A enorme polarização política existente no Brasil nos últimos tempos tem gerado efeitos nefastos sobre a nossa percepção da realidade. O clima de torcida em clássico de futebol que invade qualquer debate sobre os rumos de nossa sociedade impede-nos, individual e coletivamente, de compreender de forma plena as transformações e avanços que nossa sociedade tem experimentado nos últimos anos.
Um tema no qual tal polarização é particularmente prejudicial é a educação. Ainda que seja elencada nos discursos de palanque ou de mesa de bar como uma das prioridades nacionais, ignora-se na maior parte das vezes o real cenário no qual as escolas e o sistema educacional brasileiro se encontram, pois enquanto de um lado pinta-se um cenário apocalíptico, de outro se vende a ideia de que nossos seculares problemas foram sanados pela ação redentora dos ocupantes do poder. Felizmente, nossa realidade educacional é bem mais complexa do que se pinta.
Se é ingênuo imaginar que a educação brasileira vai bem, obrigado, é igualmente naïf pensar que em nada se avançou nos últimos anos. Tome-se como exemplo a questão do tempo que a criança passa dentro da escola: se ainda não atingimos aquilo que se observa nos países com bons índices educacionais (e aqui o parâmetro são os membros da OCDE), pelo menos hoje reconhecemos a necessidade de que cada criança e jovem passe mais que 4 horas por dia no ambiente escolar. Tal mudança se deu, obviamente, não apenas por obra e graça de um governo – aliás, se há um erro em nossa sociedade é achar que a educação vai mudar APENAS pela ação governamental; a pressão de pais, empregadores, professores, juntamente com alguns programas oficiais, tem feito este cenário mudar.
Dito isso, destaco um interessante caminho para as escolas públicas ampliarem o atendimento à comunidade, que é o programa federal Mais Cultura nas Escolas. Por meio de parcerias realizadas entre escolas e entidades culturais, podem ser apresentados projetos com orçamento de até R$20 mil para o desenvolvimento de atividades culturais e artísticas no âmbito escolar, exclusivamente para aquelas instituições que já participam dos programas Mais Educação e Ensino Médio Inovador. Com isso, espera-se que as instituições absorvam a produção cultural e artística existente no seu entorno, tornando-a um espaço de vivência da arte e da cultura.
Em 2014 o programa aprovou mais de cinco mil propostas que já estão em execução em todo o território nacional. Sabemos que, dado o gigantismo de nosso país e as profundas desigualdades existentes entre os diversos estabelecimentos de ensino, não será apenas uma iniciativa dessa natureza que resolverá todos os problemas da educação. No entanto, reconhecemos o mérito do programa ao considerar a importância da cultura para a formação dos estudantes, para a valorização dos saberes locais e, principalmente, para o protagonismo do espaço escolar nas comunidades. Em nossa visão, uma grande escola não se faz com equipamentos de última geração, fachadas espelhadas ou mármore nos banheiros; pelo contrário, de nada resolvem investimentos em estrutura física se os mesmos não forem acompanhados de uma vivência efetiva, por parte da comunidade, do dia a dia escolar e de seu reconhecimento como espaço de confluência de conhecimentos que ultrapassem o tecnicismo e o decoreba. Iniciativas como essa que levam a arte para dentro da escola, por exemplo, e induzem os gestores escolares a buscarem soluções que vão além dos governos, apontam nessa direção e fazem com que nossas crianças tenham uma vivência mais rica e mais prolongada em seu dia a dia como estudantes.
>>Christiano Ferreira é historiador e atua há mais de 10 anos no Ensino Básico e Superior como docente e gestor educacional. Atualmente coordena o Projeto Tetear, da Parabolé Educação e Cultura, que leva oficinas de arte e educação para crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social na Região Metropolitana de Curitiba. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.
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