• Carregando...

Comadre Sandra,

Seria exagero dizer que há uma dose extra de ódio e rancor temperando o humor dos paranaenses? Muita gente tem percebido um excesso de animosidade, irritação e nervosismo que vão minando o dia-a-dia e os relacionamentos.

E não se trata só do trânsito, da violência urbana, das contas para pagar, do empréstimo consignado que nunca termina, do filho adolescente que fumou maconha, das férias com chuva e do esgoto na praia, do preço da gasolina que sobe sem explicação… Ou mesmo do aquecimento global, do efeito estufa e do buraco na camada de ozônio, a nos trazerem culpas e insônias adicionais…

Se nosso ambiente fosse virtual, como em Gotham City, a explicação para tanto stress estaria numa mirabolante máquina de espargir gás na atmosfera, capaz de despertar os maus bofes do monge mais paciente.

Até que nosso Batman descobrisse a localização da engenhoca e acabasse com ela, a população estaria à mercê de estímulos irresistíveis, pensados para fazer com que amigos briguem, parceiros se odeiem, colegas se boicotem, autoridades esbravejem, acusem, reclamem, xinguem…

Uma máquina infernal capaz de institucionalizar a descortesia, o desrespeito, a agressão, a violência verbal, e até física.
Um gás tão poderoso que não há quem possa contra ele. Nem mesmo homens públicos eleitos com a missão de construir, de agregar, de elevar. Todos contaminados pelo efeito “ódio aos inimigos”, sendo inimigos todos os que pensem diferente ou apenas queiram entender o pensamento do outro.

Pena que o mundo real não comporte uma explicação tão simples.

A conta pode não ser exata, mas não peca pelo exagero. Em 15 minutos de escolinha, numa recente terça-feira, alta autoridade disse umas quatro vezes a palavra “canalha” e proferiu uns dois “cambada”.

Acusou dois ou três de “ladrão” e mais um tanto de “mentiroso”. Na mão esquerda, o microfone da TV Educativa – que, talvez, devesse mudar de nome. Na mão direita, o gesto típico de riscar o ar, marcando com força a cadência do discurso duro. Na platéia de assessores, muitos aplausos e alguns olhares constrangidos, como a indagar: se autoridades do estado podem exercitar a incontinência verbal, inclusive em rede nacional de televisão, o que esperar das pessoas comuns, sem cargos e sem responsabilidade pública, protegidas pelo anonimato e endurecidas na rotina das dificuldades?

Marisa

***

Comadre Marisa:

Que a impaciência anda generalizada, não há dúvida. Na mídia, cortesia e atenção são, cada vez mais, características atribuídas às pessoas tolas. Ao ler suas reflexões lembrei de um comercial que está no ar e que me deixou perplexa: sentada diante da tevê na sala, ao lado da filha pequena, a mulher dá respostas irônicas às perguntas do marido e do filho, perguntando se tem o nome de um eletrodoméstico “escrito em sua testa”. Para não deixar dúvidas de que o exemplo convence logo, a anti-mensagem termina com a filha imitando o comportamento irônico da mãe.

Como não vi qualquer manifestação do Conar ou de qualquer outra organização, concluo que as “lições” exibidas na tela são aceitáveis para a maioria dos brasileiros. Por isso, cara Marisa, não fico espantada ao notar que as pessoas ajam sem qualquer cordialidade no trânsito, no trabalho ou nas relações familiares.

Se já é inaceitável que os anônimos ajam assim, o que dizer de autoridades que falam aos seus representados?

Sandra

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]