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Ricardo Pozzo
Ricardo Pozzo| Foto:

Em certos dias, quando tomo uns calotes amorosos da vida, chego em casa e ligo o computador para um percurso cativo: chorar vendo vídeos de esporte. Escrevendo assim, pode até parecer piegas – talvez seja mesmo –, mas há noites em que nem acontece nada de tão significante e, mesmo assim, decido que é temporada de choradeira esportiva.

Bem, não tenho a menor certeza de que você precisa saber disso, mas vai que você se assome em lembranças e pense comigo: “Já chorei por isso também”? [Não estamos falando daquele choro do Hino Nacional na Copa do Mundo. Aquilo é desequilíbrio. E nós somos muito equilibrados, verdade seja dita.]

O meu relicário emocional começa com a vitória de Senna no Brasil, em 1993, ele sendo carregado pelo público no meio da pista. “Ayrton Senna vem passando… Completa 70 voltas!”. Desculpe-me, mas quando Galvão Bueno não narra uma corrida de Fórmula 1, meu domingo parece errado. “Agora complicou porque o carro parou. No meio do povo, ficou Ayrton Senna… […] Senna nos braços do povo! Uma imagem inédita na Fórmula 1”. Depois, a primeira vitória de Rubens Barrichello em Hockenheim, Alemanha, 2000. “Eu olho pro meu lado e o Burti chora na cabine… […] Rubens Barrichello entra no estádio… E nós vamos ouvir o Tema da Vitória, que há sete anos não tocávamos…” Essa parte, geralmente, me arrasa.

Para coroar o rali do sofrimento monomotor, a perda do título mundial de Felipe Massa na última curva em 2008. Aquilo foi muito errado. Então, entre elucubrações sobre o destino e as dores inevitáveis, decido ir para um caminho ainda mais hardcore, vendo a vitória do basquete brasileiro no Pan-Americano de 1987, contra os EUA, Oscar ao chão. Há também a vitória de Fernando Meligeni no Pan-Americano de Santo Domingo, na República Dominicana, em 2003, em cima do talentoso-mala-mor Marcelo Rios, no tie-break. Vejo a despedida de Gustavo Kuerten das quadras e o seu discurso de coração na mão – neste momento já nem lembro mais porque comecei a chorar. Para balancear, as vitórias de Guga na semifinal e final da Master Cup de 2000.

Então, é fim de noite e parto para a primeira coroação total: a vitória do handebol feminino brasileiro no Mundial de 2013. “20 a 20. O Brasil com uma a menos em quadra. Faltando 2’40 para o fim do jogo. […] Meu deus do céu, o Brasil vai ser campeão do mundo!”

Por fim, A Batalha dos Aflitos de 26.11.2005, narrada pela Rádio Guaíba, o épico jogo entre Náutico e Grêmio, valendo o acesso à Primeira Divisão do Campeonato Brasileiro, pênalti contra o Grêmio, que jogava pelo empate, mais de 60 (!) minutos do segundo tempo, uma coisa meio balcânica em Recife. “Eu não tranquei o meu cronômetro, eu não paralisei ele… Eu deixei correr… Já estamos com 59 minutos e meio desse segundo tempo. […] Galatto! […] O Grêmio é heróico! O Grêmio é do tamanho de sua história centenária. […] Gol! Anderson, um bólido! Anderson, um Fórmula 1! Anderson, um cometa! Só a imortalidade pode dizer o que está acontecendo nos Aflitos!”

No filme, duas cenas sempre me comovem: o torcedor do Grêmio balançando um cachorro preto nos braços, aliás, vestido com uma roupa pitoresca do seu time, e Sandro Goiano dizendo: “Não lembro de um time que foi campeão com seis na linha e um no gol”. É isso, Sandro. Na vida, a gente joga sempre com o time faltando. Hora de dormir, Grêmio. Hora de dormir, meus amores. Só a imortalidade poderá nos dizer se choramos em vão.

Ricardo Pozzo

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