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Dirceu e Genoino conversam na cadeia
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"É noite, os dois companheiros chegam à prisão. Nos próximos dias (meses?, anos?) terão de dormir na cadeia. Estão transtornados.

– E agora José?
– Não me venha com esses versos do Drummond. Não é hora para poesia. Lembre-se que você também é José.
– Deu tudo errado.
– É com os erros que se acerta. Sempre foi assim. Lembra na ditadura? Eu fui preso e deportado do país. Agora sou preso político de uma democracia.
– O que mais dói – e como dói – é que muitos que receberam dinheiro continuam livres, na luxúria. E eu não tenho onde cair morto. Minha esperança é a aposentadoria como deputado.
– Não nasci para ser um Zé Ninguém, um Zé Mané qualquer. Não roubei nada. Queria só aprovar uns projetos para ajudar o povo.
– Mas nos acusam de desvio de dinheiro público, que outros se beneficiaram ilicitamente. Por isso deu no que deu.
– O povo pobre ia receber em dobro. Não viu o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida e tantos outros programas?
– É, se tivesse dado tudo certo, até aumento de impostos para ricos nós teríamos aprovado no Congresso. A direita malandra se vende por qualquer coisa.
– Fomos burros. O Éfe-Agá-Cê aprovou a reeleição e muito mais. Houve denúncia de tudo quanto foi jeito, mas ninguém nunca provou nada.
– É, nós não conseguimos nem impedir a maldita CPI. Na época do Éfe-Agá-Cê não havia CPI que fosse para frente.
– E eu era para ter sido o sucessor do Lulalá. Eu era o homem mais forte da nação depois do Lulalá. Virei isso. E olha que não tem prova material contra mim.
– O que me conforta um pouco é que não conseguiram derrubar o Lulalá da cabeça do povo.
– Nossos inimigos devem estar em festa.
– Eu sou um cabra genuíno, meu nome diz isso. Esse processo acabou com meu coração; tive até um ataque cardíaco.
– Não tenho preocupação de morrer aqui. A vida foi feita para morrer.
– O que está feito está feito. Não dá para voltar atrás.
– Eu trouxe um iPod. Tem aquela música do Chico Buarque, 'O que será, que será? O que não tem conserto nem nunca terá'.
– Eu trouxe um livro do Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere.

A noite avança, os companheiros se ajeitam para dormir. Chico roda no iPod – sem nenhuma referência ao Barbosa – o hino da geração, Apesar de Você.

“Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão"

Amanhã será outro dia.

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