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O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, durante visita à Colômbia em 2017
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, durante visita à Colômbia em 2017| Foto: EFE/MAURICIO DUEÑAS CASTAÑEDA

Pelo sexto final de semana seguido os israelenses protestaram contra a proposta de reforma do poder Judiciário de Israel pelo governo Netanyahu. No último dia 13, cerca de oitenta mil pessoas protestaram nas ruas de Jerusalém. Dois dias antes, cerca de 150 mil pessoas protestaram em diversas cidades, como Tel-Aviv e Haifa. A proposta reforma do governo pode gerar grandes impactos para Israel e dialoga com uma questão mais ampla presente em diversos países.

Os protestos do dia 13 foram focados em Jerusalém pelo fato de ser o dia em que o debate sobre a proposta começou no Knesset, localizado na cidade. Em meio aos protestos, que incluíram um confronto com a polícia, a sessão legislativa foi marcada por gritos, insultos, dedos na cara e a retirada de parlamentares do recinto. Do que se trata, então, a proposta de reforma do Judiciário? Segundo o governo Netanyahu, o gabinete mais religioso da História de Israel, se trata de diminuir o poder de "juízes elitistas e tendenciosos".

Reforma contra o Judiciário

Nos temas principais, a reforma prevê que o Knesset poderia anular decisões da Suprema Corte por maioria simples, baniria o poder de revisão constitucional da corte, diminuiria a jurisdição da Suprema Corte em ações administrativas e alteraria a composição do comitê que seleciona juízes, garantindo que a maioria de seus integrantes seja de indicados pelo governo. Em outras questões menores, rebaixaria diversas providências legais ministeriais para meras “recomendações”.

O discurso populista do governo Netanyahu apela para questões que, como mencionamos, são discutidas em outros países. Por exemplo, que representantes eleitos seriam supostamente mais legítimos do que juízes, ou da suposta falta de responsabilização do Judiciário perante a sociedade. São debates válidos e isso não pode ser negado. Por outro lado, não são justificativa para a reforma proposta por Netanyahu que, na prática, não reforma o Judiciário, mas acaba totalmente com sua independência.

Israel é um país parlamentarista. Como tal, o governo terá, na maioria das ocasiões, ao menos maioria simples no parlamento. Ou seja, pela reforma de Netanyahu, o governo teria um poder virtualmente ilimitado. O Judiciário seria composto de acordo com os caprichos do Executivo e não fiscalizaria o Legislativo, já que uma reles maioria simples seria suficiente para impedir ações da Suprema Corte. Isso viola os pilares da tripartição do poder, algo presente no debate político desde o século XVIII, com Montesquieu.

Também é indispensável lembrar que o discurso de Netanyahu contra o Judiciário não é movido por um desejo de um estadista de aperfeiçoar sua sociedade, mas sim pelo oportunismo e rancor de alguém que é acusado formalmente de corrupção e tráfico de influência. Em meio ao debate se ele poderia sequer ser candidato, Netanyahu venceu a eleição com o principal objetivo de salvar sua pele, nem que isso signifique o enfraquecimento institucional de seu país.

Religião e críticas

Da onde vêm o apoio legislativo ao projeto, então? Dos dois setores do governo. Primeiro, do Likud, maior partido do país, de direita, controlado por Netanyahu e que segue os caprichos do líder. Segundo, dos partidos religiosos ortodoxos que são aliados de Netanyahu, que enxergam no Judiciário um bastião de secularismo à ser combatido em Israel, em questões como o reconhecimento internacional do casamento entre pessoas do mesmo sexo e do aborto de gestação.

No médio e no longo prazo, a proposta reforma do Judiciário levaria a um papel ainda maior da religião na sociedade e nas instituições israelenses. Como consequência de todos esses aspectos da reforma, não é de surpreender o tamanho da mobilização contra o projeto. Segundo as pesquisas de opinião, a maioria do eleitorado é contra o projeto. O presidente Isaac Herzog, uma figura apartidária, criticou abertamente o projeto, afirmando que é necessário mais diálogo.

Um grupo de sete ganhadores judeus do Nobel também critica a medida, assim como os juízes da Suprema Corte e o Procurador Geral do país, afirmando que o projeto transformaria Israel em uma autocracia. Principalmente, setores da economia criticam a medida, especialmente dentro do setor de tecnologia. Israel, que adota o lema de “nação startup”, já vê empresas congelarem planos e ameaçarem sair do país caso a reforma vá adiante e seja efetivada.

Os depósitos em dólar no país já caíram e o valor do shekel está oscilando nos últimos seis meses. Até Joe Biden, presidente dos EUA, já criticou o projeto de reforma do Judiciário israelense, quando perguntado. Caso tudo ocorra de acordo com os desejos de Netanyahu, o projeto será aprovado até abril. Serão meses de tensão e discussão sobre uma medida típica dos autocratas das últimas décadas, a corrosão institucional e o enfraquecimento de poderes que ameacem o seu próprio poder.

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