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O sistema político brasileiro é como aquele chocolate que sempre traz uma surpresa. A diferença é que quase nunca há um brinquedo escondido – a revelação do conteúdo costuma provocar mais sustos que risos.

Difícil acreditar que o cidadão médio (e o não tão médio assim) que elegeu a presidente Dilma Rousseff prestou muita atenção na sopa de letrinhas que compôs a coligação da petista em 2010. Para quem não lembra, aí vai: PT-PMDB-PCdoB-PDT-PRB-PR-PSB-PSC-PTC-PTN. Ganha um doce (sem surpresa) quem souber o que significam todas essas siglas.

O leitor que seguir até o quinto tracinho da esquerda para a direita vai se deparar com o PR. Não é o Paraná, mas o Partido da República. Você pode não conhecê-lo, mas deveria.

Toda vez que um sujeito trafega por uma rodovia federal está sob a jurisdição do PR. E faz tempo. Desde 2003 (quando ainda era o PL), a legenda comanda o Ministério dos Transportes.

O mineiro Anderson Adauto foi ministro até 2004, quando foi substituído pelo amazonense Alfredo Nascimento. Ex-prefeito de Manaus, Nascimento era um personagem discreto do primeiro escalão até a semana passada. Apesar da longevidade no cargo, poucos brasileiros o associavam aos buracos nas estradas.

Há nove dias, entretanto, ele entrou no olho do furacão dos escândalos da política nacional. Reportagem da revista Veja denunciou que o ministério funcionava como um feudo do PR, que teria implantado por lá o seu próprio mensalão. Segundo a Veja, empreiteiras com obras relacionadas à pasta pagavam ao partido 5% do contrato como propina.

Na quarta-feira, Nascimento caiu. Mas continua em pé, já que volta a ocupar uma cadeira no Senado e a presidência do PR. Sem contar o direito de influir na escolha do substituto nos Transportes.

Talvez o mais chocante nessa história não seja nem as denúncias de corrupção. Desde o mensalão “original”, de 2005, essa é só mais uma triste banalidade do noticiário de Brasília. O que mais surpreende é a força do tal PR, até então apenas mais uma sigla perdida no caldo ralo de consistência ideológica da base governista.

Será isso culpa de Dilma ou do PT? Em parte. É injusto pregar que o “presidencialismo de coalizão” é uma praga recente, uma herança maldita da era Lula.
Autor do termo, o cientista político Sérgio Abranches lembra que essa era uma prática adotada desde a República de 1946.

Em 1988, o mesmo Abranches já havia descrito o sistema como instável e de alto risco. No entanto, era a receita comum para compatibilizar um Executivo de poderes imperial e um Legislativo extremamente fragmentado.

Vieram as eleições diretas para presidente e Fernando Collor até tentou montar um ministério enxuto, dividido entre apenas três partidos (PFL, PRN e PDS). Deu no que deu. Depois disso, FHC e Lula voltaram à prática da troca de apoio no Congresso por assentos no primeiro escalão.

Eis que, em 2011, a primeira mulher assume o poder. É também a primeira presidente que carrega o rótulo de gestora, não de política. Fica a dúvida: dá para gerir o país de um jeito diferente dividindo a administração da mesma forma politiqueira de sempre?

O caso PR deixou claro que, por enquanto, a resposta é não.

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