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Achados e perdidos no aeroporto! Já perdeu? Já achou?
| Foto:
Linda Du Bose/Stock.Xchng
No aeroporto, perde-se de tudo, de malas a amores.

“Escrevo-te em desordem, bem sei. Mas é como vivo. Eu só trabalho com achados e perdidos”. (Clarice Lispector, em Água Viva)

Clarice bem disse. E eu bem sei que vivemos todos em desordem, em meio a achados e perdidos – mais perdidos do que achados. Pois não é que, perdido pela rede mundial, achei uma lista de objetos perdidos no aeroporto? Perde-se de tudo por lá. Algumas coisas de maior valor, como amores e amizades, ficam perdidas para sempre. Outras, menos caras, são achadas por quem trabalha com achados e perdidos (Clarices anônimas). E ficam aguardando o resgate – que quase nunca vem.

Para os objetos listados no Edital n.º 4715112 (da 4.ª Vara Federal de Curitiba, de 17 de setembro de 2010), o resgate não veio. Foram todos achados no Aeroporto Internacional Afonso Pena. E eu perdi tempo, examinando a lista. Acho que são estes os resultados mais interessantes – ou menos desinteressantes:

– 40 identidades foram perdidas durante embarques e desembarques, encontros e desencontros. Refiro-me a documentos de identidade, até porque são incontáveis as pessoas que perdem diariamente as suas identidades por aí (e não se acham mais);

– Dois cheques, dois talões de cheques e 48 cartões de banco (de crédito e débito), além de uma máquina de cartões de crédito. Isso mesmo, muitos cartões e uma máquina de cartão! O queijo e a faca! Sorte que faltou quem cortasse;

– 37 cartões diversos: entre eles, um cartão-fidelidade da apresentadora Sabrina Sato Rahal, do programa Pânico na TV (RedeTV). Esclarecendo: não se trata de fidelidade da ou à simpática ex-BBB, mas um cartão-fidelidade de companhia aérea que pertencia a ela. Aposto que muita gente gostaria de devolver o cartão pessoalmente (eu não, amor!);

– 27 óculos, entre escuros e de grau, quase todos de marcas famosas, como Ray Ban, Guess e Ermenegildo Zegna. Sem os óculos escuros, dá-se um jeito. Já a falta dos óculos de grau deve ter causado muita dor de cabeça aos proprietários – sei bem como é (era);

– 23 livros: entre eles, duas Bíblias e uma lista telefônica. Mas o que mais me chamou a atenção foi um chamado O que a amnésia não levou: lembranças de um menino antigo, de Pitágoras José Bourscheid. Se a amnésia não levou as lembranças do autor, o mesmo não pode ser dito do livro do leitor;

– 54 peças de roupa: entre elas, uma blusa Lacoste preta, que pode ter sido minha algum dia. Explico: não ligo muito para marcas e jamais gastei mais do que R$ 100 em uma blusa (até porque sou encalorado), mas minha avó materna me deu uma blusona Lacoste preta, há alguns anos, e eu a perdi depois de uma viagem de avião. Enfim, já era. O jeito é continuar comprando as mais em conta;

– Nove celulares: entre eles, alguns dos bons e caros, como um Iphone. Se eu tivesse um Iphone, algemava-me a ele;

– Três ingressos para show do Aerosmith. Para mim, seria a perda mais doída. E quem perdeu os ingressos deve ter ficado em casa, cantando aos prantos I don´t wanna miss a thing;

– Três câmeras fotográficas (duas digitais e uma analógica). Quem já passou por isso sabe: o pior não é perder a câmera, mas as fotos, que registram momentos que não voltam mais (e que dinheiro nenhum compra);

– Um notebook. De novo: quem já perdeu um computador sabe que o pior é perder os dados que estão lá gravados. Aliás, conheço uma pessoa que já precisou comprar o próprio notebook de uma vizinha “mui amiga”. O computador havia sido esquecido em uma área comum do prédio onde a minha conhecida mora. Depois de espalhar avisos pelo condomínio, ela foi contatada por uma vizinha, que alegava conhecer a pessoa que encontrara o computador. Havia apenas um problema: essa pessoa queria uma “recompensa” de quase R$ 1 mil. Como as informações armazenadas no notebook valiam mais, e com medo de que elas fossem apagadas, ela preferiu pagar;

– Um violão. Mais uma vez: quem já perdeu um violão sabe a tristeza que isso dá. Afinal, como canta Caetano Veloso: “como é bom poder tocar um instrumento”;

– Um terço. Espero que a pessoa que o perdeu não tenha medo de avião, nem tenha passado por uma turbulência forte sem o guia de oração – há quem não encare uma turbulência (no ar, na terra ou no mar) sem o auxílio do terço;

– Um arco para flecha. Só espero que as flechas também tenham sido perdidas. Aliás, é provável que esse arco tenha sido barrado no embarque e forçadamente deixado para trás, como também foram 972 canivetes, 223 talheres, 546 lixas de unha, 409 tesouras, 157 estiletes/lâminas e 476 outros objetos pontiagudos;

– Uma pipa em formato de avião e um pinheiro de Natal pequeno. Sem comentários. Só achei curioso mesmo.

Além de todas essas coisas, ficaram esquecidas no aeroporto: 330 sombrinhas, 40 guarda-chuvas, 24 joias (correntes, anéis e afins), 23 molhos de chaves, 19 carteiras de habilitação, 15 malas (mochilas e afins), nove travesseiros, cinco documentos de veículos, quatro cartões de CPF, quatro passaportes, quatro crachás, quatro carteiras, três títulos de eleitor, três remédios, um boletim de ocorrência, um certificado de antecedentes criminais e muitas outras miudezas, como moedas, imagens de santinhos e papéis.

E onde foram parar todos esses objetos? Como ninguém foi buscá-los, depois de todo um processo que correu na Justiça Federal, transitou em julgado no mês passado uma decisão determinando que cartões, chaves e documentos pessoais fossem destruídos, e os objetos, doados a entidades assistenciais determinadas pela Justiça. Melhor assim, eu acho.

No mais, é como escreveu o poeta Mauro Mota: “A maior perda é das coisas que nunca tivemos”. E essas nós não encontramos nos Achados e Perdidos.

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Agudas

– Se você perder algo no Aeroporto Afonso Pena, procure o balcão de informações da Infraero, cujo telefone é (41) 3381-1450;

– Já se perder algo na Rodoferroviária de Curitiba, pode ir ao Serviço de Achados e Perdidos, na Administração da Rodoferroviária, no bloco interestadual. Os objetos encontrados são guardados em depósito por pelo menos 90 dias. Depois, são encaminhados para doação à Fundação de Ação Social (FAS) da Prefeitura Municipal de Curitiba. Já os documentos não procurados são encaminhados, todas as semanas, aos Achados e Perdidos dos Correios, onde ficam por 60 dias — depois, são enviados aos órgãos emissores. Nos Correios, para resgatar os documentos perdidos, é preciso comprovar a titularidade e pagar taxa de R$ 3,70 – antes, confira neste site se o documento está mesmo com os Correios;

– Realmente, tem gente que só não perde a cabeça porque ela está grudada ao corpo. Até mesmo dentaduras já foram encontradas pela Central de Achados e Perdidos do Metrô de São Paulo. Em 2010, essa central contabilizou cerca de 37 mil objetos perdidos. Desse total, 26% foram devolvidos aos seus donos. O que não é resgatado é doado ao Fundo Social de Solidariedade de São Paulo;

– E você, caro leitor, qual foi a coisa mais interessante ou significativa que já perdeu ou achou?

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