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Pessquisadores buscam medicamento para combater o novo coronavírus.
Imagem em microscópio eletrônico do vírus SARS-CoV-2 (laranja), causador da covid-19.| Foto: Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (EUA)

Um medicamento já usado contra o HIV, outro destinado ao tratamento da malária, um antiviral cuja promessa contra o Ebola fracassou e a combinação de dois antivirais com uma molécula que ajuda a controlar a inflamação no corpo. Essas são as prioridades de estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS) na tentativa de encontrar uma solução rápida para debelar o novo coronavírus, cientificamente chamado Sars-CoV-2 e causador da doença covid-19. Para isso foi lançada uma grande mobilização, a Solidarity (Solidariedade), por meio da qual cientistas de dezenas de países vão pesquisar simultaneamente a eficácia desses medicamentos para o tratamento de pacientes com covid-19.

O estudo pode incluir milhares de pacientes em diversos regiões do mundo e foi programado para ser o mais simples possível. De acordo com a OMS, com cerca de 15% dos pacientes com covid-19 sofrendo de doenças graves e hospitais sobrecarregados, as soluções de tratamento precisam de urgência. Em vez de criar compostos do zero, que podem levar anos para serem desenvolvidos e testados, os pesquisadores e agências de saúde pública vão concentrar as pesquisas com medicamentos já aprovados para outras doenças e conhecidos por serem seguros.

Será importante obter respostas rapidamente, tentar descobrir o que funciona e o que não funciona.

Ana Maria Henao Restrepo, da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Fiocruz lidera estudo no Brasil

No Brasil, o estudo será liderado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que tem um orçamento de R$ 4 milhões do Ministério da Saúde. Inicialmente, a Fiocruz fornecerá os medicamentos para os testes em pacientes contagiados pelo novo coronavírus. Para participar dos testes, as pessoas infectadas precisam ser pacientes graves, que requerem internação, e devem consentir explicitamente ao uso dos medicamentos.

A procura é por drogas que possam retardar ou matar o novo coronavírus (SARS-CoV-2), criando condições neste momento para salvar pacientes gravemente doentes, além de também poderem ser administradas profilaticamente para proteger os profissionais de saúde e outras pessoas com alto risco de infecção.

A OMS está se concentrando no que considera ser as quatro terapias mais promissoras: um antiviral experimental chamado remdesivir; os medicamentos contra a malária cloroquina e hidroxicloroquina; uma combinação de dois medicamentos para HIV (lopinavir e ritonavir); e essa mesma combinação mais interferon-beta.

Além da iniciativa Solidarity, da OMS, a agência francesa de pesquisa biomédica Inserm anunciou que coordenará um estudo complementar na Europa, chamado Discovery, que seguirá o exemplo da OMS e incluirá 3200 pacientes de pelo menos sete países, incluindo 800 da França. Os pesquisadores testarão os mesmos medicamentos, com exceção da cloroquina.

Remdesivir

Originalmente desenvolvido pela Gilead Sciences – uma companhia de bioteclogia dos EUA – para combater o Ebola. Pesquisadores testaram o remdesivir no ano passado durante o surto de Ebola na República Democrática do Congo, mas não mostrou nenhum efeito. Apesar do insucesso contra o Ebola, a droga deu sinais de ter potencial contra os coronavírus com base em testes de células cultivadas em laboratórios. “Entre os medicamentos incluídos no projeto Solidarity, o remdesivir parece ter a atividade anticoronavírus mais potente em testes de laboratório", declarou Stephen Morse, diretor do programa de Epidemiologia de Doenças Infecciosas da Universidade de Columbia (EUA) à BBC Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC.

De acordo com a revista Science, um primeiro paciente com covid-19 diagnosticado nos Estados Unidos – um jovem no condado de Snohomish, em Washington – recebeu remdesivir quando sua condição estava grave e melhorou no dia seguinte. O relato foi publicado pelo The New England Journal of Medicine. Mas os pesquisadores estão cautelosos e precisam aprofundar os estudos.

Cloroquina e hidroxicloroquina

Medicamentos usados contra malária, lúpus e artrite reumatoide. No último dia 20, o presidente dos EUA, Donald Trump, chamou a cloroquina e a hidroxicloroquina de "mudança de jogo". Seus comentários levaram a uma corrida na demanda pelos antimaláricos.

No Brasil, pesquisadores do Hospital Israelita Albert Einstein, HCor, Sírio Libânes e BRICNet, uma rede que realiza estudos clínicos na área de medicina intensiva, se uniram para encontrar respostas sobre a segurança e eficácia do remédio. Desde que surgiram informações sobre o medicamento, muita gente foi às farmácias e comprou o medicamento, que não exigia receita para ser vendido. A corrida às farmácias provocou falta do remédio para as pessoas que fazem uso contínuo.

O Solidarity havia decidido deixar cloroquina e hidroxicloroquina de fora do estudo, mas mudou de opinião em 13 de março, considerando que os medicamentos “receberam atenção significativa” em muitos países. O grande interesse despertou "a necessidade de examinar evidências emergentes para informar uma decisão sobre seu papel potencial", informou a organização.

Segundo a revista Science, os resultados dos pacientes tratados até agora com o medicamento contra malária não são definitivos. A Sociedade Americana de Medicina Intensiva disse que "não há evidências suficientes para emitir uma recomendação sobre o uso de cloroquina ou hidroxicloroquina em adultos gravemente enfermos com covid-19". O Ministério da Saúde do Brasil recomendou às pessoas para não se automedicarem com os dois remédios.

Ritonavir/lopinavir

Este medicamento combinado, vendido sob a marca Kaletra, foi aprovado nos Estados Unidos em 2000 para tratar infecções por HIV. De acordo com a Science, o primeiro teste do composto  com covid-19 não foi encorajador. “Médicos em Wuhan, China, deram a 199 pacientes duas pílulas de lopinavir/ritonavir duas vezes ao dia, além de tratamento padrão ou apenas tratamento padrão. Não houve diferença significativa entre os grupos”, relatou a revista ao citar publicação do jornal especializado em medicina The New England Journal of Medicine.

À BBC Mundo, especialistas consultados concordaram que a mistura não mostrou resultados encorajadores contra o novo coronavírus. "Mas você nunca sabe, é razoável tentar novamente", disse à rede britânica o epidemiologista George Rutherford, professor de bioestatística da Universidade da Califórnia (EUA), disse que

Ritonavir/lopinavir e interferon-beta

Os pesquisadores do Solidarity também estão estudando a combinação dos dois antivirais com o interferon-beta, uma molécula que atua na regulação da inflamação no corpo. A mistura demonstrou ser eficaz em animais infectados pela síndrome respiratória do Oriente Médio (Mers, na sigla em inglês).

Mas especialistas ouvidos pela Science alertam que o uso de interferon-beta em pacientes com covid-19 grave pode ser arriscado. Os cientistas alertam que é essencial ter cuidado quando administrados, pois, se aplicados em estágios muito avançados, podem ser ineficazes ou até causar mais mal do que benefícios ao paciente. "Se for administrado no final da doença, pode facilmente levar a danos aos tecidos, em vez de ajudar os pacientes", advertiu  Susanne Herold, especialista em infecções pulmonares na Universidade de Giessen, Alemanha.

Outros medicamentos

Um comitê global de monitoramento de segurança de dados analisará os resultados das pesquisas, em intervalos regulares, e decidirá se algum membro do quarteto tem um efeito claro ou se um deles pode ser descartado.

Para obter resultados seguros com o estudo, vários milhares de pacientes precisarão ser recrutados. Brasil, Argentina, Irã, África do Sul e vários outros países não europeus já se inscreveram, segundo a OMS. Já o estudo europeu, Discovery, recrutará pacientes da França, Espanha, Reino Unido, Alemanha, Bélgica, Luxemburgo e Holanda.

Segundo a OMS, vários outros medicamentos, incluindo o favipiravir, produzido pela Toyama Chemical, do Japão, podem ser adicionados ao estudo. Outros exemplos são tocilizumab e o sarilumab, imunossupressores empregados para doenças como a artrite reumatoide e que se mostram úteis para controlar processos inflamatórios provocados pelo vírus. Além disso, já se estuda o uso de plasma sanguíneo de pessoas que superaram a doença e geraram anticorpos como tratamento para a Covid-19

As vacinas

Na lista da OMS estão mais de 40 candidatos a vacina, todos em estágio de desenvolvimento por equipes de todo o mundo. No momento, pelo menos dois grupos iniciaram a primeira fase de ensaios clínicos em humanos. Os testes buscam provar a segurança e a capacidade de causar uma reação imunológica. Uma delas é a vacina mRNA-1273, desenvolvida por cientistas do Instituto Nacional para as Alergias e as Doenças Infecciosas da Espanha (Niad) em colaboração com a companhia norte-americana Moderna. Além de testar a vacina diretamente em humanos, ao mesmo tempo, a equipe está realizando os habituais ensaios com animais. A segunda pesquisa é desenvolvida pela empresa chinesa CanSino Biologics em colaboração com a Academia Militar de Ciências Médicas da China. Mesmo que os estudos tenham êxito, ainda serão necessários meses para produzir as vacinas e mais um tempo para que cheguem à população, tempo esse estimado em até um ano e meio.

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