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A impunidade dos criminosos no Brasil vitimou um criminoso. Coisa mais ou menos rara, mas que continua dando as caras aqui e ali. Desta vez, um vacilão foi pego em flagrante delito tentando roubar a bicicleta de um deficiente físico. Um dos vizinhos era tatuador e escreveu na testa do meliante “sou ladrão e vacilão”. A mais pura verdade, aliás, mas convenhamos que está havendo uma perda do sentido de proporções assustadora; o crime demanda punição proporcional, ainda que segundo a lei de talião.

O furto de uma bicicleta velha, provavelmente para trocar por drogas, não justifica escrever indelevelmente a descrição do criminoso na sua própria cara. Tatuagens já foram usadas para punir criminosos. Quem quer que tenha lido Os Três Mosqueteiros irá lembrar-se da cena dramática em que Athos descobre que Milady era uma criminosa tatuada pela Coroa.

Pois aí é que a coisa começou a esquentar no Brasil: foram feitas duas vaquinhas virtuais, uma para a retirada da horrenda tatuagem e outra para bancar advogados para o tatuador e seu amigo. É bom que haja reações públicas, e é ótimo que elas sejam monetizadas. É fácil “curtir” algo nas redes sociais; gastar dinheiro de verdade, contudo, já é bem mais difícil.

Mas por que é que eu digo que foi a certeza de impunidade dos criminosos que vitimou o já famoso “ladrão vacilão”? Porque o tatuador e seu amigo sabiam perfeitamente que a chance de o sujeito ir em cana, mesmo roubando bicicleta de aleijadinho, era ínfima. Se houvessem chamado a polícia, o vacilão teria sido levado à delegacia, assinado um papel garantindo que volta se for chamado, e imediatamente solto. Mas era demais saber disso. A fúria do tatuador precisava de uma ação mais próxima e dramática; daí a tatuagem na testa do ladrão.

É este o maior perigo nesses nossos tempos, em que criminosos se livram soltos de tudo: a população acaba se decidindo a tomar a lei nas próprias mãos, o que só poderia levar a exageros como este. E se não houvesse uma máquina de tatuagem à mão, o que teria acontecido? Uma surra, um linchamento, em suma, algum destempero. Não há como escapar disso.

Parece que a autoridade policial tipificou a tatuagem como tortura; não creio que esteja totalmente errada. Afinal, “na cara não, que é pra não atrapalhar o velório”, disse outro criminoso de fantasia. A possibilidade de levar o resto da vida com descrição de si mesmo tão pouco airosa tatuada em plena testa há de ter sido horrível. Só é triste porque se trata de crime inafiançável; outro exemplo claro de punição desproporcional.

Mas o ladrão conseguiu quem o ajude, e terá removida a tatuagem. Isso é muito bom, mais ainda porque a tortura de se olhar no espelho e saber-se vacilão terá deixado marcas. Talvez, tendo sobrevivido a tal experiência, o rapaz queira deixar de lado as drogas e os furtos. Deixar a vida louca. Deixar de ser vacilão.

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