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Foto: Daniel Caron/Arquivo Gazeta do Povo
Foto: Daniel Caron/Arquivo Gazeta do Povo| Foto:

Em 2018, enviei cerca de 1,2 mil pacotes aos clientes de minha empresa aqui nos Estados Unidos. Mais de 95% dos envios foram feitos pelos correios, ou seja, algo em torno de 1.150 pacotes. Desses, apenas 12 chegaram atrasados e nenhum se perdeu. Detalhe: utilizamos sempre o serviço chamado Flat Rate Priority Mail, que tem preço fixo para o país inteiro e garante entrega em até três dias, mesmo quando o destino é o Alasca ou o Havaí. Mesmo com toda essa eficiência, os americanos costumam fazer piada com os correios, e pouca gente se arrisca a usar o serviço quando a necessidade é de que o pacote tenha entrega garantida no dia seguinte. Em casos assim, o mais comum é fazer o envio por UPS ou FedEx, que garantem a entrega a não ser em casos de catástrofes naturais ou nos dias muito próximos ao Natal (em ambos os casos, há sempre um aviso logo na primeira página web da empresa, deixando claro que os prazos de entrega podem ser afetados por conta dessas contingências).

Por que estou falando sobre isso? Porque na semana que passou precisei dos Correios no Brasil e me dei muito mal. Uma pessoa amiga queria mandar um pacote por meio de uma outra pessoa amiga que estava vindo para Orlando. O pacote foi postado via Sedex na terça-feira, dia 15 de janeiro, com entrega prevista para o dia 17. Tudo tranquilo, já que a pessoa que traria o pacote só embarcaria no dia 19 à noite. No dia 17, entro na página de rastreamento dos Correios e digito o código. A tela mostra que a encomenda foi registrada em Ribeirão Preto no próprio dia 15 e levada para São Paulo; no dia 16, saiu cedo de São Paulo e chegou a Praia Grande, destino final. Depois do dia 16, nenhuma atualização. Começo a ficar preocupado, mas penso que “ainda tem dois dias para ser entregue, deve dar tempo”. Ledo engano. No dia 18, às 18h56min, a atualização dizia que o carteiro tentou entregar, mas não encontrou ninguém. Telefono para o destinatário e ele me diz que tinha gente no endereço de entrega durante todo o dia, inclusive às 18h56. Por acaso do destino, naquele mesmo dia eu tinha visto duas postagens de amigos – Paula Rosiska e Paulo Cruz – dizendo que estavam esperando entregas, que tinham ficado o dia todo em casa, mas que obtiveram a mesma atualização famigerada, a do carteiro que não encontrou ninguém. É claro que, no sábado, o carteiro não tentou entregar de novo e a encomenda não veio para mim. Parece-me claro também que muitos carteiros estão dando a desculpa de que não havia ninguém em casa só para terminar a rota mais cedo e postergar alguns pacotes para o dia ou semana seguintes.

Essa falta tremenda de respeito com o cliente e o total desprezo pela importância que um serviço pode representar a uma pessoa ou a uma empresa fazem parte dos motivos que me levaram a sair do Brasil. Supermercados, bancos, empresas de telefonia, concessionárias de energia, correios, prefeituras, órgãos públicos, cartórios – a lista de estabelecimentos que maltratam os brasileiros diariamente é quase infinita. Reúna-se qualquer grupo de três ou quatro pessoas e facilmente se obterá um relato de maus tratos e abusos para com o cliente. Quando o ocorrido se dá com empresa ou órgão públicos, é ainda pior: não há ninguém para ouvir uma reclamação ou mitigar o problema, não há ninguém que se importe realmente com o cliente, não há nem sequer a consciência de que o cidadão a requerer serviços é um cliente. Como se costuma dizer nesses casos, parece que o atendente está fazendo um favor e que nem sequer recebe salário para trabalhar.

No geral, atendimento ruim é consequência de mercado pouco competitivo. Afinal, se não há muitos concorrentes, poucos praticarão a excelência. Mais comum mesmo é manter o serviço apenas suficientemente aceitável, aquele nível de operação em que há lucro apesar dos defeitos. Obviamente que o extremo dessa situação é o monopólio estatal, caso dos Correios. Muito se falou que o novo governo, especialmente pela presença de Paulo Guedes na pasta da Economia, faria grandes e numerosas privatizações. Em uma das entrevistas que deu, ainda na época de campanha, Guedes dissertou uma lista de medidas para obter os fundos necessários ao saneamento das contas da União, e grande parte do dinheiro viria das privatizações. No entanto, logo após assumir a Presidência, Bolsonaro deixou bem claro que Petrobras e Correios dificilmente entrarão na lista. Some-se a isso a grande interferência do governo no mercado de frete rodoviário e na venda de combustíveis, as dificuldades de sempre quando o assunto é direitos trabalhistas e a burocracia que nunca diminui, e posso garantir que os brasileiros permanecerão reféns da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos por muitos e muitos anos. Quiçá por muitas décadas.

É melhor já ir se acostumando.

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