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Ameaça nuclear ou diálogo? A estratégica ambiguidade nos discursos de Putin
| Foto: EFE/EPA/ALEXANDER KAZAKOV/KREMLIN

Essa semana foi um ótimo exemplo da ambiguidade estratégica que norteia as ações e discursos de Vladimir Putin. O presidente da Rússia foi empossado para seu novo mandato no dia sete de maio e, dois dias depois, chefiou o desfile do Dia da Vitória, que marca a derrota da Alemanha nazista em 1945. O tom de cada ocasião foi diferente e não podem ser analisados em separado.

Putin é, na prática, o líder da Rússia desde agosto de 1999, quando foi empossado como primeiro-ministro para chefiar o gabinete do então presidente Boris Ieltsin. Em dezembro daquele ano tornou-se presidente interino, com a renúncia de Ieltsin e, em maio de 2000, tornou-se presidente eleito. Entre 2008 e 2012, Putin foi novamente premiê, com Dimitri Medvedev ocupando a presidência como seu testa de ferro.

O “revezamento” com Medvedev foi para respeitar os limites legais da constituição russa. Depois da última reforma constitucional, entretanto, Putin pode ter mais catorze anos à frente do país. Já escrevemos bastante sobre Putin e sua Rússia aqui em nosso espaço. Uma das características do presidente russo é a ambiguidade estratégica, evitando fechar portas e também buscando criar dúvida e confusão.

No dia sete, Putin falou em necessidade de diálogo com o chamado Ocidente e que somente com o diálogo “entre iguais” se alcançará uma “estabilidade estratégica”. Pregou a cooperação e a multipolaridade da ordem mundial. Para o evento, o governo russo convidou todos os embaixadores residentes em Moscou, supostamente para mostrar disposição ao diálogo. E também para classificar de “mesquinhas” as ausências óbvias, como a do embaixador dos EUA. 

Duas presenças se destacaram, entretanto, as de Pierre Lévy, embaixador da França, e de Simona Halperin, embaixadora israelense. A França de Macron forneceu armamentos importantes para a Ucrânia, como mísseis de cruzeiro, e já falou abertamente do envio de tropas para a Ucrânia. Já Israel e Rússia têm se desentendido nos últimos meses, sobretudo por problemas envolvendo o Hamas e o uso do espaço aéreo sírio por Israel. 

Dia da Vitória

Em contraste ao discurso conciliador da posse, Putin, no nove de maio, disse que as ambições “exorbitantes” do chamado Ocidente podem levar o mundo a uma nova guerra mundial e que a Rússia está pronta para esse conflito. “Não permitiremos que ninguém nos ameace. Nossas forças estratégicas estão sempre em estado de prontidão de combate.” Referência ao arsenal nuclear russo e sua capacidade de tríade nuclear. 

Putin também defendeu a “operação militar especial”, seu eufemismo para a invasão da Ucrânia, e os mortos pelo “neonazismo”, mantendo o discurso oficial de que a invasão da Ucrânia seria uma espécie de “guerra justa”. Principalmente, defendeu os exercícios militares nucleares táticos que ordenou recentemente, em cooperação com Belarus. Lukashenko, ditador vizinho, estava presente, inclusive, assim como os líderes dos cinco países ex-sovieticos da Ásia Central, do Laos, de Guiné-Bissau e Miguel Diaz-Canel, de Cuba.

À primeira vista, alguém pode achar que se trata de um discurso para o público externo e outro para o interno. Não é possível pensar assim no caso de Putin, especialmente em um evento que ele tanto propagandeou e se apropriou nos últimos anos, como o desfile do Dia da Vitória. Suas palavras ali terão a mesma relevância do que as da posse perante o embaixador francês. A mensagem ambígua é intencional e serve de escudo. Putin, mesmo com o dedo no botão nuclear, dirá “mas eu avisei que preferia o diálogo”.

Conteúdo editado por:Jônatas Dias Lima
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