegesse a sucessora. Permitiu que o PT indicasse oito dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal que julgou os mensaleiros. Que o partido indicasse os três procuradores-gerais que atuaram durante o processo. Que ditadura é essa que permite que sua “oposição” governe o país por mais de uma década?

E outra: desde quando o governo petista colocou em xeque os privilégios de nossa classe abastada, a suposta autora do golpe antimensalão? Lula mesmo sempre falou que em seu período os banqueiros lucraram como nunca. E não só eles: todo o empresariado. Quem foi abalado pelo lulismo, pelo PT, para querer se vingar assim? Os mesmos partidos continuam no poder. Os mesmos empresários continuam se beneficiando dele. Que ditadura é essa?

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