| Foto: Abin
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Governos são passageiros, o Estado é permanente. Instituições de governo servem para atender demandas dos ciclos políticos, instituições de Estado servem aos interesses de longo prazo do país. Essa distinção, apesar de parecer pouco clara na prática, é um elemento vital para o bom funcionamento das democracias mundo afora. Quando governos começam a perverter e aparelhar instituições de Estado para fins indevidos, temos o início de um processo perigoso que, se não interrompido, tende a desaguar em ruptura institucional.

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Exemplos de governos realizando incursões perigosas em instituições de Estado não faltam na história brasileira recente. Talvez um dos casos mais emblemáticos seja o do mensalão petista: o executivo atuando para subverter a independência dos poderes através da compra de votos, com o objetivo de avançar na sua agenda. O Partido dos Trabalhadores se infiltrou em muitas instituições, chegando, em alguns casos, a transformar aquele pedaço do Estado em uma extensão de si próprio.

O governo Bolsonaro tem seguido roteiro parecido. Órgãos com grande importância em investigações de casos de corrupção na última década vêm perdendo autonomia. Cargos técnicos da Coaf, órgão responsável por mapear movimentações financeiras suspeitas no país, agora podem ser ocupados por profissionais comissionados, abrindo brecha para indicações políticas.

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A Polícia Federal, que deveria ser uma instituição totalmente independente do governo, também sofre crescente influência política. Após prometer, em 2018, que daria total liberdade a Sérgio Moro no Ministério da Justiça, Bolsonaro pressionou o ministro para trocar a direção na PF e da superintendência do Rio de Janeiro. Após a quebra de promessa, Moro se demite e as modificações que o ex-ministro havia alertado se concretizam. As interferências não pararam no Rio de Janeiro, levando a muitas trocas em superintendências regionais e cargos de chefia.

Até agora, a expressão mais descarada da intromissão dos interesses privados em órgãos públicos, que vem caracterizando esses 2 primeiros anos do governo Bolsonaro, foi a suspeita de envio de relatórios da Abin para ajudar o filho do presidente nos processos que responde. A agência foi, de órgão de Estado, responsável pelo serviço de inteligência do país, à consultoria jurídica particular.

As instituições brasileiras precisam reagir enquanto podem, pois o processo de aparelhamento costuma ocorrer em ciclo vicioso, avançando mais à medida em que compromete os mecanismos de freios e contrapesos. O Brasil é muito maior do que o governo Bolsonaro, e continuará lá quando o governo acabar.