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Detalhe de “A Adoração dos Pastores”, de Giorgione.
Detalhe de “A Adoração dos Pastores”, de Giorgione.| Foto: Wikimedia Commons/Domínio público

Celebramos o Natal. O nascimento de Cristo sempre fascina, comove e exerce notável poder transformador.

Hoje, amigo leitor, tratarei de um tema fora da caixa: a força revolucionária da santidade. Um assunto talvez surpreendente nas páginas de um jornal. Mas é um fato: Deus está em alta. Isso mesmo. A nostalgia de valores transcendentes é patente no Brasil e em muitos lugares de um mundo cansado e sedento de certezas. Acabo de regressar de Madri. A belíssima capital da Espanha está vestida de luzes e repleta de presépios anunciando o nascimento do Menino Deus.

A religião, sintoma de alienação na geração passada, ganha espaço nos dias que correm, sobretudo no mundo dos jovens. Impressiona-me, e muito, a retomada cristã. Busca-se um sentido mais profundo para a vida. Quando parece que o materialismo prático está ganhando de goleada, o jogo vira. Sempre foi assim na bimilenária experiência do cristianismo.

Deus está em alta. A nostalgia de valores transcendentes é patente no Brasil e em muitos lugares de um mundo cansado e sedento de certezas

O Natal inaugura o mapa da santidade. De fato, o nascimento, a vida, a morte e ressureição de Cristo compõem o plano de voo para a fascinante viagem rumo ao Criador. Nada melhor do que buscar a experiência dos santos para iluminar essa travessia. Eu tive a felicidade de conhecer pessoalmente um deles: São Josemaría Escrivá.

Há quase 50 anos, em maio e junho de 1974, São Josemaría visitou o Brasil e se apaixonou pelo que viu: a diversidade de raças, a miscigenação, o convívio aberto e fraterno, a alegria, a musicalidade da nossa gente. Apalpam-se no Brasil, dizia ele, comovido, todas as combinações que o amor humano é capaz de realizar. Liberdade, tolerância e cordialidade, traços característicos de nosso modo de ser, atraíram profundamente o fundador do Opus Dei. São ativos importantes que, infelizmente, foram sendo fustigados pelo clima de polarização e cancelamento que tomou conta do mundo e do Brasil. O Natal é um momento propício para tentar um resgate de valores que sempre fizeram do Brasil um país alegre, positivo e acolhedor.

A figura amável de São Josemaría e a força de sua mensagem tiveram grande influência em minha vida pessoal e profissional. Aproveitando este Natal, quero compartilhar com você algumas ideias recorrentes na vida e nos ensinamentos de São Josemaría: seu amor à verdade e sua paixão pela liberdade. Trata-se de convicções que constituem uma pauta de atualidade permanente.

“Peço a vocês que difundam o amor ao bom jornalismo, que é aquele que não se contenta com rumores infundados, com boatos inventados por imaginações febris. Informem com fatos, com resultados, sem julgar as intenções, mantendo a legítima diversidade de opiniões, num plano equânime, sem descer ao ataque pessoal. É difícil que haja verdadeira convivência onde falta verdadeira informação; e a informação verdadeira é aquela que não tem medo da verdade e que não se deixa levar por desejos de subir, de falso prestígio ou de vantagens econômicas.” A citação, extraída de uma das entrevistas do fundador do Opus Dei à imprensa, é um estímulo ao jornalismo de qualidade.

Apoiado na força de sólidas convicções, o pensamento de São Josemaría suscita ao mesmo tempo uma visão aberta, serena, pluralista. Sempre me impressionou o tom positivo da sua pregação. Sua defesa da fé não é, de fato, antinada, mas a favor de uma concepção cristã da vida que não pretende dominar à força da imposição, mas, ao contrário, quer se apresentar como uma alternativa cuja validade depende da resposta livre de cada um.

Sua doutrina se contrapõe a uma doença cultural do nosso tempo: o empenho em confrontar verdade e liberdade. Frequentemente as convicções, mesmo quando livremente assumidas, recebem o estigma de fundamentalismo. É o covarde recurso de rotular negativamente quem pensa de modo diverso. Impõe-se, em nome da liberdade, o que se poderia chamar de dogma do relativismo. Essa relativização da verdade não se manifesta apenas no campo das ideias. De fato, tem inúmeras consequências na prática jornalística. Nosso trabalho não é transmitir versões ou assumir narrativas.

Frequentemente as convicções, mesmo quando livremente assumidas, recebem o estigma de fundamentalismo. É o covarde recurso de rotular negativamente quem pensa de modo diverso

“Informar”, diz ele, “não é ficar a meio caminho entre a verdade e a mentira”. O bom jornalista é aquele que aprofunda, vai atrás da verdade que, como dizia Claudio Abramo, frequentemente está camuflada atrás da verdade aparente. É, sobretudo, aquele que não se esconde por trás de uma neutralidade falsa e cômoda.

Ao mesmo tempo que defende os direitos da verdade, São Josemaría Escrivá não deixa de enfatizar o valor insubstituível da liberdade humana – particularmente da liberdade de expressão e de pensamento – contra todas as formas de sectarismo e de intolerância. Para ele, o pluralismo nas questões humanas não é apenas algo que deve ser tolerado, mas, sim, amado e procurado.

Simpático e carismático, São Josemaría vislumbrava no cotidiano, nas coisas simples e comuns, o ponto de encontro entre Deus e os homens: “Ou sabemos encontrar o Senhor na nossa vida de todos os dias, ou não o encontraremos nunca”.  O cristianismo encarnado nas realidades cotidianas: eis o miolo da proposta revolucionária de São Josemaría Escrivá.

A todos um feliz Natal!

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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