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O caso do ex-assessor de Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Eduardo Tagliaferro, ganhou o noticiário internacional nos últimos dias e promete trazer mais uma dor de cabeça ao ministro. Tagliaferro, acusado de crimes dos quais o próprio Moraes é “vítima”, foi detido por algumas horas na Itália, o que acabou revelando ao mundo que Moraes encaminhou aos italianos um pedido de prisão e de extradição de Tagliaferro. A grande questão que se coloca é: será extraditado ao Brasil ou Moraes sofrerá mais uma humilhação internacional sem precedentes?
A resposta começa pelo básico: Tagliaferro não foi preso. O tribunal italiano rejeitou o pedido de prisão preventiva feito por Moraes e determinou apenas medidas cautelares alternativas, como a apreensão do passaporte e a proibição de saída da cidade. Para os juízes italianos, não havia risco de fuga: mesmo denunciado pela PGR, ele permaneceu em casa, à disposição das autoridades. A mensagem é clara: não se trata de um foragido perigoso, mas de um cidadão disposto a responder dentro da lei.
Outro detalhe chama a atenção: Moraes não pediu a inclusão de Tagliaferro na difusão vermelha da Interpol. Por quê? Por medo. Medo de ver sua ordem rejeitada pela comunidade internacional — o que já ocorreu em outros casos.
Três fatores pesam contra Moraes: primeiro, a perseguição política evidente, pois, em nenhum país sério, a própria “vítima” dos crimes conduz o processo como juiz; segundo, as sanções internacionais, já que Moraes foi incluído na lista de sancionados da Lei Magnitsky, que pune autoridades por violações de direitos humanos, fazendo com que qualquer decisão sua seja examinada com ceticismo redobrado; e, terceiro, o histórico negativo de Moraes na própria Interpol, que, em casos anteriores, como o de Oswaldo Eustáquio, recusou-se a cumprir ordens do ministro por considerá-las perseguição política.
Moraes não pediu a inclusão de Tagliaferro na difusão vermelha da Interpol. Por quê? Por medo. Medo de ver sua ordem rejeitada pela comunidade internacional
A situação é ainda mais constrangedora quando especialistas europeus classificam o caso como “altamente inusual”, como fizeram em um levantamento especial aqui para a Gazeta do Povo. Alguns juristas relataram nunca ter visto algo parecido em jurisprudência de extradição: um pedido feito por um juiz que é, ao mesmo tempo, vítima dos crimes do extraditado. A conclusão é inevitável: a Itália pode barrar o pedido alegando falta de imparcialidade e risco à garantia de um julgamento justo. E é exatamente esse o argumento que a defesa de Tagliaferro deve apresentar. O constrangimento não será pequeno. Imagine a cena: tribunais italianos rejeitando oficialmente um pedido brasileiro porque não veem imparcialidade no processo. Será mais uma humilhação internacional para o STF.
Vale lembrar: quando advogados da deputada Carla Zambelli explicaram às autoridades italianas que Moraes era, simultaneamente, juiz e vítima de seus supostos crimes, a reação foi de incredulidade — seguida de risos. Porque, para qualquer pessoa razoável, em qualquer democracia minimamente funcional, isso é absurdo. Só aqui, no Brasil, imprensa e juristas ditos “garantistas” fingem não ver nada de errado e aplaudem de pé os abusos de Moraes. Lá fora, a reação é diferente: perplexidade e, muitas vezes, desprezo. A risada dos magistrados revela: o Brasil não é um país sério.
Há ainda um último ponto devastador para o pedido de extradição: Eduardo Tagliaferro é um whistleblower. Ele denunciou ilegalidades cometidas por Moraes e, por isso, goza de proteção especial prevista em normas internacionais de direitos humanos, tanto no sistema europeu quanto no interamericano. Como lembra o procurador regional da República Vladimir Aras, uma referência em matéria de cooperação internacional, a perseguição a denunciantes é frontalmente contrária às normas internacionais que regem o assunto.
No caso Viteri Ungaretti vs. Equador, decidido em novembro de 2023, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que tem jurisdição sobre o Brasil, garantiu a proteção internacional aos direitos dos whistleblowers, reportantes do bem e denunciantes de crimes. Viteri Ungaretti era um adido militar do Equador em Londres que, após denunciar atos de corrupção que testemunhou, foi vítima de diversas retaliações e punições pelo Estado equatoriano. A corte condenou o Equador a pagar reparações a Ungaretti e sua família. Além disso, a União Europeia também tem diretivas e precedentes consolidados de proteção a reportantes do bem, denunciantes de crimes e whistleblowers.
Por todos esses fatores, tudo indica que a Itália não extraditará Tagliaferro. Se isso se confirmar, Moraes sofrerá uma derrota histórica: será a primeira vez no mundo em que um tribunal nega a extradição porque o juiz que pede é, ao mesmo tempo, a suposta vítima e o algoz do réu. Nada mais simbólico para o Brasil de hoje: um país em que a Justiça se tornou instrumento de perseguição política, desmascarada e rejeitada no exterior. É, realmente, tragicômico. O que, para nós, é tragédia, para o mundo é piada.




