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Carta aberta a você que acha que os grevistas são vagabundos
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Caro concidadão, cara concidadã

Hoje é um dia de transtornos para muita gente em nosso país. Sim: falta transporte. Sim: faltam professores. Sim, a greve afeta muita coisa. E você tem todo o direito de se sentir incomodado com isso. Vamos falar claramente: você tem o direito de ficar puto.

Você pode não concordar com os motivos da greve. Pode achar que a Previdência precisa de reformas (eu também acho) e que a lei trabalhista do jeito que está é um absurdo (e em parte eu até concordo). Você tem todo o direito de achar que as pessoas estão sendo manipuladas pelo PT, pela CUT, pelos sindicatos. E tem direito de se revoltar com isso.

Mas gostaria de pedir uma gentileza. Não chame os grevistas de vagabundos. Não é porque a gente não concorda com os outros que tem que escrachar. Assim como ninguém deveria chamar as pessoas de direita de fascistas só por serem conservadoras, ninguém merece ser chamado de “malandro” só por exercer o direito à greve.

Nosso país viveu uma cisão grave nos últimos tempos. Mas as pessoas continuam tendo todo o direito de protestarem. Assim como muita gente foi às ruas contra Dilma, elas têm o direito de ir às ruas contra Temer. Quando há excessos, devem ser criticados: e nada justifica o uso da força por parte de sindicalistas ou de quem quer que seja.

Mas a imensa maioria dos trabalhadores em greve hoje dá duro dia e noite. Se elas não trabalhassem, você não estaria sentindo falta do serviço delas nesta sexta. Se o motorista de ônibus fosse mesmo um encostado, você nunca teria ônibus rodando. Se os professores que pararam fossem vagabundos, teus filhos não teriam o cuidado que recebem diariamente.

A imensa maioria dos trabalhadores do país vive unicamente de dois patrimônios: a ficha limpa e o trabalho que tem para vender. Não têm patrimônio e, em grande parte das vezes, têm baixa qualificação. Um motorista de ônibus, que hoje resolveu parar para lutar por seus direitos, parou porque sabe que as reformas mudam bruscamente as expectativas que ele tem para seu futuro, para sua velhice.

É verdade que a aposentadoria por idade mínima afeta mais a classe média. Mas o próprio motorista e o cobrador são exemplos de gente que tem carteira assinada e se aposenta (pelo menos em tese) por tempo de contribuição. Gente que trabalha duro, fazendo dois pegas, que começou cedo para ajudar o pai e a mãe e que por isso mesmo não teve como estudar tanto quanto você. Mas que nem por isso é vagabundo.

Os motoristas também seguem a CLT – são formalizados. E você sabe que muita mãe, com almoço de trinta minutos, não vai conseguir amamentar no intervalo nem tirar o leite no banheiro, fazendo auto-ordenha para o bebê poder se alimentar com leite materno? E nem por isso as motoristas e professoras que estão fazendo paralisação são “malandras”.

Sei que esse dia te incomoda. E que as causas podem não te parecer justas. Mas, por favor, vamos lembrar que viver em sociedade é depender dos outros e que exige que a gente tenha o mínimo de respeito por quem está ao nosso lado. Assim como ver um sindicalista quebrando algo ou forçando alguém a fazer o que não quer é repulsivo, ver alguém chamando o vizinho de vagabundo porque ele discorda politicamente de você é um absurdo.

Ou a gente aprende isso ou nossa sociedade vai caminhar cada vez mais para o abismo. Um ao lado do outro, o penhasco se aproximando, e a gente só se importando em jogar pedras no cara que está prestes a cair no mesmo buraco que a gente.

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