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Sou bicho em extinção no Paraná
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OnçaEu não sou apenas bicho do Paraná, como diz o cantor e compositor João Lopes na balada que fez sucesso Brasil afora. Também não sou gato de Ipanema. Eu sou a onça-pintada, esse animal que muitos admiram e ao mesmo tempo temem. Não faz muito tempo, minha espécie habitava todo o continente americano, desde o sul dos EUA até o norte da Argentina. Mas hoje estamos caminhando para a extinção. Em muitos lugares do Brasil deixamos de existir faz muito tempo.

E ainda têm gente com coragem de dizer que é amigo da onça. Quanta falsidade!

No Paraná, onde dominávamos as matas de todas as regiões, vivemos agora restritas a dois parques nacionais, o Iguaçu e o de Ilha Grande. E acho que em pouco tempo já não vamos existir no Parque Iguaçu. Os ambientalistas dizem que nós podemos ser extintas do planeta em 80 anos, mas eu acredito que a tragédia irreversível acontecerá muito antes disso.

Eu vivo no Parque, ao lado das Cataratas, e temo pela minha vida todos os dias. As câmeras instaladas por biólogos aqui na nossa mata provam o que estou falando. Hoje não passamos de 18 animais. Há 20 anos éramos mais de 150.

Para quem não sabe, tem um livro chamado Livro Vermelho da Fauna Brasileira que nos coloca entre as 627 espécies ameaçadas de extinção. Vão dizer que eu sou bicho irracional e não sei o que estou dizendo, mas está lá no livro.

Eu sei que muita gente morre de medo só de ouvir falar de onça. Também pudera, no passado espalharam por aí que onça come gente. “Não entre na mata que a onça te come”, diziam as mães aos filhos pequenos na época do desbravamento dos sertões paranaenses.

Eu fico uma onça de braba quando vejo pessoas com medo de onça. Nosso apetite é por outras espécies, como queixadas, capivaras, veados (a não viados), antas, porcos-do-mato, tamanduás, jacarés e até sucuris. Carne de gente é ruim, não presta nem para comer. Tá certo que tem muita gente que não passa de uma anta, mas… Só atacamos pessoas quando nos sentimos ameaçadas, quando invadem nosso espaço.

Mas eu entendo, faz parte da cultura dos brasileiros. Expressões como “você tá com um bafo de onça”, fulano virou comida de onça” e outras são contribuições nossas para enriquecer o jeito de vocês se expressarem.

Até hoje não entendi como tiveram a audácia de criar um personagem de história em quadrinhos que se chama João Bafo de Onça. Uma injustiça essa máxima de chamar de bafo de onça quem tem mau hálido. Não vou negar que não escovo os dentes, mas minhas presas são bem mais saudáveis que muitos que falam de mim. Alguém se atreve a conferir?

Concordo mais com aqueles que, quando estão em apuros, dizem que chegou a “hora da onça beber água”.

Para que as gerações de humanos do futuro possam nos conhecer é preciso impedir o desmatamento que ocorreu no Brasil nas últimas décadas. Nós precisamos de extensas florestas, campos abertos e fontes de água limpa para sobreviver. Eu sei que foram criadas 25 áreas de preservação da onça-pintada no Brasil, mas isso é pouco. São necessárias outras medidas para nos proteger.

A transformação das áreas onde vivemos em pastagens e plantações é fatal para nós. Isso sem dizer que tem gente, ainda hoje, que gosta de caçar onça só pelo prazer de nos matar. Alguns fazendeiros dizem que estamos comendo o gado deles e mandam nos matar. Ora, sem ter o que comer, só mesmo comendo bovinos.

Vocês deveriam saber que se todos os animais forem extintos, os humanos também morrerão. E seus filhos e netos vão condená-los para sempre ao saber que existia no Paraná o maior carnívoro da América do Sul, mas que vocês não fizeram nada para preservá-lo.

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