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Livro da semana – O apanhador nos campos de centeio
| Foto:
Associated Press
Salinger: o criador do adolescente xarope.

“O apanhador nos campos de centeio” é um livro sobre a adolescência. Mais do que isso: é um dos livros que ajudou a inventar a adolescência como conhecemos hoje.

Até o início do século 20, não havia essa fase da vida em que você, embora já ache que tenha capacidade para fazer tudo igual aos adultos (ou muito melhor) acaba sendo proibido de fazer aquilo que quer.

Antes da metade do século, ou você era criança (e não podia quase nada), ou era adulto (e podia mandar nas crianças). O intermediário não existia.

Com o tempo, porém, os jovens começaram a trabalhar mais tarde e caíram no que Contardo Calligaris diz ser uma espécie de “moratória”. Se acham capazes de ter uma vida sexual e de trabalhar, mas não são livres para fazer nem um nem outro.

Quando Salinger morreu, em janeiro de 2010, o colega Osny Tavares publicou um texto aqui nesta Gazeta dizendo tudo em uma só frase. “Todo adolescente xarope deve algo a J. D. Salinger”, dizia o texto.

É isso. Salinger é o arauto da adolescência como xaropice. Holden Caufield, seu herói, é o herói de todo esse pessoal.

Tudo isso porque o menino, de 16 anos, é um dos primeiros a dizer com todas as palavras: o mundo dos adultos é uma chatice e alguém precisa se rebelar contra isso.

O livro tem a ver com o momento em que foi escrito, em 1951. Há exatos 60 anos, o mundo acabava de passar pela Segunda Guerra e os jovens pareciam perceber que alguém estava destruindo qualquer possibilidade de um mundo mais idílico.

A vira era dura. Os adultos insistiam em lembrar os mais jovens disso. E, além de tudo, os prazeres que restavam lhes eram negados.

Caufield é o tipo do rebelde sem causa. Tem de tudo. Mas não quer nada. Acaba reprovando no colégio e tem de voltar para casa e falar com os pais.

Mas o principal problema dele, na verdade, é a solidão. Não confia em ninguém. Acha todos uns chatos. Inclusive sua família.

A única que o anima é a irmãzinha, Phoebe, de 10 anos, que ele adora. Claro, ela é uma criança, ainda não foi estragada pelos adultos. E daí vem a imagem do título: Caufield se vê como um apanhador que impede as crianças no campo de centeio de cair de um penhasco. Quer salvar sua inocência.

Depois de 1951, quando o livro foi lançado, o mundo foi ficando cada vez mais adolescente. E o livro foi fazendo mais e mais sucesso. Logo, todos queriam ser revoltados. E todos achavam que era preciso lutar contra um mundo “chato”, “quadrado”, etc.

Cada vez mais, o sonho de um mundo idílico foi sendo trocado pela ideia de que bom mesmo é poder criticar, xingar e passar pelo menos os anos da adolescência fingindo que a gente não tem nada com tudo isso que está à nossa volta.

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