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“Contingenciamento e carnaval têm todo ano”, diz Paulo Bernardo
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Rodolfo Bührer/Gazeta do Povo
Bernanrdo, do Planejamento: otimismo, sim; despreocupação, não.

Publicado na edição de hoje da Gazeta do Povo

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, admitiu ontem cortes no orçamento de 2009. Ele tratou as alterações com naturalidade, diante da previsão de diminuição do crescimento do país. “Se crescermos menos, teremos menos receita. Aí não é uma opção, teremos obrigatoriamente de cortar despesas para equilibrar o orçamento.”

Bernardo também confirmou, em entrevista exclusiva, a disposição de diminuir gastos com o custeio da máquina pública e investimentos, mas garantiu que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e projetos sociais como o Bolsa Família estão 100% protegidos. Segundo o ministro, há possibilidade de adiamento ou cancelamento de concursos públicos, como o da Polícia Federal.

Os cortes no orçamento tornaram-se inevitáveis?
Cortes no orçamento são uma rotina. Eu até brinco com o pessoal – contingenciamento e carnaval têm todo ano. O que está despertando polêmica é a existência da crise mundial. De fato ela ainda não se refletiu na nossa economia, mas todos acreditam que vá ter algum efeito. O mais esperado é que o país cresça um pouco menos em 2009. Se crescermos menos, teremos menos receita. Aí não é uma opção, teremos obrigatoriamente de cortar despesas para equilibrar o orçamento. Como eu não sei em que medida vai diminuir nossa receita, ainda acho prematuro dizer o que vamos cortar. Mas com certeza o orçamento terá de ser reequilibrado porque não vamos mudar a meta de superávit.

O senhor concorda com a proposta de redução de 20% em custeio da máquina pública do relator do Orçamento Geral da União de 2009, senador Delcídio Amaral (PT-MS)?

Quando alguém fala de cortes de maneira linear, é bom ter um pouco de prudência. O custeio para efeito orçamentário, por exemplo, inclui o Bolsa Família. É um programa que não está enquadrado como investimento, mas como uma despesa corrente. Se você pegar várias outras rubricas, na área da educação e saúde, ocorre o mesmo. Como regra geral, se o senador estiver falando daquelas despesas nas quais a gente normalmente concentra os cortes, como viagens e manutenção da máquina, devemos mesmo economizar ao máximo.

Há setores 100% protegidos de cortes?
Tem. Não passa pela cabeça de ninguém cortar o Bolsa Família, nem os programas sociais já implantados. Também não vamos fazer cortes no PAC. Na prática, isso significa que outros investimentos que não constam no PAC podem ser diminuídos ou até suprimidos. Além disso, programas sociais que não tenham sido implementados podem ser adiados. Em um caso de necessidade, também podemos adiar a realização de concursos. Realizados os concursos, posso adiar também a incorporação dos aprovados para o serviço público. A decisão precisa ser tomada a partir de uma projeção mais realista possível da nossa receita, o que iremos fazer até o fim de novembro.

Diminuir concursos e contratações é a primeira gordura a ser queimada?
Não. No caso da educação, temos mais de 14 mil vagas para as universidades para as novas escolas técnicas federais e não temos nenhuma pretensão de cortar isso. Se a crise obrigar, podemos adiar a decisão de incorporar essas pessoas. Outro caso: estamos autorizando a realização de concurso para 3 mil vagas na Polícia Federal. Achamos que é importante, mas se precisarmos cortar vamos ter de fazer, não tem jeito.

O senhor já trabalha com alguma idéia de mudanças nas projeções econômicas do próximo ano?
Temos idéia, mas como eu posso estudá-las melhor até novembro, é melhor não divulgá-las antes e aumentar a especulação. Nós mandamos a projeção de inflação da proposta orçamentária de 2009 com um índice de 4,5%. O mercado trabalha com 4,9%. Quanto ao crescimento, mandamos uma projeção de 4,5%, mas o Fundo Monetário Internacional está dizendo que vamos crescer 3,7%. Neste momento, tendo a achar que vai ficar entre esses dois índices. Temos também de fechar a cotação do dólar, da taxa de juros e do petróleo, que devem sofrer alterações. Tudo isso mudará a peça orçamentária.

Como o senhor avalia a criação do Fundo de Estabilização Fiscal (a idéia é criar uma reserva de até R$ 12 bilhões para manejo do governo durante a crise, a partir de cortes em custeio e investimento) proposta pelo senador Amaral?
É uma idéia interessante, mas primeiro precisamos fazer o Fundo Soberano, que ainda depende da aprovação do Congresso Nacional. Em segundo lugar, mandamos na proposta orçamentária um pedido de reserva de R$ 15 bilhões. Mas as idéias não são conflitantes. Na verdade é uma poupança em anos de melhor situação fiscal para nos precavermos em caso de aperto no futuro.

Como estados e municípios devem se comportar em relação à crise?
Os prefeitos que vão entrar têm de ser prudentes. Se tanta gente está prevendo que a economia vai diminuir, o que significa uma queda da receita federal, a receita dos estados e municípios cai também. No caso dos estados, o governador está no meio do mandato e pode definir melhor como prosseguir com os projetos. Já os prefeitos precisam esperar por uma definição do quadro econômico antes de sair fazendo qualquer coisa.

Há razão para o governo manter otimismo diante da evolução da crise?
Nós estamos otimistas, o que não quer dizer que estamos despreocupados, que não olhamos com lupa o que acontece com o andamento da crise no exterior e aqui. O grande problema que temos hoje é a falta de crédito. Os bancos com dinheiro sumiram, sentaram em cima dos recursos. Não emprestam nem para outros bancos. Isso provoca uma dificuldade na captação de crédito para capital de giro, para o exportador, para a agricultura. O que estamos tentando fazer é abastecer o mercado. Liberamos depósitos compulsórios para facilitar a operação dos bancos. Se não for suficiente, vamos tomar outras medidas. Podemos inclusive aumentar o compulsório. A tendência é a crise passar por essa fase mais aguda e haver um destravamento do crédito. Mas depois que acabar a crise financeira, haverá a crise econômica. Fala-se em recessão na Europa e Estados Unidos. No Brasil, com certeza não teremos recessão. Mas a diminuição do crescimento é um ônus com o qual teremos de arcar.

Qual conselho o senhor daria para o cidadão comum às vésperas do natal?
Quem tem renda, emprego, deve se comportar naturalmente. Meu conselho em qualquer circunstância, mesmo em tempo de bonança, é fazer uma poupança. A crise não vai ter o mesmo efeito aqui do que terá lá fora. Não passamos por problemas imobiliários, não temos títulos podres. Cautela e caldo de galinha não faz mal a ninguém. Mas não há motivo para privação.

O senhor acredita que a crise pode piorar ainda mais?
É bom lembrar que ela vem de junho do ano passado. Ela já se arrasta há mais de um ano. O que tornou a crise mais aguda foi o fato de que as pessoas perceberam que ninguém tem informações completas sobre a crise, nem o governo norte-americano. Muitos dos contratos que agora sabemos que eram furados eram de natureza privada. Ninguém tinha pleno conhecimento do tamanho do rombo porque ele não era público. Há um convencimento de que não se sabe qual é a extensão definitiva da crise. Comenta-se que os governos já colocaram US$ 3 trilhões para dar liquidez ao mercado e não conseguiram. Mas eu acho que a crise tende a amainar, a agitação vai passar. Mas vamos ter um rescaldo de mais dois anos, que será a fase de remover os escombros. A eleição nos Estados Unidos vai definir muita coisa e acredito que eles possam reagir com rapidez e puxar o resto do mundo para fora do furacão. O Brasil será um dos últimos países a entrar na crise. E vai ser um dos primeiros a sair dela, disso eu não tenho dúvida.

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