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Crédito da Foto: Rogerio Resende/R2Foto
Crédito da Foto: Rogerio Resende/R2Foto| Foto:

Luciano Huck citou o canto da sereia de Ulisses para começar a explicação, em artigo, sobre os motivos que o levaram a não se candidatar a presidente em 2018. Admitiu que o encanto presidencial o perseguiu nos últimos meses, que o som vinha “inclusive” de dentro dele. E que foi salvo da tentação pela família.

Pode parecer desculpa esfarrapada, mas não é.

Huck não é o santo pintado por alguns, nem o demônio da Globo mencionado por outros. Ao que consta, tem uma família estruturada, é bem-sucedido nos negócios e na carreira de apresentador de televisão. Abrir mão de tudo isso para se aventurar em um ambiente emporcalhado como o da política exige uma tensa mistura de abnegação, coragem, ambição.

No fundo, no fundo, o que mais parece apavorar Huck não é a pancadaria que viria na campanha. É o fato de que ele realmente teria chance de vitória. O que fazer depois de ser presidente? É possível tirar a política brasileira do caos só com a faixa no peito? Quem estaria disposto a entrar no barco para ajudar nesse processo de renovação? Como lidar com um Congresso que não vai mudar de prática do dia para a noite?

Além desses dilemas futuros, há os problemas do presente. Huck já está com um pé na política, ajudando um movimento de renovação chamado Agora. Quando ensaiou colocar o outro pé, tomou um choque de realidade.

Para concorrer, precisaria se filiar a um partido político. Conversou com o PPS, que topou até trocar de nome para recebê-lo. Nanico, o partido ofereceria menos de 20 segundos de propaganda partidária. Para trazer mais gente para a coligação, seria necessário negociar – e negociação de chapas no Brasil é feita daquele jeito que a Lava Jato joga todos os dias na nossa cara.

Nem mesmo um nome competitivo como Huck (ou qualquer outro que venha a aparecer) ganharia a eleição sem se submeter ao jogo sujo das regras eleitorais brasileiras. Lula, que lidera com folga as pesquisas, beija desavergonhadamente a mão de caudilhos do PMDB que foram essenciais para a queda de Dilma Rousseff. Jair Bolsonaro, o segundo colocado, vai usar a carcaça de um partido fisiológico como PEN para criar o Patriota e fingir que tudo está normal.

O PSDB, antes um gigante, junta os cacos de uma briga interna que mostra o quanto o nome escolhido, provavelmente Geraldo Alckmin, ficará refém do legado do quase-presidiário Aécio Neves. Marina Silva, que já beijou a mão de Lula e de Aécio, sabe decorada a cartilha de conchavos necessários para botar uma coligação de pé e não ser esmagada, como foi pelo PT no primeiro turno de 2014.

Nessa bagunça generalizada, os porquês de Huck são fáceis de decifrar. O assustador é o quanto eles expõem a realidade política brasileira. Em uma eleição em que todas as pesquisas indicam a sede pelo novo, o novo é praticamente impossível.

Não que Huck fosse o presidente ideal (particularmente, não que seja nem um candidato ideal). Mas se nem ele, que tem dinheiro fama e contatos topou entrar na fogueira, dificilmente outro nome do mesmo porte vai entrar. Ao que tudo indica, temos grandes chances de passar 2018 discutindo os escombros da Lava Jato, o legado da ditadura militar e a oportunidade de debater um futuro sólido, que não seja apenas um canto de sereia.

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