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O que faz um bom professor?
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Lembro de um, major do Exército, professor do colégio militar, onde estudei de 1975 a 1980. Ele ensinava língua portuguesa e redação. Não lembro dos detalhes de sua aula mas sim da impressão que ele causava em mim. Lembro-me de querer agrada-lo. Não, não propriamente agrada-lo, mas obter dele alguma atenção, algum comentário.

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A qualidade da aula dele era a de despertar nos alunos esse desejo de ser tão bom, tão culto, tão altivo como ele. Ele nos apresentava autores e ideias, mas não dava opiniões. Sua narrativa era densa e elegante e anotávamos as palavras que não conhecíamos ( muitas, muitas) para procurarmos no dicionário. Ele não facilitava nada mas não fechava nenhuma porta. Ao contrário, abria várias e víamos, extasiados, as nesgas de horizontes ao longe e nossa vontade de visitar aqueles jardins, aquelas montanhas, aqueles desertos, era grande.

Um dia ele nos apresentou “Vida Secas”, de Graciliano. Disse apenas: “os meninos não têm nome. A personagem mais humana do romance é a cachorra baleia.”

Minhas têmporas começaram a formigar na hora. Que história é essa, meu Deus, na qual homens são bichos e bichos são homens? Até hoje releio o texto com essa memória das palavras de meu professor de português.

Outra vez ele me chamou a atenção. Não havia me saído bem em uma prova de regência, verbos, algo assim. Ele me entregou a nota ( um seis que era uma vergonha) e disse-me: de você eu não admito essa nota! Nunca uma bronca foi mais lisonjeira. Fiquei rubro de vergonha e satisfação. Então eu era notado pelo professor culto e elegante. Ele sabia que eu existia e não aceitava minha negligência.

Um dia, em uma aula de apresentação oral , decorei um poema, mas na hora só consegui chegar a metade dele. Muito tímido, nervoso de  bater joelhos, o verso sumiu e tudo ficou nublado. Uma vergonha que se somava aos indefectíveis comentários dos colegas, as risadinhas e os dedos apontados. O professor, impassível, disse apenas: amanhã, com outro tema. O próximo! Assim, sem julgamento ou lição, mas a percepção de meu inferno pessoal e a chance de redenção. Inesquecível.

Quando deixei o colégio militar e a cidade, o professor já não lecionava lá. Eu arrulhava discurso de poeta, como foram todos os adolescentes de minha geração, e discutia o futuro do meus país, como todos os jovens da época. Mas uma coisa eu não queria que mudasse e não quero até hoje, agora que faço 30 anos de sala de aula, eu só uma sombra pálida do que foi esse mestre de minha infância de sonhos e temores: que todos os professores fossem cultos e firmes, gentis e decididos na sua tarefa de serem pontes para o mundo que podemos ter, da propriedade que podemos ter, da felicidade que podemos almejar, que é a apropriação competente  e profunda do conhecimento dos homens no mundo.

 

 

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