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Foto: Renan Olaz/CMRJ
Foto: Renan Olaz/CMRJ| Foto:

Nossa sociedade em crise mostrou o pior de si ao ser submetida à brutalidade de um teste de Rorschach desenhado com sangue de uma moça no asfalto sujo da cidade. O horrendo assassinato da vereadora Marielle e de seu motorista serviu de trampolim para que tanto a esquerda a serviço da Fundação Ford quanto a nova direita americanófila mostrassem o pior de si. É desnecessário apontar as inúmeras camadas de horror que compuseram o crime: uma moça na flor da idade, cuja vitalidade expressa no belo sorriso que certamente lhe abriu muitas portas faz o crime mostrar-se ainda mais cruel; uma parlamentar, que em seu trabalho fazia-se representante de uma multidão, que talvez o assassino quisesse também calar a bala; uma moça de família pobre que subiu na vida e parecia destinada a grandes coisas; uma ativista na pútrida política de um estado falido cujos corruptos governantes estão todos presos ou a caminho da cadeia; em um país que sofre mais de 60 mil homicídios por ano, uma vítima a mais, mas que de uma certa maneira acaba tornando-se representante de todas as outras. É um crime que deve ser investigado e, queira Deus, inserir-se na ínfima parcela dos homicídios que levam a uma condenação penal. E que seja dura a pena, proporcional ao horror do crime.

Mas imediatamente o cadáver ainda fresco foi levantado como bandeira de todas as causas divisivas com que seu partido, o lamentável PSol, tenta envenenar os brasileiros. Seu assassinato, bradou o primeiro discurso da extrema-esquerda, teria ocorrido por ela ter esta ou aquela cor de pele, preferência sexual, tamanho de orelha ou dedão, gosto para roupas de baixo ou sei lá que irrelevâncias mais eles conseguem inventar para jogar brasileiro contra brasileiro num momento de crise em que deveríamos estar todos juntos. Para bater bem a clara em neve e abusar o máximo possível da tragédia para vender o peixe podre do racismo e sexismo importados da esquerda americana, organizaram passeatas e mais passeatas, sempre tratando um crime em investigação como se houvesse certamente sido causado pelo mesmo racismo que vendem com apoio da Fundação Ford, de Soros e de todo o resto do megacapitalismo multinacional que dita cada palavra do discurso do PSol.

A resposta da direita americanófila, envenenada pelo dualismo calvinista da cultura daquele território de missão que confundem com civilização, conseguiu ser pior ainda. Condenaram a moça ao inferno, arrumaram-lhe filhos com traficantes, pintaram-na, em suma, como alguém tão monstruoso que os assassinos mereceriam medalhas em vez de cadeia. Numa medonha perversão do ditado segundo o qual dos mortos só se fala bem, a outra ala da triste importação do que passa por política ao norte do México dedicou-se a derramar o pior veneno acerca não só da pobre vítima, mas de todos os que com ela tivessem qualquer ligação.

A resposta da extrema-esquerda, claro, aumentou ainda mais o nível de boçalidade reinante: resolveram judicializar a questão, e pediram aos seus adeptos que juntassem dados de todos os que tivessem participado do campeonato de calúnia e difamação encetado pela direita para que advogados os obriguem a gastar dinheiro que provavelmente não têm com absurdos processos. Isto num país em que o Judiciário está tão abarrotado que se pode esperar que qualquer coisa dure anos. Mas o instinto de censura, de mandar calar a boca à força, é forte demais na extrema-esquerda. Percebe-se claramente, nas entrelinhas dos pedidos de informação, a sombra dos serviços secretos cubanos, que se estima empreguem um em cada 17 prisioneiros da família Castro, ou da falecida Stasi alemã-oriental, que mantinha dossiês sobre todo e qualquer cidadão. Ou mesmo, quem sabe, do atual sistema de “pontuação” do governo chinês, que pode eliminar instantaneamente a capacidade de usar transportes públicos ou comprar combustível para o próprio carro de quem quer que incorra no desagrado das autoridades comunistas.

A política brasileira só tem a perder com essas atitudes. Criar cópias tupiniquins dos partidos Republicano e Democrata americanos é um desserviço a nosso país, que tem uma cultura política infinitamente mais rica e cheia de nuances. Adotar o raso e venenoso dualismo gringo, em que o adversário é tido como forçosamente burro ou mal-intencionado (merecendo, portanto, os ataques desfechados pela direita contra a “mal-intencionada” falecida ou os processos prometidos pela extrema-esquerda contra os “mal-intencionados” caluniadores), é um insulto à própria política. É a morte da política. Não pode haver política se não há abertura a pelo menos tentar compreender o outro.

O comunismo, hoje paradoxalmente empregado pelo megacapitalismo nos países democráticos como arma contra a família e demais instituições que dificultam sua hegemonia, é uma ameaça real. Mas o que o torna uma ameaça real é o fato de ele parecer tentador para muitos. Não duvido por um segundo que a falecida vereadora, por exemplo, tenha realmente conseguido se convencer por alguma tortuosa falácia de que desarmar a Guarda Civil carioca seria uma boa coisa. Como muitas outras pessoas, ela certamente chegou a calar a voz da consciência que grita diante do horror do aborto, convencendo-se de boa fé de que poder assassinar um bebê inocente na barriga da mãe seria de algum modo um benefício para a sociedade. É um absurdo, mas a crença em absurdos não exige que ninguém seja burro ou mal-intencionado. Muito pelo contrário, aliás: os piores absurdos demandam uma inteligência acima da média para serem aceitos.

Se não tentamos nem sequer entender como alguém consegue se convencer dessas coisas, não há como debater, não há como dialogar. E sem estas artes, que podem ser perdidas em uma geração,  não há como – ainda mais crucialmente – resolver as questões políticas em vez de “vencer” ou “perder”. Lembremo-nos de que, no mais das vezes, “ganhar” ou “perder” significam apenas jogar a questão mais para a frente, com uma dose ainda maior de rancor da parte de quem quer que tenha “perdido”. Já resolver é outra coisa. É ceder, sim, no que pode ser cedido, mas mantendo o essencial e satisfazendo os bem-intencionados e inteligentes debatedores em ambos os lados da questão.

A política não pode ser a respeito de ganhar ou perder. A política só pode ser a arte do diálogo, do debate. A arte do possível, de dar os anéis e manter os dedos. De convencer, de conversar, de parlamentar. Ainda que seja verdade que a guerra seja uma continuação da política por outros meios, há uma hora para a guerra e uma hora para a paz. A guerra só pode se iniciar quando foi impossível evitá-la pacificamente. Fazer do debate guerra é negar o debate. É trocar a política pela boçalidade gringa. Importar a antipolítica americana, com seu dualismo primitivo e cruel, com seus xingamentos, calúnias e difamações, com seus desrespeitos liminares do adversário (que raramente é burro, e praticamente nunca é mal-intencionado), é ajudar o serviço dos que financiam fartamente a cultura da morte que o partido da falecida propõe e continua propondo. A resposta às mentiras de Soros não são as mentiras republicanas, não é a agressividade boçal que possibilitou a eleição de um Trump. Para defendermos a nossa sociedade, a nossa civilização, temos de dar valor é a ela, não ao outro lado do mesmo processo revolucionário que gerou a extrema-esquerda, atual baioneta na ponta do fuzil do megacapitalismo. A nossa cultura, a nossa sociedade, é uma cultura do diálogo, dos tons de cinza, do acolhimento, do colocar-se no lugar do outro. Do perdão. Da vida.

Faz um tremendo desserviço à sociedade e à civilização ocidentais quem quer que vitupere o cadáver ainda fresco de uma jovem parlamentar assassinada. Fazê-lo é negar a dignidade feminina, é negar o valor do diálogo, é negar o valor da vida. É, em suma, colocar-se como parceiro de destruição, como o outro lado da pinça do megacapitalismo.

Da extrema-esquerda, sempre fiel à coleira de dólares e euros que controla cada movimento seu, é de se esperar que venham barbaridades como as que apontei acima. Para eles, cadáveres só servem se puderem ser usados como bandeiras; os mortos valem se desmunhecarem ou tiverem a pele escura – desde que, claro, não sejam policiais! Para eles a voz do outro deve sempre ser calada, preferencialmente à força. É de se esperar.

Mas o nosso papel de brasileiros, de defensores da nossa sociedade, é levantar-se contra isso, contra essas horrendas importações culturais de povos primitivos. Não é importar o outro lado da mesma pajelança insana e ajudar a desrespeitar os mortos, ajudar a negar o diálogo, ajudar a pintar o mundo em preto e branco absolutos, inserindo-se numa dança macabra em que o passo consiste em apunhalar as costas do parceiro e pisar em seus pés.

Que Deus Nosso Senhor tenha em suas mãos a alma da pobre moça e de seu serviçal. Que Ele mesmo nos guie e nos proteja, para que saibamos valorizar a cultura que a Fé cristã desenvolveu ao longo de tantos séculos e de que somos os herdeiros mais fortes. Somos a última flor do Lácio, plantada no solo de Arariboia e Tibiriçá, não incultos capangas de culturas selvagens e genocidas que negam liminarmente a possibilidade do diálogo. Exijamos mais de nós mesmos. Não nos deixemos cair na lamentável posição de ajudantes da revolução.

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