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O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, se reuniu com o presidente francês, Emmanuel Macron, em uma coletiva de imprensa conjunta em Jerusalém, nesta terça-feira (24)
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, se reuniu com o presidente francês, Emmanuel Macron, em uma coletiva de imprensa conjunta em Jerusalém, nesta terça-feira (24)| Foto: EFE/EPA/CHRISTOPHE ENA / POOL

O que a Europa ocidental pode fazer quanto à atual guerra entre Israel e o Hamas? Nessa última semana, Emmanuel Macron, presidente francês, e Rishi Sunak, primeiro-ministro do Reino Unido, visitaram a região. Além deles, outros líderes europeus se pronunciaram sobre o assunto. A verdade, entretanto, é que, pela segunda vez na História, uma crise na região do Levante expõe que a Europa fica para trás no cenário internacional.

Primeiro, no último dia 19, Sunak tornou-se o segundo líder global, depois de Biden, a se encontrar com Netanyahu depois dos ataques terroristas de 7 de outubro. O britânico afirmou que seu governo apoia Israel no momento "mais sombrio" da história do país, defendeu o direito israelense “de se defender” e a criação de “corredores humanitários” para acolher a população de Gaza.

No dia 20, Sunak se encontrou com o presidente palestino Mahmoud Abbas, no Cairo, para transmitir a ilusão de ser um ator que dialoga com vários envolvidos. Semana passada, Abbas criticou o Hamas e afirmou que apenas a Autoridade Nacional Palestina pode falar pelos palestinos. Também pediu, diversas vezes, que os ataques aéreos contra Gaza devem parar.

O encontro rendeu uma declaração protocolar, afirmando coisas como que “os líderes concordaram na necessidade de todas as partes tomarem medidas para proteger os civis e a infraestrutura civil e minimizar a perda de vidas inocentes”, e que ambos “condenam o terrorismo do Hamas e sublinharam que o Hamas não representa o povo palestino”. Do Cairo, Sunak voltou para casa.

Macron

No dia 24 de outubro, Emmanuel Macron se encontrou com o premiê israelense Benjamin Netanyahu e com o presidente Isaac Herzog. Algo que chamou atenção foi sua proposta de “uma coligação regional e internacional para lutar contra o grupo terrorista que nos ameaça a todos”. Segundo Macron, essa aliança se justifica pelo fato de que “o Hamas é um grupo terrorista cujo objetivo é a destruição do Estado israelense”.

Macron ecoou a retórica israelense que busca aproximar os atos de terror do Hamas aos do Daesh, o popularmente chamado Estado Islâmico, e disse que “a França está pronta para que a coligação internacional contra o Estado Islâmico, na qual estamos envolvidos no Iraque e na Síria, também lute contra o Hamas”. A questão é que Macron sabe que são duas situações totalmente distintas.

É uma declaração populista, para ter o que sair no jornal. Nenhum Estado, de maneira oficial, tinha relações com o Daesh. Ninguém tolerou o Daesh, cuja única pauta era a violência iconoclasta e apocalíptica, para cumprir profecias do Armagedon e a criação de um suposto califado universal. Não é um paralelo com o Hamas, muito menos com o cenário internacional.

O Hamas é, até “segunda ordem”, um grupo terrorista, que realizou atos de violência brutais. Isso é fato. Ao mesmo tempo, o grupo sequestra a causa palestina para, por meio dela, conseguir apoio de outros países, como a Turquia e o Irã. Na última quarta-feira, por exemplo, o presidente da Turquia, Recep Erdogan, afirmou, perante o parlamento turco, que o Hamas não seria terrorista.

A Palestina e o Hamas

"O Hamas não é uma organização terrorista, é um grupo de libertação, mujahideen travando uma batalha para proteger suas terras e povo”. Mujahideen é uma palavra árabe que significa literalmente “aquele que faz Jihad”, ou seja, o combate justo, autorizado por Deus. É uma palavra que costuma ter um impacto de propaganda enorme dentro de grupos muçulmanos.

Essas declarações se dão pelo fato de o Hamas ser ligado à Irmandade Muçulmana, que tem na Turquia um de seus principais pilares. Esse único e singelo exemplo serve para lembrar que nem de perto a situação do Hamas é a mesma do Daesh. E, novamente, Macron sabe disso. Dezenas de países não vão se juntar para bombardear a Faixa de Gaza. A situação, na verdade, é ainda mais complexa do que antes.

Depois, Macron se encontrou com Abbas em Ramallah, para transmitir a mesma ilusão do chefe de governo britânico. No encontro, Macron afirmou que “vejo e ouço o sofrimento da população civil em Gaza, e, para França, nada pode justificá-lo. Uma vida palestina equivale a uma vida francesa que equivale a uma vida israelense.”. Existe algo dentro de Macron que realmente acredite que a França pode ser um ator mediador nessa situação?

Qual influência, em qualquer esfera, que a França pode exercer em Israel, no Hamas ou na Palestina? Tanto Sunak quanto Macron realizaram essas viagens para posarem de estadistas, de líderes globais, seja para o seu público interno, seja perante a comunidade internacional. Na prática, entretanto, ambas as visitas pouco renderam e os dois países vão continuar seu intercâmbio de tecnologia militar com Israel.

Ilusões de influência

Britânicos e franceses são diretamente responsáveis pela situação que existe hoje. Foram esses dois impérios coloniais que expandiram sua influência na região no século XIX e que repartiram o território no Tratado de Sykes-Picot de 1916. Foram eles, via Liga das Nações, que estabeleceram o Mandato Britânico da Palestina. E foram os britânicos que tentaram explorar as tensões entre judeus e palestinos por décadas.

Curiosamente, também foi ali, mas em 1956, que, em um marco da Guerra Fria, franceses e britânicos aprenderam a lição de que não eram mais as potências mundiais que pensavam ser. A Crise de Suez daquele ano foi resolvida pelas duas verdadeiras superpotências do período, EUA e União Soviética, contrariando frontalmente os interesses anglo-franceses, que buscavam manter o canal de Suez pela força.

Hoje, Sunak e Macron podem fazer a turnê midiática que for, mas não possuem a capacidade de articular uma solução. EUA e Arábia Saudita são os atores chave para isso, com Egito, Qatar, Irã e Rússia também podendo desempenhar bom papel. Até mesmo o Brasil, no Conselho de Segurança da ONU, esteve mais perto de conseguir algo do que Sunak ou Macron. Britânicos e franceses já causaram problemas demais ali.

Conteúdo editado por:Bruna Frascolla Bloise
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