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Missa no Santuário Nacional de Aparecida, em 12 de outubro de 2017.
Missa no Santuário Nacional de Aparecida, em 12 de outubro de 2017.| Foto: Sebastião Moreira/EFE

O Grupo de Estudos Constitucionais e Legislativos (GECL) do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), manifestou-se acerca do uso de traje de Nossa Senhora Aparecida por uma trans brasileira no concurso Miss International Queen 2022, realizado na Tailândia, o que vem a afrontar a fé católica romana.

Conforme notícias veiculadas pela imprensa, a modelo trans participante do evento foi trajada com as vestes de Nossa Senhora Aparecida, considerada pela Igreja Católica como padroeira do Brasil. Entende-se que a escolha dessa fantasia fere sentimento religioso, ao passo que se ignora a doutrina da Igreja Católica Apostólica Romana no que tange à sexualidade, aos valores familiares e à sacralidade de Nossa Senhora. O Catecismo da Igreja Católica aponta que o matrimônio é desígnio de Deus, quando dispõe:

1605. Que o homem e a mulher tenham sido criados um para o outro, afirma-o a Sagrada Escritura: ‘Não é bom que o homem esteja só’ (Gn 2, 18). A mulher, ‘carne da sua carne’,isto é, sua igual, a criatura mais parecida com ele, é-lhe dada por Deus como uma auxiliar, representando assim aquele ‘Deus que é o nosso auxílio’. ‘Por esse motivo, o homem deixará o pai e a mãe, para se unir à sua mulher: e os dois serão uma só carne’ (Gn 2, 24). Que isto significa uma unidade indefectível das duas vidas, o próprio Senhor o mostra, ao lembrar qual foi, ‘no princípio’, o desígnio do Criador: ‘Portanto, já não são dois, mas uma só carne’ (Mt 19, 6).”

A escolha do traje fere sentimento religioso, ao passo que se ignora a doutrina da Igreja Católica Apostólica Romana no que tange à sexualidade, aos valores familiares e à sacralidade de Nossa Senhora

É neste espírito que o Código de Direito Canônico estabelece a formação familiar mediante o matrimônio de homem e mulher, ordenados para a constituição familiar:

Cân. 1055 – § 1. O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio íntimo de toda a vida, ordenado por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à procriação e educação da prole, entre os batizados foi elevado por Cristo Nosso Senhor à dignidade de sacramento.”

Importa dizer, a constituição familiar, sedimentada na doutrina e no estatuto jurídico da Igreja Católica, guarda em sua ordenança a preservação da mulher biológica enquanto criação de Deus com finalidade outorgada pelo próprio Deus. A transexualidade, portanto, não importa na condição de mulher.

Trata-se a posição acima elencada de um exemplo do sedimento do exercício da fé católica, que, quando desrespeitado por incrédulos, não se trata apenas da profanação da fé sob a égide do Direito Canônico, mas, sobretudo, na manifestação de intolerância religiosa, cuja manifestação de fé encontra salvaguarda na Constituição brasileira e na legislação.

Importante lembrar que Nossa Senhora Aparecida, para os católicos, é Maria de Nazaré, mãe de Jesus Cristo, considerada virgem imaculada, pois sua gravidez foi obra do Espírito Santo. É venerada sob os mais variados títulos em muitas igrejas brasileiras, tendo sido proclamada padroeira do Brasil pelo papa Pio XI, em 1930, tendo inclusive um santuário dedicado a ela: o Santuário Nacional de Aparecida, localizado no estado de São Paulo, que recebe peregrinos do Brasil e do mundo.

No caso em questão, a candidata a “Miss Universo Trans” Eloá Rodrigues utilizou os trajes representativos de Nossa Senhora Aparecida, sob o argumento da representatividade da cultura típica brasileira, utilizando, além do traje representativo da fé católica, um decote denotando sensualidade.

Vale relembrar que em 2017 a Escola de Samba Unidos de Vila Mar iarequereu uma autorização da Arquidiocese de São Paulo para adotar, como tema do desfile, a comemoração dos 300 anos da descoberta da imagem de Nossa Senhora Aparecida. Nessa ocasião, a questão foi levada ao conhecimento do Conselho Pro-Santuário Nacional de Aparecida, que, por unanimidade, deu parecer favorável à iniciativa, mas recomendou que fossem observados alguns critérios: 1. Respeito à imagem de Nossa Senhora Aparecida, à fé e à religiosidade do povo católico; 2. Fidelidade aos fatos históricos; 3. Apresentação da genuína piedade mariana católica, sem sincretismos; 4. Decoro no desfile da escola, sem exposição de nudez; 5. Supervisão dos preparativos pelo Santuário de Aparecida e pela Arquidiocese de São Paulo. Ainda assim, a posição autorizativa foi controversa pela comunidade católica, de modo que se fez necessária uma publicação de esclarecimento da Arquidiocese a respeito da decisão.

Quando o exercício da fé católica é desrespeitado por incrédulos, não se trata apenas da profanação da fé, mas de manifestação de intolerância religiosa

A liberdade de expressão e de manifestação cultural não tem o condão de atropelar a crença, nem tampouco de desrespeitar o sagrado do próximo e deturpar, em desalinho à consciência religiosa, os estatutos institucionais da fé cristã. Isso porque a manifestação cultural religiosa deve fidelidade e respeito aos seus institutos, de modo a não ferir o que é sagrado. Os professores Thiago Rafael Vieira e Jean Marques Regina, em sua magna opus, Direito Religioso, ensinam:

“Ofender e denegrir o sagrado é um ataque ao mais íntimo do homem. Aqui vale a expressão: ‘Ao que lhe é mais sagrado’. Atacar sua fé no sagrado é solapar a sua dignidade de ser humano. Essa é a última barreira, o último muro para a bestialidade. Aqui deixamos de ser hu­manos, para nos tornarmos animais. Não podemos ultrapassar essa barreira. Precisamos lutar forte­mente quando vemos alguém tentar derrubar ou minar esse muro. Sem dignidade não temos vida humana, voltamos ao status de res. (...)

Assim, sempre que alguém solapar o sagrado, é necessário a sociedade civil interpor-se, contrariar, não aceitar. Estamos falando de dignidade humana, estamos falando de vida. Sem dignidade não há vida plena, apenas um suspiro dela. Todos os meios que tivermos para tentar barrar ataques à dignidade devem ser usados: boicote, justiça etc. Por isso os crimes contra a honra e contra o sentimento religioso são tutelados penalmente em qualquer lugar do mundo.”

O desfile, sob a justificativa incabível de manifestação cultural, afronta os princípios instituídos da fé católica em desrespeito à sua doutrina e aos seus estatutos jurídicos, ferindo o sentimento da fé católica

Por fim, com maestria, crava Mário Ferreira dos Santos em A invasão vertical dos bárbaros: “A blasfêmia e o sacrilégio são uma ofensa à dignidade humana e revelam a baixeza da alma de quem os pratica”.

Desta feita, o IBDR entende que o desfile realizado pela trans Eloá Rodrigues, sob a justificativa incabível de manifestação cultural, afronta os princípios instituídos da fé católica em desrespeito à sua doutrina e aos seus estatutos jurídicos, ferindo o sentimento da fé católica.

(Assinam esta manifestação pública Jorge Baklos Alwan, líder do GECL, e Gabriel Ferreira de Almeida, membro do IBDR e do GECL para a temática de Direitos Humanos; com revisão de Silvana Neckel, membro do GECL e conselheira do IBDR, e Warton Hertz de Oliveira, diretor-técnico do IBDR; com revisão final e “de acordo” de Thiago Rafael Vieira, presidente do IBDR.)

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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