Você, que me acompanha nesta coluna há anos, sabe que eu nunca economizei palavras para criticar o governo Bolsonaro. Sabe também, se me acompanha há ainda mais tempo, que jamais contemporizei com as bandidagens dos governos petistas e que sempre critiquei as políticas e a agenda da esquerda, pois sempre me identifiquei como conservador e cristão. Mas, acima de tudo, sempre prezei e continuo prezando por me expressar da maneira mais verdadeira e menos falaciosa possível, fugindo dos exageros, dos extremos e da ignorância.
Alguns meses atrás, percebi que fugir dos exageros, dos extremos e da ignorância significava sair das redes sociais. Na minha modesta opinião, o binarismo e o extremismo tomaram conta de Twitter e Facebook de uma maneira irremediável, e ficar falando por lá perdeu todo o sentido para mim. Ninguém está disposto a ouvir algo de que não gosta, ninguém está disposto a conceder, ainda que por um mero segundo, o benefício da dúvida. A discussão política da atualidade não passa de torcida. Minto. O torcedor esportivo consegue enxergar os defeitos de seu time e admirar o craque do time adversário. É um insulto compará-lo ao venerador de políticos, ao influencer escravo de sua audiência e ao jornalista cegado pela ideologia.
Muitos que jamais se calaram contra o PT, mas também se recusavam a endossar o governo atual, passaram a assumir que precisam ser contrários e críticos a absolutamente tudo o que Bolsonaro faz ou defende e juntaram-se à mesma parcela da imprensa que até pouco tempo atrás demonizavam
O fato é que me vejo cada vez mais solitário em minhas opiniões. Nunca tive relação nenhuma com a esquerda, e por isso nunca compartilhei ideais ou valores com quem é de esquerda. Por um certo tempo, achei que tinha encontrado pessoas com valores e ideais semelhantes aos meus na direita. Durou pouco. Bastou que Bolsonaro assumisse a Presidência para que uma boa parte desses mostrasse que jamais foi por valores, apenas por poder. O conservadorismo, para eles, não passou de um instrumento para concretizar a eleição de um político que, sob nenhum aspecto, pode ser chamado de conservador. Sob a ampla sombra do pragmatismo, alçaram um sujeito estatista, falso, ignorante, chulo e tosco ao mesmo patamar de Reagan, Thatcher e Churchill. Pior que isso, deram lastro intelectual a um movimento messiânico, que crê no apontamento divino de Jair Bolsonaro como salvador da nação.
Pensei que tinha “encontrado minha turma” dentre aqueles que jamais se calaram contra o PT e a esquerda, e que também se recusavam a endossar o governo atual. Ledo engano. Sob a justificativa de não dar legitimidade e não ceder um milímetro sequer à militância bolsonarista, passaram a assumir que precisam ser contrários e críticos a absolutamente tudo o que Bolsonaro faz ou defende. E, ao agir assim, juntaram-se à mesma parcela da imprensa que até pouco tempo atrás demonizavam.
Eu não tenho esperança de convencer petistas de que seu partido é uma agremiação de criminosos e de que seu maior líder é um dos piores homens que já pisou em território brasileiro. Também não tenho esperança de convencer bolsonaristas de que seu queridinho não passa de uma caricatura mal feita de uma falsa interpretação do conservadorismo. Pode ser ingenuidade minha, mas ainda tenho esperança de que alguns dessa turma intermediária, que um dia combateram o governo petista com genuína indignação e dando a cara a tapa, e que mais recentemente deram a outra face a tapa em prol de desmistificar o governo atual, consigam enxergar que estão trilhando um caminho ruim, que acabará por colocá-los em um novo extremo e afastá-los da verdadeira virtude, que é o equilíbrio e a busca pela verdade acima de paixões, acima de interesses pessoais e acima de revanches pueris. A vocês é que escrevo este artigo. Vocês precisam parar de repetir coisas sem sentido e que acabarão pavimentando o caminho para mais uma eleição polarizada e com resultado catastrófico.
Quando vocês dizem que Bolsonaro matou mais de 400 mil brasileiros, vocês estão errados. Bolsonaro foi um péssimo presidente e, muito provavelmente, um dos piores líderes mundiais no tocante ao enfrentamento da pandemia. Ele fez piada da vacina, apostou todas as fichas na cloroquina, deixou de responder aos e-mails da Pfizer, chamou a doença de “gripezinha”, estimulou aglomerações, brigou com governadores em vez de envolvê-los em um plano nacional de combate à doença, falou uma infinitude de besteiras e fez muita coisa errada. Sim, ele foi um lixo. Muito provavelmente, se não tivesse sido tão incompetente e desgraçadamente inútil, muita gente poderia estar viva agora. Mas isso não significa que ele matou mais de 400 mil pessoas. O Brasil está atualmente na nona posição entre os países com mais mortes per capita decorrentes da pandemia. Mesmo que Bolsonaro tivesse sido uma Angela Merkel e o Brasil estivesse ao lado da Alemanha, na 47.ª posição, ainda teríamos sofrido a morte de mais de 240 mil brasileiros simplesmente porque ninguém sabia exatamente como lidar com esse vírus maldito. Então, parem de dizer que ele tem quase meio milhão de mortos nas costas. Sejamos verdadeiros. Acusemo-lo do que ele realmente é e julguemo-lo por suas reais culpas.
Mesmo que Bolsonaro tivesse sido uma Angela Merkel e o Brasil tivesse número proporcional de mortes igual ao da Alemanha, ainda teríamos sofrido a morte de mais de 240 mil brasileiros simplesmente porque ninguém sabia exatamente como lidar com esse vírus maldito
Quando vocês chamam Bolsonaro de genocida, vocês estão errados. Lá atrás, quando a esquerda começou a chamar qualquer um que não achasse superlegal ser homossexual de homofóbico, vocês foram contra. Disseram, com razão, que estavam deturpando uma palavra cujo significado original remontava ao crime de assassinato por motivação de ódio e que essa palavra perderia o significado e a força por conta desse uso errado e indiscriminado. Agora, vocês fazem o mesmo com a palavra “genocida”. Bolsonaro não é um genocida. Ele precisaria ter mostrado uma intenção deliberada de matar os brasileiros e de ter planejado fazer todas as besteiras que fez com o intuito único de tirar vidas, por odiá-las. E ele não fez isso. Pessoas morreram por causa de sua incompetência, de sua teimosia burra, de seu despreparo e de sua ignorância. Morreram como consequência de uma miríade de acontecimentos que vão desde as ações e inações do presidente até as decisões pessoais de milhões de brasileiros que optaram por ouvi-lo. Não se pode defender ao mesmo tempo que os indivíduos sejam responsáveis por suas próprias decisões e que um político seja responsável por fazê-las tomar as decisões erradas.
Bolsonaro deve ser responsabilizado por tudo o que fez e que levou objetivamente a caminhos de morte. A investigação sobre a recusa em encomendar as vacinas da Pfizer é um bom exemplo disso, ainda mais depois da revelação de que o governo não teria nada a perder caso a Anvisa não as aprovasse. Sim, pessoas deixaram de se vacinar por causa disso, e muitas acabaram morrendo. Isso é objetivo. As vacinas têm comprovação estatística de eficácia. O governo poderia ter salvado vidas, e não o fez. Bolsonaro precisa pagar por isso, mas não é chamando-o de genocida e dizendo que ele precisa ser julgado no tribunal internacional de crimes de guerra que chegaremos lá.
Quando vocês fazem piada com a ivermectina, como se ela fosse mais uma arma do genocídio bolsonarista, estão sendo tão irracionais quanto Bolsonaro foi com a cloroquina. Enquanto esta jamais teve comprovação científica de ser eficaz no tratamento dos sintomas da Covid-19 e ao mesmo tempo apresenta uma série de efeitos colaterais perigosos, aquela tem cada vez mais indícios de ser um excelente aliado das vacinas no combate à doença. Já há mais de duas dezenas de estudos sérios, publicados em jornais de alta reputação no meio médico, mostrando que o medicamento – que é barato, abundante e com pouquíssimos efeitos colaterais – tem alta eficácia na diminuição da carga viral presente nos doentes.
Para não parecer apenas achismo, tive o privilégio de conversar com um médico que atua na linha de frente do combate à Covid aqui na Flórida, e ele confirmou o otimismo generalizado do meio médico americano para com a adoção da droga em protocolos de tratamento da Covid. De acordo com ele, é uma questão de tempo para que uma quantidade suficiente de estudos sejam publicados e aceitos como padrão científico para o futuro próximo. Essas são boas notícias, daquelas que nos fazem acreditar que essa doença será cada vez mais tratável e evitável e cada vez menos fatal. E boas notícias devem ser divulgadas e comemoradas, em vez de ridicularizadas somente porque o nosso desafeto político acertou uma vez. O ditado é velho, mas não falha: até relógio parado acerta duas vezes por dia.
Bolsonaro precisa pagar por suas ações e omissões, mas não é chamando-o de genocida e dizendo que ele precisa ser julgado no tribunal internacional de crimes de guerra que chegaremos lá
Quando vocês dizem que Bolsonaro está errado por patrocinar e apoiar as iniciativas legislativas para tornar o voto impresso em obrigatoriedade inconstitucional, vocês estão errados. Mais que isso, estão sendo hipócritas. Não faz muito tempo defendiam exatamente a mesma coisa para evitar que o PT e a máquina do governo petista tivessem a possibilidade de fraudar as eleições. Vocês divulgaram dezenas de estudos e matérias que mostravam o quão frágil é a segurança das urnas brasileiras e como somos atrasados em relação aos sistemas eleitorais de diversas nações desenvolvidas, que utilizam voto impresso aliado ao voto eletrônico. Não me importa a motivação de Bolsonaro para fazer que o voto impresso seja obrigatório, eu sempre apoiarei essa pauta porque é certo, porque eu já fui fiscal de partido em eleições e já tive o treinamento que todo fiscal tem antes do início de um pleito: as urnas podem ser fraudadas, sim, e todo mundo sabe disso. A grande imprensa gosta de ocultar essa verdade e o TSE gosta de calar quem a expõe, mas isso não faz com que ela seja menos verdadeira. O Brasil precisa de um sistema com possibilidade de auditoria e recontagem, e quem quer que diga que já é possível auditar as urnas não tem a menor noção dos tipos de fraudes possíveis em sistemas 100% eletrônicos e com o nível amadorístico de proteção que as nossas urnas têm. Vocês deveriam apoiar essa iniciativa tanto quanto apoiaram na época em que Dilma nos governava. É o mínimo a se fazer para demonstrar coerência e honestidade.
Eu poderia continuar essa sequência de parágrafos com diversos outros assuntos como armamento civil, valorização da força policial, leniência para com criminosos etc. Como eu sempre digo, pautas boas não têm dono. Se meus desafetos ou inimigos concordam comigo em um determinado ponto, esse ponto não passa a ser errado por conta disso. Quem é conservador defende a liberdade individual, defende a verdade, defende o direito à vida, defende a diminuição do Estado. Jogar o jogo da grande imprensa e da esquerda radical nos levará a um desfecho horroroso. Mais uma vez, ficaremos entre mais quatro anos desse inapto que nos desgoverna atualmente e quatro novos anos nas mãos do maior corrupto que já governou o Brasil. Em outras palavras, quatro anos de pesadelo.
Vocês terão sua parcela de culpa, por não serem capazes de mostrar equilíbrio e compromisso para com a verdade. Ainda que não fosse suficiente para virar a opinião de um número suficiente de pessoas, era o correto a se fazer. Aliás, ainda é. Ainda há tempo de se abandonar o modo “full torcida” e passar a analisar as coisas pelo que elas são. Cada vez que vocês fazem coro com a mesma imprensa que criticavam até pouco tempo atrás, uma vela de esperança se apaga no já escuro campo de ideias brasileiro, e dez são acendidas nas hordas extremistas dos dois lados da ferradura. Busquem a verdade, é só o que eu peço.
PT se une a socialistas americanos para criticar eleições nos EUA: “É um teatro”
Os efeitos de uma possível vitória de Trump sobre o Judiciário brasileiro
Ódio do bem: como o novo livro de Felipe Neto combate, mas prega o ódio. Acompanhe o Sem Rodeios
Brasil na contramão: juros sobem aqui e caem no resto da América Latina
Deixe sua opinião